Fonte: Público
Tenho acompanhado com muita atenção os desenvolvimentos da situação no Estado brasileiro de Espírito Santo, onde os familiares dos polícias, revoltados com as dezenas de mortes de agentes – ainda esta semana foi assassinado mais um polícia civil – e com a forma quase esclavagista como os polícias são tratados ao nível remuneratório, de direitos e de condições de trabalho, decidiram fazer um bloqueio, impedido-os de saírem das instalações policiais.
Em consequência deste bloqueio, as localidades daquele estado estão há vários dias sem policiamento, o que já causou quase uma centena de homicídios e desordens públicas. O governo daquele Estado, numa já tardia e desesperada tentativa de repor a segurança e a ordem pública, decidiu convocar o Exército brasileiro para desempenhar missões de policiamento civil. No entanto, considerando as notícias recentes parece que o Exército não está a conseguir garantir minimamente tal objetivo.
Ora, na minha opinião, é mais que óbvio e natural que o Exército brasileiro não consegue controlar a situação, até porque, primeiro, é uma força que não está vocacionada para funções de segurança e ordem pública, ao contrário da polícia – aliás, se isto fosse em Portugal, seria inclusive proibido pela Constituição – , segundo, os militares do Exército, mesmo sendo excelentes profissionais militares, nunca serão bons polícias, pois falta-lhes a formação policial e jurídica, a experiência e principalmente o conhecimento do terreno e das informações policiais.
Em terceiro lugar, é democraticamente incompatível e até inconcebível colocar sob jurisdição militar uma população civil, ainda que a situação de facto esteja muito má e quase pareça um teatro de guerra. E, por fim, um governo, seja ele qual for, que deixa uma situação chegar a este ponto, é um governo incompetente, quer por ter levado os polícias, ou neste caso os seus familiares, ao desespero e ao limite da sua paciência, quer por nunca ter encontrado uma solução preventiva e dialogante que impedisse este desfecho, mas também porque após tantos cidadãos brasileiros mortos e vários dias passados desde o início desta “confusão”, continua incapaz de resolver a situação e chegar a acordo com os polícias e com os seus familiares.
Espero bem que os responsáveis brasileiros abram os olhos e de uma vez por todas ouçam os policias, pois se não o fizerem o efeito de contágio a outros Estados brasileiros é uma realidade e de repente não há só um Estado, mas sim um país inteiro a arder.
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