Fonte: Correio Braziliense
Parte das empresas com capital público aproveita brecha na legislação para não divulgar os salários dos servidores. Desculpa é de que a medida atrapalharia a competitividade
As estatais consideradas estratégicas pelo governo e que competem nos mercados financeiro e de energia decidiram não publicar os salários de seus diretores e funcionários na internet. Como a regulamentação da Lei de Acesso à Informação obriga apenas as empresas públicas que não atuam sob concorrência a divulgarem as remunerações de servidores, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobras e Eletrobras adotaram a brecha e optaram por não publicar os dados. Nada referente a salários, auxílios, ajudas de custo e jetons será divulgado na internet, ao contrário do que já faz o Executivo com os contracheques individuais de 569 mil pessoas no Portal da Transparência.
Um universo de mais de R$ 34 bilhões e, pelo menos, 260 mil funcionários não estarão dentro das regras de transparência adotadas pela maior parte do funcionalismo. Economistas criticam o que chamam de “caixa-preta” do orçamento público, mas há também quem defenda a não publicação dos contracheques. As empresas com participação de 100% das ações nas mãos da União — ou perto disso —, como os Correios e a Infraero, prometem divulgar a relação dos seus trabalhadores com os respectivos salários até o fim deste mês.
Inicialmente, a Lei de Acesso à Informação, de novembro de 2011, determinava que as empresas públicas teriam de garantir o acesso a informações de interesse particular ou coletivo. Porém, o decreto de regulamentação da exigência, publicado em maio deste ano, trouxe a novidade de que a divulgação de informações dessas empresas, em regime de concorrência, estará submetida às normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), “a fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver, os interesses de acionistas minoritários”. Além disso, as estatais ainda ganharam outro reforço técnico. Portaria publicada pelo Ministério do Planejamento garantiu que as empresas públicas que atuam em regime de concorrência, de fato, não são obrigadas a disponibilizar as informações.
Para o economista Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, as estatais são um capítulo à parte na Lei de Acesso à Informação. “É uma batalha. Elas não estão acostumadas com transparência. Sempre foram no Brasil essa enorme caixa-preta e estão resistindo à lei e saindo de fininho”, afirma. O economista diz que o fato de atuarem no mercado competitivo não pode ser usado como justificativa, pois as informações, segundo ele, não têm nada a ver com caráter competitivo. “O governo tem a maior parte do capital dessas empresas. As informações são banais. As estatais se escondem atrás dessa bandeira da competitividade”, acredita.
Recursos públicos
A opinião é compartilhada pelo economista Roberto Piscitelli, professor da Universidade de Brasília. Segundo ele, os valores pagos pelas empresas a seus funcionários “passam pelos cofres públicos”. “A maioria do capital não é do Estado, do conjunto dos cidadãos? Então por que BNDES e Petrobras, por exemplo, que se mantêm à custa de recursos públicos, não podem divulgar? Se é para valer, todo mundo tem que colocar sua cara a tapa”, afirma.
Mas há quem defenda a não publicação dos salários na internet. O ex-superintendente da área de relações com empresas da CVM Fábio Fonseca garante que a divulgação do salário de uma empresa de capital aberto não muda a decisão de um investidor na hora de aplicar o seu dinheiro. “Isso não agrega nada ao mercado. A informação de mercado de companhia aberta é a que leva o investidor a investir, a vender ou a fazer nenhum dos dois. As empresas privadas também não fazem isso. O dado de que um engenheiro da Petrobras ganha R$ 25 mil trabalhando numa refinaria não agrega nada”, diz. Ele lembra que os gastos dos conselhos das estatais são publicados anualmente e que, com eles, é possível saber quanto cada conselheiro ganha.
Quantidade de empregados:
Prometem divulgar:
Correios — 121 mil
Infraero — 14 mil
Não vão divulgar:
Banco do Brasil — 119 mil
Caixa Econômica Federal — 88 mil
Petrobras — 59 mil
Eletrobras — 1,4 mil
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