Ao contrário das campanhas políticas tradicionais, que enchem as ruas com panfletos e brindes e garantem emprego temporário a alguns militantes, a do referendo sobre comércio de armas não provoca sujeira, nem dividendos. Os adversários têm opiniões diferentes sobre o tema, mas guardam em comum uma reclamação: falta dinheiro para assegurar uma farta distribuição de filipetas, camisetas e para o aluguel de outdoors. A solução encontrada pelos dois lados é partir para o corpo-a-corpo. Desde agosto, representantes das duas frentes participam de uma maratona de palestras e debates pelo país todo.
“Estamos sem grana nenhuma”, confessa o secretário-geral da frente Brasil Sem Armas, deputado Raul Jungmann (PPS-PE) ao explicar a tática de rodar o país para discutir o tema em escolas, universidades, entidades de classe, além de empresas públicas e privadas. Os parlamentares que participam da chapa favorável ao fim do comércio de armas participaram de 36 eventos do gênero desde o dia 1º de agosto, data em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizou os representantes das duas frentes a darem a largada à propaganda de rua.
Os que defendem a manutenção da venda de armas também têm uma rotina tumultuada. Nos últimos 50 dias, representantes da frente Pelo Direito à Legítima Defesa participaram de 30 debates ou palestras. Na hora de justificar a opção de se dirigir a pequenas platéias, em vez de investir em uma propaganda de massa, recorrem ao mesmo argumento dos que lutam pelo fim da venda de armas: “Não temos dinheiro. Estamos apostando na informação, indo no máximo de lugares possíveis”, explica o presidente da frente, deputado Alberto Fraga (PFL-DF), que participou de 15 eventos neste período, contra seis em que esteve o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente da frente adversária.
Calheiros engrossa o coro dos descontentes. Durante evento em Fortaleza (CE), na quinta-feira, ele criticou o governo federal por não investir mais na divulgação do referendo, limitando-se a comunicar a data nos veículos de comunicação de massa.
A maioria dos parlamentares que integram as duas frentes enfrenta dificuldades para conciliar a agenda política com os compromissos da campanha para o referendo. Na última quarta-feira, o Congresso parou para acompanhar o discurso de renúncia de Severino Cavalcanti (PP-PE). Naquele momento, Jungmann estava no lançamento da campanha da frente em Brasília, no Teatro Dulcina, entretido com discursos e apresentação de grupos musicais, completamente alheio ao que acontecia no mundo político. “Tive que fazer uma opção e quis vir aqui. Vou fazer umas ligações e descobrir o que aconteceu”, contou o deputado. No ato, parentes de vítimas de armas de fogo e políticos fizeram discursos. Em seguida, a platéia assistiu a apresentação de grupos musicais do DF, como o Batucada.
Reforço
Para compensar a falta de tempo dos parlamentares, as organizações não-governamentais (ONGs) envolvidas com a campanha atendem a boa parte dos convites para debates e palestras. “Há muito tempo eu não durmo duas noites no mesmo local”, conta o coordenador de desarmamento do Viva Rio, o sociólogo Antônio Rangel. A entidade tem 30 pessoas capacitadas a participar, discutir e fazer apresentações sobre o tema. Desde o início de agosto, os especialistas participaram de 104 eventos e têm mais de 20 agendados para as próximas semanas.
Defensora da venda de armas, a ONG Viva Brasil recrutou 20 especialistas para viajar pelo país participando de atos públicos. A entidade garante ter realizado 170 debates e ter mais 100 marcados para as próximas quatro semanas. “Não temos condições de atender a todos os compromissos”, lamenta o sociólogo Bené Barbosa, presidente da Viva Brasil, que, assim como os representantes da Viva Rio, garante sempre ser o vitorioso dos debates que comparece.
Pelos dois lados, há outras organizações ou associações de bairro de menor visibilidade, mas nem por isso menos atuantes. “Têm muito debates que acontecem no país e nós nem ficamos sabendo”, sustenta Rangel. Muitas dessas entidades cumprem, ainda que de maneira tímida, o papel das frentes na hora de promover eventos, entregar panfletos e distribuir camisetas com dizeres contra ou a favor do comércio de armas.
Para se ter uma idéia da dificuldade que as frentes enfrentam para divulgar as suas posições nos estados, a Brasil Sem Armas tem comitês em 14 estados, já a adversária está presente em 11 unidade da federação. Nos locais onde os comitês ainda não foram formados, são as ONGs que ficam encarregadas de esclarecer a população.
Os comitês das duas frentes guardam diferenças significativas. Os favoráveis ao fim do comércio de venda de armas contam com o apoio de entidades da sociedade civil, que agem por orientação da frente Brasil Sem Armas . No caso da Pelo Direito à Legítima Defesa, os comitês são, na verdade, representações políticas. Ou seja, deputados estaduais ou federais que cedem seus gabinetes nos estados para defender a venda de armas.
OS NÚMEROS DA CAMPANHA
Debates e palestras
Viva Rio – 104
Viva Brasil – 170
Pela Legítima Defesa – 30
Brasil Sem Armas – 36
Comitês estaduais
Pela Legítima Defesa: 11
Brasil Sem Armas: 14
“Não temos dinheiro. Estamos apostando na informação, Indo no máximo de lugares possíveis” |
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