Servidora presa com entorpecentes trabalhava no Juizado Especial do Ministério Público em seção por onde passam processos criminais. Juiz mantém a prisão dos sete integrantes de quadrilha do DF
A Polícia Civil investiga se a quadrilha apontada como a principal fornecedora de drogas sintéticas no Distrito Federal agia com informações privilegiadas. Acusada de fazer parte da grupo, a servidora pública Sandra Gorayeb, de 36 anos, trabalhava no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).
Ocupava posto na Divisão de Registros e Controle Processual de Matéria Criminal do Juizado Especial, onde o trâmite de informações sobre criminosos é rotineiro.
O procurador-geral de Justiça do DF, Rogério Schietti, também quer saber detalhes da conduta da funcionária. Ele determinou a abertura de procedimento interno para apurar se Sandra utilizou o cargo para obter informações sobre processos criminais acompanhados pelo MP e repassá-las aos comparsas, presos na semana passada. Em decisão de quinta-feira, divulgada ontem, a 12ª Vara da Justiça Federal no DF manteve a prisão para todos. O publicitário Michelle Tocci, 31 anos, apontado pela polícia como líder da quadrilha, continuava foragido até a noite de ontem.
Apesar de o processo contra os acusados hoje tramitar na Justiça Federal, coube ao Ministério Público local acompanhá-lo desde o início das investigações policiais. Foi com a anuência do MPDFT que a Divisão de Repressão Contra o Crime Organizado (Deco) da Polícia Civil pediu à 4ª Vara de Entorpecentes de Brasília a quebra do sigilo telefônico de todos os envolvidos e também os mandados de prisão contra eles.
De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério Público, Sandra fazia parte da equipe de apoio da Divisão de Registros e Controle Processual de Matéria Criminal do Juizado Especial. A informação é de que ela não tinha acesso ao sistema de dados. De qualquer forma, o procurador-geral de Justiça determinou à Corregedoria Geral da instituição que levante a partir de segunda-feira possíveis irregularidades cometidas pela servidora.
Procurado pelo Correio, o delegado Miguel Lucena, diretor da Divisão de Comunicação Social da Polícia Civil, afirmou que todas as atividades dos acusados de participação no esquema serão investigadas, muitas sob segredo de Justiça. Lucena preferiu não se manifestar a respeito da conduta de servidores pertencentes a outros órgãos públicos.
Sandra foi presa no Aeroporto de Brasília na terça-feira da semana passada, quando retornava de viagem à Europa. Os policiais encontraram com ela 2,5 quilos de skank (maconha modificada em laboratório), 800 gramas de haxixe e 46 gramas de MDMA em pó, o princípio ativo do ecstasy. Depois dela, outras seis pessoas foram presas, incluindo o irmão da servidora, o engenheiro e surfista Marco Antonio Gorayeb, 42.
Os advogados de defesa de três dos sete acusados argumentaram na 12ª Vara de Justiça Federal que houve ilegalidade no flagrante realizado pela polícia, uma vez que
apenas Sandra e Marcelo Maghenzani, detido em São Paulo, portavam drogas na hora do flagrante. O juiz Ronaldo Desterro entendeu, no entanto, a “regularidade flagrancial”, e negou os pedidos. O magistrado determinou o recolhimento de agendas e computadores dos envolvidos, assim como fichas de antecedentes criminais e escutas telefônicas realizadas com autorização judicial. Pediu ainda todos os mandados de prisão expedidos no processo.
O diretor da Polícia Civil do DF, Laerte Bessa, chegou a declarar que a instituição tinha em seu poder dez mandados de prisão a serem executados. “O trabalho de investigação prossegue com o objetivo de reunir provas e prender outros envolvidos”, explicou Miguel Lucena.
Segundo ele, vinte pessoas ligadas ao grupo teriam deixado Brasília nos últimos dias. Entre elas há quem fazia parte do esquema de remessa de cocaína para a Europa e “importação” de drogas sintéticas para o Brasil, e quem distribuía as substâncias em Brasília.
Numa das linhas de investigação, a polícia vasculha contatos antigos da quadrilha. “Gente que no passado teve alguma ligação com o grupo para a prática de crimes e que se afastou.” Sabe-se que Tocci foi denunciado em 2000 por crime de estelionato. O esquema consistiria na emissão de passagens com cartões clonados. Nada foi provado contra ele. “Descobrimos agora que a quadrilha da qual ele é chefe usava a mesma tática para realizar viagens ao exterior”, observou Lucena.
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