Policiais de diversos segmentos falam sobre a paternidade e a profissão
Fonte: SINDPOLF/SP
Por Katy Fabruzzi
Pais de família contam um pouco das suas rotinas e como conseguem conciliar o trabalho e a atenção aos filhos.
Foi numa manhã de segunda-feira, na Delegacia de Polícia Federal de Santos (litoral de São Paulo), que encontramos o Escrivão de Polícia Federal Marcelo Esperidião Teixeira Nunes, mais conhecido entre os colegas como “Speed”, voltando da escola, onde fizera rematrícula dos filhos (um garoto de sete anos e um casal de gêmeos de quatro anos e meio).
O escrivão terminou seu relacionamento estável de dez anos e ficou com a guarda das crianças. A partir daí, diante da situação em que se encontrava, foi necessário tornar-se um misto de pai e mãe. Para lidar com a responsabilidade assumida (criação e educação dos filhos), bem como a ausência materna, pai e filhos optaram também por terapia.
Todos os dias, Esperidião acorda às 5h40, prepara o café, leva as crianças para escola e segue para o trabalho. No final do dia, começa o segundo turno: “Enquanto eles tomam banho, preparo o jantar. Aprendi a cozinhar porque não podemos viver de comidas prontas. Brinco com eles, via de regra, até as 20h30, quando vão dormir. A partir daí, começam os trabalhos de casa: lavo a louça do jantar, recolho as roupas e arrumo a casa”.
As crianças têm consciência da profissão do pai e se orgulham. “Quando saímos de carro, pergunto: Vamos cantar alguma música? Eles respondem: o hino da Polícia Federal. Cantam direitinho. Sabem da minha dinâmica de trabalho, do perigo da profissão e que a polícia existe para ajudar”.
Feliz, Esperidião narrou que o filho mais velho, ao vê-lo de uniforme, exclamou: “Uau!!”. “No momento que assumi a responsabilidade de cuidar e zelar dos meus filhos abri mão da minha vida social e não me arrependo”, explica.
Sobre o futuro afirma: “Eu espero e pretendo passar valores bons a eles, valores morais do que é correto e errado, saber respeitar os mais velhos e as diferenças, escutar as pessoas, ver o lado bom das coisas, mesmo que a situação seja adversa. O meu exemplo é que será a base da educação deles, desde recolher o lixo na rua e jogar no lugar certo, até como trato as pessoas, independente da classe social”.
TAL PAI, TAIS FILHOS
Outro misto de pai e mãe é o 2º Sargento de Polícia Militar de São Roque (Interior de São Paulo), José Roberto Ceoloni. Ele ficou viúvo aos 36 anos de seu segundo casamento em 2009, quando sua esposa tinha 42 anos; o filho mais velho com 12 anos e a caçula, cinco.
“Meus filhos acompanharam todo o sofrimento da mãe que lutou por dois anos contra o câncer de mama. Sofreram neste período e também na perda. Tive que ter muita força para passar conforto a eles. Eu era a base naquele momento difícil”, conta.
Para o sargento, apesar de tudo, é gratificante ser esse misto de pai e mãe. “Meus filhos sentiam falta da Silvia, principalmente no dia das mães e nas festinhas daescola. Tentei e ainda tento suprir essas necessidades da melhor forma. Participo das festas, das reuniões de pais e até nas comemorações do Dia das Mães”. E brinca: “Talvez seja um dos poucos homens que estão lá”.
Seu trabalho na Polícia Militar também o ajudou na educação dos filhos. “A minha vivência como policial militar me ajudou na questão de passar disciplina, no comprometimento com as coisas. Sinto que Deus me deu essa missão que considero especial”, comenta José Roberto.
Além do casal, Ceoloni também fala com orgulho sobre os outros filhos, frutos do primeiro casamento. “O mais velho vai completar 23 anos e o mais novo, 21. Ambos são policiais militares, um soldado e o outro aspirante a oficial da Academia do Barro Branco. Eles vivem com a mãe que se casou novamente. Nunca forcei a escolha de uma profissão, mas quando decidiram, fiquei muito feliz”. E conclui: “Temo pela segurança deles, é natural, pois em nossa profissão corre esses riscos, mas também tenho fé em Deus”.
DESAFIOS
“A condição de pai policial impõe não apenas um discurso ético perante os filhos, mas, sobretudo atitudes coerentes com o discurso e isso leva o pai a transmitir aos filhos os valores que ele pratica”. – Policial Rodoviário Federal, Tiago Arruda Cardoso da Silva
“A condição de pai policial impõe não apenas um discurso ético perante os filhos, mas, sobretudo atitudes coerentes com o discurso e isso leva o pai a transmitir aos filhos os valores que ele pratica”. – Policial Rodoviário Federal, Tiago Arruda Cardoso da Silva O Policial Rodoviário Federal de Recife-PE, Tiago Arruda Cardoso da Silva, tem três filhos: um casal de gêmeos com 16 anos e um garoto com 12 anos, que está no espectro autista. A jornada de trabalho dos policiais rodoviários federais é de 40 horas semanais, mas para Tiago o “desafio de ser pai e policial começa antes mesmo de ingressar, no curso de formação”.
