A Polícia Federal deve esclarecer, em alguns dias, o mistério que ronda os R$ 15,5 milhões que o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza garante ter repassado ao publicitário de Lula, Duda Mendonça, que, por sua vez, assegura que nada recebeu. A resposta pode estar na empresa off-shore Dusseldorf Company Ltd, com sede nas Bahamas (EUA), titular de uma conta no Bank of Boston International, em Miami (EUA). “Há também uma outra conta na Suíça, que também está sendo rastreada”, relata fonte da Polícia Federal, em Brasília.
Dono de agência de publicidade, Duda Mendonça, que atuou na campanha de Lula à Presidência da República em 2002, é apontado por Marcos Valério como o destinatário de R$ 15,5 milhões sacados de suas empresas. Sócia de Duda, Zilmar Fernandes da Silveira teria sido a responsável pelas retiradas. A PF investiga a possibilidade de a conta da Dusseldorf ter sido destinatária dos saques que Marcos Valério alega terem beneficiado o publicitário Duda Mendonça e que teriam sido efetuados por sua sócia.
As datas dos repasses coincidem com o período em que a agência de Duda Mendonça ainda não tinha contrato com o governo. Em agosto de 2003, ele ganhou uma licitação para prestar serviços de publicidade institucional à Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica da Presidência da República. Levantamento do deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) mostra que Duda Mendonça recebeu cerca de R$ 110 milhões na administração Lula. A sócia do publicitário Duda Mendonça, Zilmar Fernandes da Silveira, cuida das imagens de Lula e da primeira-dama, Marisa Letícia Lula da Silva, desde a eleição de 2002. Ela depõe amanhã na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Correios como testemunha.
Depoimento
Em Salvador, o publicitário Duda Mendonça negou ter participado do esquema do mensalão. Ele afirmou que está incomodado com a ligação do nome dele com a lista de beneficiários do esquema. Duda compareceu à Superintendência da Polícia Federal em Salvador, acompanhado da publicitária Zilmar Fernandes da Silveira, onde se pôs à disposição para esclarecimentos sobre o mensalão.
Mas o depoimento não foi tomado. O superintendente regional da PF da Bahia, Paulo Fernando Bezerra, informou-se , com a PF de Brasília, de que os nomes de Duda Mendonça e de Zilmar não constavam da relação dos indiciados no inquérito sobre o mensalão. “Ele (Duda Mendonça) não foi intimado pela superintendência da Bahia porque, até o momento, não recebemos qualquer documento nesse sentido, seja uma carta precatória ou um pedido de localização”, disse Bezerra.
Duda e Zilmar preencheram requerimentos comunicando os endereços deles e do advogado, onde podem ser intimados para depor, numa demonstração de que querem “colaborar” com as investigações. Duda Mendonça disse que não tinha nada a ver com “as irregularidades que estão noticiando” sobre ele. Paulo Fernando Bezerra disse que não saberia o que perguntar ao publicitário porque desconhece os detalhes da investigação.
O marqueteiro do PT foi preso em 21 de outubro de 2004 numa rinha de galos de briga, no Rio, pelos agentes da Delegacia do Meio Ambiente da PF. Após o episódio, a delegacia foi quase que desmontada, com o afastamento dos delegados Lorenzo da Hora e Antonio Rayol, além dos agentes Luiz Amado e Marcelo Guimarães. Todos atuaram na prisão e indiciamento do publicitário.
A contrapartida das urnas
As intensas relações entre governos e agências de publicidade podem parecer novidade após o estouro do escândalo do mensalão, mas não são. O publicitário Duda Mendonça, uma das principais referências do setor no Brasil, é prova viva disso. Responsável pela comunicação do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República, em 2002, o publicitário possuía apenas um contrato com o governo anterior, fechado com o Banco Central do Brasil, que vigorou entre dezembro de 1999 e dezembro de 2002.
Consagrada a vitória de Lula à Presidência, Mendonça arrebatou três das principais contas do governo federal: Ministério da Saúde, Petrobras, uma das empresas públicas que mais investem em publicidade, e a própria Presidência da República. Situação exatamente inversa ocorreu com a DM9 DDB Publicidade, de Nizan Guanaes, responsável pela campanha do adversário de Lula, José Serra (PSDB), em 2002.
