Depois de um ano e meio em vigor, o Estatuto do Desarmamento poderá sofrer alterações depois do resultado do referendo que vai perguntar à população se o comércio de armas de fogo e munições deve ser mantido no país. A mudança poderá ser feita para dar resposta a uma dúvida de parlamentares integrantes da Frente Parlamentar pelo Direito à Legítima Defesa. A questão é: se o referendo decidir pela proibição, onde as pessoas com porte de arma comprarão suas munições? Atualmente, 9 milhões de brasileiros têm armas com autorização da Polícia Federal.
Deputados defensores da manutenção do comércio de armamento no país estão preparando uma emenda ao Estatuto para garantir munição aos que têm armas legalizadas. Segundo o deputado Alberto Fraga (PFL-DF), presidente da Frente, a proibição do comércio de armas de fogo poderá empurrar estas pessoas para o mercado negro. “A outra alternativa seria importar as munições, mas lá fora elas custam muito caro”, justifica o deputado. O presidente do Senado e da Frente Parlamentar Por Um Brasil Sem Armas, Renan Calheiros (PMDB-AL), apesar de ainda ter uma opinião oficial sobre o tema, também se mostrou intrigado com a dúvida levantada pela “bancada da bala”.
Para o deputado Raul Jungmann, secretário-geral da frente pró-desarmamento, não faz sentido modificar o estatuto depois do referendo. “A idéia é justamente dificultar o acesso às munições para reduzir a violência”, defende o deputado. Segundo estimativas da Polícia Federal, há no Brasil 18 milhões de armas, sendo que metade é ilegal e está nas mãos de bandidos e a outra metade encontra-se com pessoas que têm porte para guardá-las em casa.
A comerciante Carmen do Socorro Passos vende armas e munições há 17 anos no Distrito Federal e, dependendo do resultado do referendo, pretende mudar de ramo. “O comércio de arma nunca foi o forte da loja. Vendemos muitas munições. Com a campanha que já está na mídia, sabemos que a população será induzida a votar pelo fim do comércio”, ressalta.
Já na loja do empresário Roberto Pires, o comércio de armas e munições ocupa apenas uma sessão do estabelecimento. Ele vende também material para pesca esportiva e acessórios para acampamento. “Se a população decidir pelo fim do comércio, não tem problema. Só não vejo sentido em permitir que as pessoas tenham armas no Brasil legalizada sem que haja lugares para compra das munições. Isso, na minha opinião, é um estímulo ao tráfico”, diz.
As organizações não-governamentais que lutam contra a violência defendem que o estatuto não seja modificado e que o acesso às munições, mesmo para quem tem porte de arma, seja dificultado. “Essa restrição já estava prevista desde que as discussões em torno da nova lei iniciaram”, disse o coordenador do comitê Pró-Desarmamento do Guará, Alírio Neto. O coordenador da organização não-governamental (ONG)Viva Rio, Antônio Rangel, que defende o desarmamento, acha que dificilmente o estatuto sofrerá modificações após o referendo.
No sábado, o comitê pró-desarmamento do Guará vai realizar um showmício com artistas locais no estacionamento do Pão de Açúcar para orientar a população sobre o referendo. O evento é o primeiro do Distrito Federal. No local, haverá postos de recolhimento de armas e munições. Hoje, as ONGs que combatem a violência em Brasília vão se reunir para definir a inauguração do comitê central pró-desarmamento.
Na frente contrária, não há previsão de comitês nem showmícios, segundo Fraga. “A mídia está contra a nossa proposta e joga pesado. Somos massacrados nas novelas e no noticiário. Quando entrarmos na Globo, falaremos finalmente a verdade”, acredita.
TSE vota instruções Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) votam hoje as normas para a realização do referendo sobre o comércio de armas no país, que será realizado em 23 de outubro. São instruções que vão disciplinar as campanhas a favor e contra o desarmamento, pesquisas de opinião, propaganda de rua e no rádio e na televisão, financiamento e prestação de contas. No total, são 12 instruções já aprovadas pelo presidente do TSE, ministro Carlos Velloso, mas que precisam ser ratificadas pelos demais integrantes do tribunal. Para realizar a votação, a Justiça Eleitoral prevê gastos superiores a R$ 200 milhões — o que inclui o recadastramento de eleitores de vários estados. |
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