O escândalo do mensalão interrompeu ontem uma carreira parlamentar de 23 anos. E foi justamente do homem que denunciou a existência do suposto esquema de pagamento de mesada de R$ 30 mil a deputados do PP e do PL. Com 313 votos a favor, 156 contra, 13 abstenções, cinco brancos e dois nulos a Câmara cassou o mandato do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Foram apenas 56 votos a mais do que 257, o mínimo necessário. O ex-presidente do PTB e ex-integrante da tropa de choque do ex-presidente Fernando Collor de Mello perde os direitos políticos e ficará oito anos inelegível. Só poderá candidatar-se a qualquer cargo público a partir de 2015.
Na sessão presidida pelo vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nonô (PFL-AL), devido ao escândalo envolvendo o presidente Severino Cavalcanti (PP-PE), 489 deputados lotaram o plenário, em um dos momentos com o mais alto quórum do ano. Com camisas e faixas com os dizeres “Eu acredito em Roberto Jefferson”, partidários do petebista também encheram as galerias. Até mesmo os deputados citados no escândalo do mensalão apareceram para ouvir a acusação e a defesa de Jefferson, como o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP).
Já o deputado José Dirceu (PT-SP), ex-chefe da Casa Civil, o maior alvo das denúncias do ex-presidente do PTB e que também enfrenta processo de cassação, apenas registrou presença no painel eletrônico e só apareceu à noite para depositar o voto na urna. Entrou na fila pouco antes de Jefferson. Votou sem incluir a cédula no envelope, o que provocou a anulação.
Nos discursos durante a sessão, nenhum argumento foi capaz de demover os deputados de cassar o petebista. Nem o discurso inflamado de Jefferson, que fez o barulhento plenário silenciar-se, nem de seus advogados convenceram os deputados a preservarem os direitos políticos do petebista.
O prognóstico da cassação já era feito no Congresso antes até do Conselho de Ética recomendar a perda de mandato, em votação unânime no dia 1º de setembro. O resultado já era esperado até por Jefferson tanto que, sem ter iniciado nem mesmo a votação no plenário da Câmara, os advogados dele já se dirigiram ao Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a decisão do Congresso (leia reportagem na página 9).
Denúncia
O mandato de Jefferson começou a se esvair há exatos quatro meses, também num dia 14, exatamente um mês antes do aniversário em que Jefferson completou 52 anos. Naquele dia de maio, surgiram as denúncias que acusaram o petebista de comandar uma rede de corrupção nos Correios e, em seguida, no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB). Sentindo-se acuado, com uma entrevista o petebista arrastou o Congresso e o governo para uma crise sem precedentes e comprometeu seu futuro político. Denunciou o mensalão, apontou os deputados do PP e o PL como recebedores da mesada e o publicitário Marcos Valério como operador do esquema.
Foi por denunciar o mensalão mas sem apresentar provas que o relator do processo, Jairo Carneiro (PFL-BA), propôs a cassação do mandato de Jefferson. Mas a situação do petebista se complicou mesmo devido às confissões que ele fez ao apresentar minúcias na sua relação com o governo e com o PT. O ex-presidente do PTB confessou ter recebido dos petistas R$ 4 milhões de caixa 2, dinheiro destinado a campanhas eleitorais e não declarado à Justiça. Admitiu ainda indicar apadrinhados para cargos públicos com o objetivo de estreitar relações com empresários e obter recursos para o partido.
“Todos nós o homenageamos pelo ato de coragem e destemor de denunciar a corrupção do governo, mas ele mesmo reconheceu os crimes que cometeu”, reforçou o deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA). Com as confissões, nada do que argumentaram os advogados de Jefferson foi levado em conta. Até mesmo os discursos de 15 minutos a que cada um dos dois defensores teve direito foram sufocados pelo burburinho do plenário.
“Todos nós o homenageamos pelo ato de coragem de denunciar, mas ele (Jefferson) mesmo reconheceu os crimes “ |
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