A DM9 chegou a ter nove contratos no governo do apoiador de Serra, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: dois com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que vigoraram entre junho de 98 e dezembro de 2001, e entre agosto de 2001 e junho de 2002; três com os Correios, entre março de 94 e março de 95 e entre janeiro de 96 e janeiro de 98. O terceiro ainda não venceu. Foi fechado em novembro de 2001 e tem encerramento previsto para o mês que vem. A empresa de Guanaes tinha ainda contrato com a então Telecomunicações de São Paulo (Telesp), extinta com a privatização do setor de telefonia. No governo Lula, a DM9 não figura como fornecedor, seja por não ter participado de licitações, ou por não ter conseguido vencê-las. A nova empresa de Nizan Guanaes, que se desligou da DM9 para fundar a Africa, também não aparece como fornecedora do governo federal.
O perde-e-ganha de contas publicitárias federais, no entanto, não se restringe a caciques da propaganda nacional. A agência Giovanni FCB S/A, cujo último contrato com o governo federal, assinado com o Ministério da Saúde, havia se encerrado em setembro de 2002, retornou em grande estilo no governo Lula. A agência, que teria ligações com o secretário-geral licenciado do PT, Silvio Pereira, trabalha atualmente para o Banco Central do Brasil e para os Correios. Em governos anteriores, a empresa chegou a ter também a conta do Banco do Brasil, em 1994 e 1995.
Já a agência Fisher América Rio Comunicação Total manteve uma certa relação de forças em meio às contas publicitárias federais. Após trabalhar para o Banco do Brasil entre 1996 e 2000, para a Caixa Econômica Federal entre 2001 e 2004, e para os Correios entre 2000 e 2002, fechou contrato com a BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras. A empresa conseguiu ainda novo contrato com a CEF. A Fisher teria ligações com o presidente afastado com Banco Popular, Ivan Guimarães e com o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, também afastado do cargo, Henrique Pizzolato.
Mesmo com a mudança de governo, a agência Artplan também conseguiu se manter trabalhando para o Planalto. A empresa, que seria ligada ao ex-ministro do Trabalho, Francisco Dornelles, deputado pelo PP do Rio de Janeiro, mantém a conta do ministério do Trabalho e Emprego, ao menos até os próximos dias. O contrato foi assinado em 20 de setembro de 2001, quando Dornelles comandava a pasta, e vigora até o dia 20 do mês que vem. A Artplan possuía contrato com o Incra, que vigorou entre dezembro de 2001 e dezembro de 2002, e com a extinta Telecomunicações do Rio de Janeiro (Telerj), entre outubro de 1997 e outubro de 1998. No atual governo, a Artplan detém ainda as contas da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) e da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), mas já não atua para o Incra.
A Master Publicidade S/A viu sua participação nas contas publicitárias do governo federal emagrecer. A empresa, que já chegou a ter dois contratos com o Banco do Brasil, entre 94 e 2000, um com o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), de 1994 a 1995, e quatro contratos com o Ministério da Saúde, mantém apenas uma conta no atual governo, exatamente a do Ministério do Trabalho, com término previsto para dia 25 do mês que vem.
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As contas de publicidade do governo
Agência – DM9
Governos de Fernando Henrique Cardoso – Dois contratos com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), três com os Correios, três com o Ministério da Saúde, um com a Telesp
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – Não aparece entre agências prestadoras de serviços.
Agência – Duda Mendonça e Associados Ltda
Governo de Fernando Henrique Cardoso – um contrato com o Banco Central, um contrato com a extinta Telebrás
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – Presta serviço para Presidência da República, Ministério da Saúde e Petrobras
Agência – Artplan
Governos de Fernando Henrique Cardoso – um contrato com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), um com a Telecomunicações do Rio de Janeiro (Telerj) e um com o Ministério do Trabalho e Emprego
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – Tem contratos com o Ministério do Trabalho e Emprego, assinado no governo anterior, Embratur e Infraero.
Agência – Master Publicidade S/A
Governos de Fernando Henrique Cardoso – dois contratos com o Banco do Brasil, um contrato com o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), quatro contratos com o Ministério da Saúde, um contrato com a Telecomunicações do Paraná.
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – um contrato com o Ministério da Saúde assinado no governo anterior.
Agência – Giovanni FCB S/A
Governos de Fernando Henrique Cardoso – um contrato com o Banco do Brasil, um contrato com o Ministério da Saúde.
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – um contrato com o Banco Central do Brasil e um com os Correios.
Agência Fisher América Rio Comunicação Total Ltda
Governos de Fernando Henrique Cardoso – um contrato com o Banco do Brasil, um com a Caixa Econômica Federal e um com os Correios
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – BR Distribuidora e Caixa Econômica Federal
Agência – F/Nazca
Governos de Fernando Henrique Cardoso – não consta entre os fornecedores
Governo de Luiz Inácio Lula da Silva – atende a Petrobras juntamente com Duda Mendonça
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