O empresário Marcos Valério, o epicentro de todas as denúncias de corrupção no governo, resolveu colaborar com as investigações que estão sendo feitas pelo Ministério Público Federal sobre as denúncias de corrupção nos Correios. Orientado pelos advogados e pressionado pela mulher Renilda Fernandes de Souza, em cujo nome está a maior parte das empresas e dívidas do empresário, há dois dias Valério marcou audiência e ontem passou cerca de oito horas prestando depoimento ao procurador-geral da República, Antônio Fernando Souza.
Além de contar o que sabe sobre o seu relacionamento com os políticos e suas campanhas eleitorais, o empresário também entregou farta documentação ao procurador. No começo da noite retornou a Belo Horizonte. “Contei tudo o que se passou entre meados de 2002 e este ano”, comentou com um amigo.
Crimes
Valério esteve na Procuradoria acompanhado de um dos seus advogados, o ex-presidente da OAB-MG Marcelo Leonardo, que participou da negociação com o procurador para que o publicitário conte toda a história de corrupção que conhece em troca de ser poupado ou denunciado por crimes menores no final do processo judicial. A iniciativa de Valério de contar tudo que sabe foi interpretada por fontes do Ministério Público como uma tentativa de virar o jogo, já que ele se transformou no único vilão desta história. As informações iniciais passadas ontem por Valério poderiam mudar bastante o quadro de crise, incluindo outros partidos e políticos, além do PT e seus dirigentes.
Oficialmente, o Ministério Público informou que Valério passou menos de uma hora conversando com o procurador-geral. O encontro, na versão oficial, ocorreu entre 15h e 16h. O procurador não deu declarações sobre as declarações do publicitário, mas confirmou, através de sua assessoria, que Valério prestou um depoimento informal e entregou documentos sobre o funcionamento de suas empresas que estão envolvidas em denúncias de corrupção e principal foco de investigações pela CPI dos Correios.
O publicitário foi acusado pelo deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) de ser o operador do “mensalão”, a mesada que o PT teria pago a vários deputados do PP e PL desde 2003 para que votassem nos projetos de interesse do Palácio do Planalto ou da bancada petista.
Marinho também colabora Lúcio Vaz Da equipe do Correio Pivô da crise que abalou o governo Lula, Maurício Marinho trocou de lado nos últimos dez dias. Três meses após ser filmado relatando a existência de um suposto esquema de corrupção nos Correios, o ex-chefe do Departamento de Aquisição de Material tem passado os dias ajudando o Ministério Público Federal a descobrir irregularidades nos contratos com os fornecedores da estatal. A nova atividade resultou de um acordo de colaboração fechado com os procuradores federais. Se a ajuda for relevante para a investigação, o servidor terá uma redução de pena no caso de uma possível condenação. Num primeiro momento, Marinho afirmou à Polícia Federal que as suas declarações seriam apenas “bravatas”. No seu depoimento à CPI dos Correios, porém, ele começou a falar a verdade. E apontou uma lista de contratos com indícios de fraudes. Na gravação feita por arapongas, ele descreve em detalhes os esquemas para fraudar licitações. Chamou a atenção o relato sobre uma licitação disputada pela Novadata, empresa de informática. “Na última licitação, eles pensaram que iam ganhar tudo. Aí deu problema. Não tinha nada acertado aqui, acertaram na (Diretoria de) Tecnologia. Só que, quando chegou lá para a abertura dos envelopes, eles perceberam que só estavam eles. Esqueceram de combinar o edital antes. Isso é uma licitação”. Marinho chega a passar um dia inteiro no Ministério Público analisando documentos, no prédio localizado na Avenida L-2 Sul. Em outros dias, fica lá por uma ou duas horas. O resultado do seu trabalho são dezenas de páginas de anotações. Ele aponta indícios de fraudes em todas as etapas dos processos de licitação, desde a elaboração do edital até a sua execução, passando pela apresentação das propostas pelos concorrentes. O servidor não está apontando nomes de fraudadores, mas brechas para as fraudes. Os procuradores estavam enfrentando dificuldades para analisar os contratos. Além dos contratos, ele está estudando registros de audiências e encontros de empresários e políticos com diretores dos Correios. Ele poderá identificar empresários que tinham interesses em contratos ou em futuros negócios com a estatal. Marinho informou à CPI dos Correios que conhecia esses empresários porque os recebia em seu gabinete freqüentemente, para tratar da execução dos contratos. |
Publicitário terá de se explicar à CPI Helayne Boaventura Da equipe do Correio