Ele conta que ingressou em 2003, e passou quatro meses longe dos gêmeos (na época com dois anos e meio). “No início, fui trabalhar a 460 km de casa e tinha que viajar de duas a três vezes por semana. Quando viajava as crianças sentiam muito e chegavam até adoecer por isso. Hoje trabalho no mesmo local que resido, o que torna menos penosa a dupla jornada.”
“Como pai procuro estar presente no cotidiano dos meus filhos, é um malabarismo de agendas. Adolescentes em época de ENEM e o mais novo demanda um acompanhamento especial, exige uma presença diferenciada dos pais. Para dar conta é preciso trabalhar em horários alternativos, compensar jornada e participar de atividades em comissões. Eu e minha esposa compartilhamos esses cuidados e atenção, pois ela também trabalha. Essa parceria é essencial para o exercício da paternidade”, diz Tiago. A esposa, Maria Auxiliadora, é técnica do Judiciário em Pernambuco.
O caçula Bruno, hoje com 12 anos, teve seus primeiros sinais de autismo aos dois anos e meio. “Os momentos que seriam de folga, comum à maioria dos policiais, são dedicados às terapias necessárias à síndrome do autismo, além das estimulações que são feitas em casa, acompanhamento pedagógico especializado e o cuidado com a própria necessidade de suporte psicológico, para poder enfrentar todo esse desafio”.
Tiago disse que os filhos mais velhos se interessam por áreas distintas da segurança pública. A menina quer atuar na área de saúde e o menino na área de comunicação. Sobre educação, argumenta: “A condição de pai policial impõe não apenas um discurso ético perante os filhos, mas, sobretudo atitudes coerentes com o discurso e isso leva o pai a transmitir aos filhos os valores que ele pratica”.
PAI HERÓI
Sargento Sidnei Ribeiro Júnior está na Polícia Militar Rodoviária do Estado de São Paulo há 24 anos. Atualmente trabalha na Rodovia Imigrantes, local com um dos maiores fluxos de automóveis no Estado, principalmente nos feriados. Ele é pai de quatro filhos, três do primeiro casamento (um casal e o caçula com nove anos) e do segundo, uma menina de um ano e onze meses. Os dois filhos mais velhos, Julyana e Gabriel, do primeiro casamento, moram com ele, juntamente com Maria Eduarda – a caçula. Sidnei explica que a profissão o ajudou a passar valores de honestidade.
“Eles gostam do meu trabalho e me acham um herói”, diz. O sargento lembra que seus filhos mais velhos, hoje adultos, quando crianças usavam suas botas, colete e o quepe, fato que se repete nos dias de hoje com o Felipe, de nove anos, quando visita o pai. “Quando chego em casa, minha caçula chora se eu tirar o colete sozinho, ela quer ajudar. Abro um pedacinho, porque ela é pequena, não tem força, e ela desabotoa o restante”, disse.
Os riscos de segurança para policiais rodoviários vão além da violência urbana, já que também convivem também com a imprudência de motoristas.
Em 2011, Sargento Júnior foi atropelado quando abordou uma moto roubada. Outro motociclista, que vinha atrás dando cobertura, atropelou o policial, fraturando sua perna esquerda. Apesar disso, o sargento não descuida. “Sempre penso nos meus filhos, no dia a dia, e isso também me faz redobrar os cuidados com minha segurança”. Sidnei diz que sempre há tempo para se dedicar aos filhos: “A minha vida são meus filhos. Tudo o que faço é, e sempre será, por eles”.
DE PRIMEIRA VIAGEM
Eduardo Simões, 34 anos, é Agente da Polícia Civil em São Paulo, há dois anos e oito meses. Tão nova quanto a sua profissão é a paternidade. No dia desta entrevista, seu filho tinha completado uma semana de vida.
Sua esposa Kely Nascimento, já havia sofrido um aborto retido, uma fase difícil enfrentada pelo casal. A notícia de uma nova gravidez trouxe um significado especial. “Quando ela falou- estou grávida -, meus olhos encheram de lágrimas. Fiquei emocionado”, contou o agente.
As preocupações também vieram à tona: “Minha reação foi um pouco de medo. De ter gerado um filho, já no ventre, e o risco que nós temos de sairmos de casa e não voltarmos. De deixar um filhote aí no mundo, sem pai. Esse foi um dos primeiros receios, mas como optamos por essa profissão, estamos sujeitos”.
Para Eduardo, a paternidade traz mudanças significativas. “Ser pai muda a vida, a forma de pensar. Muda toda a característica da vida, tanto pra mim quanto para minha esposa. Está sendo uma surpresa, a ficha está caindo agora, as responsabilidades começam a pesar. Só não tenho mais, por enquanto, porque ele nasceu agora. Atualmente, dormir sete horas é luxo, mas estou feliz pra caramba”.
Sobre expectativas, Eduardo Simões avalia que a Polícia Civil poderia oferecer uma estrutura melhor. “Eu sou policial civil e tenho orgulho. Meu sonho foi realizado, minhas expectativas também, sou muito feliz no trabalho, reconhecido aqui na delegacia pelos meus superiores, porém falta-nos ainda crescimento financeiro”. Ele menciona também a vontade de propiciar uma educação de qualidade para o filho. Já sobre futuro profissional explica: “Se meu filho disser que quer ser um policial civil, será orgulho da minha parte. Ser como o pai é. Porém, não sei ainda se o orientarei em relação a isso”.
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