A investigação em andamento sobre a atuação da máfia dos concursos confirmou que a seleção para delegado da Polícia Federal, realizada em 2004 pelo Centro de Seleção e Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (UnB), foi fraudada. Em São Paulo, os policiais identificaram um grupo, composto por cinco agentes federais e dois civis, que teriam comandado os esquemas fraudulentos. A próxima etapa da ação dos delegados da PF que apuram o caso é identificar quantos teriam ingressado por meio de obtenção antecipada da prova.
O diretor do Departamento de Polícia Federal, Paulo Lacerda, afirmou que a denúncia é muito grave. Assim que receber os nomes dos envolvidos, determinará abertura de processos administrativos para expulsá-los da corporação. “Todas as denúncias contra fraudes em concursos públicos são muito graves. Não será diferente conosco. Temos o maior interesse em apontar as irregularidades”, destacou Lacerda, que disse desconhecer a conclusão das investigações porque o caso ainda está sendo apurado pela Polícia Federal com a participação da Secretaria de Segurança Pública do DF.
A Polícia Civil do DF identificou ainda mais dez nomes de servidores do Tribunal de Justiça do DF que ingressaram no órgão por meio de fraude. A relação consta no inquérito enviado na tarde de quinta-feira à Justiça Federal. Com os dez, já são 26 o número de funcionários que poderão perder o cargo. A presidência do tribunal aguarda o envio dos novos nomes para que possa juntar à sindicância interna aberta pelo órgão, e afastá-los das atividades. Em seguida, abrirá processo administrativo para expulsá-los do quadro funcional.
Enquanto o inquérito do TJDF ainda está na Justiça Federal, o Ministério Público Federal (MPF) já se movimenta para colocar atrás das grades todos os indiciados no inquérito por formação de quadrilha. Na última sexta-feira, o juiz Ronaldo Desterro, da 12ª Vara Federal, determinou a soltura de 24 indiciados que estavam presos. O entendimento do juiz é de que a libertação dos acusados não iria atrapalhar a investigação policial.
O procurador da República no Distrito Federal Gustavo Pessanha aguarda remessa de inquérito do tribunal para pedir a prisão dos acusados. “A tendência é que eu faça um novo recurso contra a decisão ou um novo pedido de prisão preventiva com outros fundamentos”, afirmou Pessanha. Ele deverá apensar os inquéritos para dar um só parecer, e avaliar se há indícios de lavagem de dinheiro.
O Ministério Público tem até terça-feira para recorrer da decisão do juiz Ronaldo Desterro.O segundo inquérito, o do TJDF, deverá estar nas mãos do procurador até lá. Se isso não ocorrer, Pessanha tem outra alternativa: entrar com o recurso, mas oferecer as razões depois para evitar que se perca o prazo de cinco dias reservado ao Ministério Público. O inquérito de formação de quadrilha chegou ao procurador na última quinta-feira.
Gustavo Pessanha também quer evitar uma possível suspensão do processo. É que a pena para o crime de formação de quadrilha varia de um a três anos de prisão. O artigo 89 da Lei 9.099, de 1995, instituiu a suspensão condicional do processo. Assim, nos crimes em que a pena mínima for igual ou inferior a um ano, o Ministério Público poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime.
Testemunha
O interrogatório de um ex-funcionário do Cespe que depôs na noite de quarta-feira a delegados da Polícia Civil do DF, conforme divulgou o Correio ontem, é considerado peça fundamental nas investigações de sonegação fiscal, enriquecimento ilícito e fraude em licitações contra os diretores do órgão. Ele apresentou documentos em que mostram ainda suspeitas de desvio de dinheiro.
Em um processo de dispensa de licitação, a Fundação Universitária de Brasília deixou de declarar R$ 6 milhões referente a um contrato com uma faculdade em Pernambuco. Na primeira publicação, foi declarado apenas R$ 1. Na segunda, R$ 12. “Como o caso foi bastante comentado e ficou claro que era imoral, a publicação foi retificada”, disse a testemunha.
Para o chefe da Comunicação Social da Polícia Civil do DF, delegado Miguel Lucena, cada vez existem mais indícios de corrupção no Cespe. “O sistema é completamente viciado. O órgão é uma caixa-preta que precisa ser aberta para que a sociedade tenha conhecimento e a Justiça faça um julgamento imparcial e justo”, afirmou. Lucena considera que o sistema do Cespe fere todos os princípios da administração pública. “Principalmente, o da moralidade”, destacou.
Fabíola Góis
Silêncio no Cespe
Logo que as denúncias sobre fraudes em concursos surgiram há 26 dias, o reitor da Universidade de Brasília (UnB), Lauro Morhy, anunciou a criação de uma sindicância interna para investigar o Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe). Afirmou também que a instituição iria trabalhar em parceria com a polícia. Mas, até agora, o nome dos integrantes, assim como os trabalhos realizados pelo grupo, não foram divulgados. E ninguém da diretoria do Cespe fala sobre o assunto.
Enquanto isso, os agentes da Diretoria de Repressão ao Crime Organizado (Deco) trabalham para descobrir se existem mais pessoas aprovadas no concurso para o Tribunal de Justiça do DF (TJDF), realizado em 2003, por meio de fraude, além das 26 identificadas até agora. Ontem, o diretor da Deco, delegado Cícero Jaíro Vasconcelos, afirmou ter enviado ofício ao Cespe pedindo as provas de todos os aprovados na seleção. “Queremos comparar as respostas de cada candidato para encontrar outros suspeitos”, explicou Vasconcelos.
A diretora do Cespe, Romilda Macarini, afirmou, em entrevista à Agência UnB, que a comissão de sindicância seria formada por cinco pessoas: dois professores, dois servidores e um procurador. “Eles têm carta branca para investigar o que quiserem. Podem convocar qualquer funcionário de qualquer setor para esclarecer dúvidas”, disse a diretora. O Correio procurou Romilda, Morhy e o procurador-geral da UnB, José Weber Holanda, mas eles não foram localizados e não retornaram os telefonemas. A universidade informou, por meio da assessoria de imprensa, que ninguém vai falar sobre o assunto.
Um funcionário do Cespe, que pediu para não ter o nome divulgado, disse que nenhum depoimento foi tomado até agora. “Também não fui informado e nem ouvi falar sobre o trabalho dessa comissão”, disse o servidor. No dia 26 de maio, o procurador Holanda foi à Deco apresentar o nome do gráfico Fernando Leonardo de Araújo, 26, ex-funcionário do Cespe, como suspeito de integrar o esquema. Fernando acabou preso e indiciado por formação de quadrilha. Mas o delegado Vasconcelos, na época, afirmou que o nome já era conhecido pela polícia. “Até agora essa foi a única contribuição que o órgão deu para investigação. Não sei mais nada sobre a sindicância”, disse o delegado, ontem. Vasconcelos afirmou que espera agora que a Justiça devolva o inquérito sobre o concurso do TJDF para dar continuidade às investigações.
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