A descoberta de saques feitos nas contas da agência SMPB do Banco Rural em nome de uma pessoa morta reforçou a convicção dos integrantes da CPI dos Correios de que o empresário Marcos Valério ainda tem muito a explicar. Ontem, a CPI decidiu convocar novamente o publicitário para depor. A data ainda não foi marcada. No primeiro depoimento, ele pouco esclareceu as suspeitas de que seja o operador do pagamento de mesada a parlamentares. Com as informações que começam a chegar à comissão, os parlamentares acreditam que desta vez irão conseguir arrancar confissões de Valério. “Em função de tudo o que está acontecendo, está na cara que ele seria reconvocado”, avaliou o presidente da CPI, Delcídio Amaral (PT-MS). Além dos saques irregulares em contas de suas empresas, especialmente feitas por um fantasma, e dos empréstimos avalizados ao PT, Valério ainda será questionado sobre a queima de documentos da DNA. O policial Marco Túlio Prata, irmão do ex-contador da empresa, Marco Aurélio Prata, foi flagrado ontem queimando papéis da agência de Valério. “É absurdo queimar documentos neste momento. Tudo fica sob suspeita”, criticou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR). Até os petistas concordaram. “Hoje em dia não se pode queimar nem carta de namorada. A essa altura, não podemos facilitar nada”, reforça o senador Sibá Machado (PT-AC). As contas de Marcos Valério e de suas empresas foram o alvo principal da lista de requerimentos aprovados ontem pela CPI. Os integrantes da comissão quebraram os sigilos bancário, fiscal e telefônico de Geiza Dias dos Santos e Adriana Fantini Martins, secretárias de Valério, e do ex-sócio dele Alexandre Vasconcelos Castro. A movimentação milionária de dinheiro de Valério também está na mira da CPI. Os parlamentares solicitaram a transferência do sigilo da conta-caixa de Valério no Banco Rural, especialmente a de Belo Horizonte. Há uma suspeita de que o publicitário simulou saques na capital mineira, mas os fez efetivamente em Brasília para pagar parlamentares. Eles pediram ainda a identificação da origem de valores, acima de R$ 20 mil, depositados nas contas do publicitário. Entra-e-sai Os integrantes da CPI também estão de olho no entra-e-sai na agência do Banco Rural, no Brasília Shopping. Os parlamentares pediram ao Banco Central para fazer uma auditoria na agência, cópia das fitas de circuito interno de TV do shopping, e os registros bancários de saques feitos nas contas da SMPB e DNA. Muitos parlamentares e funcionários da Câmara estiveram na agência do banco, no 9º andar do shopping, em datas em que foi tirado dinheiro vivo das contas das agências. Foi aprovada também a convocação de todos os gerentes que chefiaram a agência de janeiro de 2003 até hoje. A CPI quer descobrir ainda as pessoas que mantêm ligações com o empresário. Os parlamentares requisitaram as notas fiscais emitidas pelas empresas de Marcos Valério, nos últimos oito anos, e dos contratos nos quais o publicitário aparece como avalista, fiador ou devedor solidário, nos últimos cinco anos. Pediu ainda os contratos firmados por todos os partidos políticos no Banco do Brasil, Banco Rural e BMG. Valério foi avalista em pelo menos dois empréstimos ao PT: de R$ 2,4 milhões no BMG e R$ 3 milhões no Banco Rural. Com tantos assuntos para investigar, o relator da CPI, Osmar Serraglio (PMDB-PR), decidiu criar três subrelatorias para ajudar no trabalho. Ele irá escolher os parlamentares que serão os subrelatores. Após os depoimentos de ex-dirigentes petistas, na próxima semana, o presidente da comissão também decidiu fechar as portas da CPI para depoimentos. Pretende reservar o período de 25 de julho a seis de agosto para a apuração. “Chegando os documentos precisamos parar para analisá-los”, justificou. DEMITIDO CRITICA Ao deixar o cargo de diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) por conta de ataques aos integrantes da CPI dos Correios, o delegado Mauro Marcelo de Lima e Silva manteve ontem suas críticas à forma como a comissão colheu o depoimento do agente do órgão Edgard Lange, na semana passada. Mauro Marcelo, porém, disse que não teve a intenção de atacar a imagem dos parlamentares ao usar o termo “bestas-feras em pleno picadeiro” em mensagem interna da agência que vazou ontem à comissão. Em nota divulgada na madrugada de ontem na página da Abin na internet, o delegado afirma que a convocação de Lange “constitui fato inusitado na história da atividade de inteligência do Brasil”. A demissão do diretor-geral do órgão ocorreu por conta da repercussão no Congresso de mensagem interna da Abin na qual Mauro Marcelo ataca e ironiza os integrantes da CPI, numa crítica direta ao formato em que ocorreu o depoimento de Lange à comissão. A Abin queria que o agente fosse ouvido a portas fechadas, para que a figura de Lange não fosse exposta, o que, na prática, coloca em xeque a carreira do servidor. |
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