A prestação de contas do PT referente a 2003 não satisfez o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Diante da avalanche de denúncias sobre a existência de um caixa 2 e das suspeitas de irregularidades no uso dos recursos do Fundo Partidário, o ministro Gilmar Mendes, do TSE, intimou ontem o diretório nacional do partido a fornecer, em 20 dias, informações complementares sobre sua movimentação financeira em 2003. O magistrado também solicita que o PT se manifeste sobre as declarações do hoje ex-tesoureiro do partido, Delúbio Soares, que admitiu ter movimentado recursos não declarados à Justiça Eleitoral.
No despacho, Mendes aponta 25 questões levantadas pela Unidade de Contas Eleitorais e Partidárias do TSE. É com base nesses pontos que ele intima o PT a apresentar comprovantes, documentos e notas explicativas. A unidade de contas do tribunal reclamou, por exemplo, da falta de comprovantes de transferências bancárias ou outros comprovantes de repasse de recursos do Fundo Partidário em favor de diretórios infrapartidários no montante de R$ 7.871.754,79. O tribunal também quer que o PT explique suspeitas de que as contas bancárias destinadas a receber exclusivamente dinheiro do fundo partidário teriam sido destinadas para movimentar outros recursos. Os técnicos do TSE encontraram indícios de que os recursos do fundo partidário foram utilizados para pagamento de dívida assumida com o Banco do Brasil.
Segundo os técnicos, o partido assumiu empréstimos em 2003 no montante de R$ 15.317.240, além do saldo a pagar proveniente do exercício financeiro de 2002 no montante de R$ 950.251,38. “Diante do valor expressivo, o partido deverá esclarecer a finalidade da captação de altos empréstimos, apresentar cópia autenticada dos contratos que deram origem à liberação dos recursos financeiros e dos comprovantes pagamentos da dívida e exibir o cronograma de amortização/quitação da dívida”, diz o texto.
A polêmica em torno das contas do partido aumentou depois que o jornal O Estado de S. Paulo questionou o destino dos recursos do fundo partidário do PT. Os fundos partidários são abastecidos com dinheiro público e divididos entre todos os partidos de acordo com o desempenho eleitoral de cada um. Segundo o jornal, o PT teria pago com dinheiro do fundo passagens aéreas para os filhos, as noras, um genro e uma neta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na virada de 2002 para 2003, período da transição de governo. Os documentos também mostrariam que o partido bancou passagens aéreas para a mulher e a filha do ministro da Fazenda, Antonio Palocci.
Por conta dessas acusações, o senador Alvaro Dias (PSDB-PR) chegou a protocolar denúncia no TSE contra o PT pelo uso irregular de recursos do fundo partidário.
Questionamentos |
A maior crise política enfrentada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve origem na disputa dos partidos aliados por cargos na máquina pública. A avaliação feita pelo deputado José Dirceu (PT-SP), ex-chefe da Casa Civil e ex-homem forte do governo, foi apresentada ontem aos integrantes do Conselho de Ética, quando o petista apresentou sua defesa. Para Dirceu, a disputa pela indicação de apadrinhados foi “a raiz” de seus atuais problemas, entre os quais o principal é estar sob grave risco de cassação do mandato.
Ao depor por mais de cinco horas no conselho, Dirceu fez pela primeira vez em público a avaliação que já repete aos colegas mais próximos desde que a crise o obrigou a deixar a chefia da Casa Civil, em junho. O deputado diz que o motivo da mágoa do ex-deputado Roberto Jefferson contra ele é o fato de ter vetado vários nomes indicados pelo petebista para vagas no governo.
“A raiz do conflito está em não permitirmos a Roberto Jefferson ter duas diretorias dos Correios. Pedimos várias vezes para trocar de nomes”, relatou. Ele contou que Jefferson exigia que o PTB indicasse duas diretorias nos Correios: a de Administração e de Tecnologia, uma das mais importantes da estatal. Para os cargos, o ex-deputado teria indicado vários nomes que Dirceu vetou, por inconsistência técnica ou dúvidas quanto à reputação. No final, o PTB conseguiu indicar Antônio Osório para a diretoria de Administração, foco da corrupção que detonou toda a crise política.
O PT indicou o ex-diretor de Tecnologia Eduardo Medeiros. Dirceu também disse ter vetado alguns nomes apresentados pelo PTB para presidir o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) e lembrou as dificuldades narradas pelo próprio Jefferson para indicar nomes na Eletronorte. O ex-chefe da Casa Civil também sugeriu ter as mesmas dificuldades com outros partidos aliados.
Avaliou apenas que o fato de ter vetado nomeações lhe trouxe os desgostos atuais. “Está aí a raiz de muitos problemas que eu tenho hoje.” No depoimento, que foi a sua defesa no pedido de cassação apresentado pelo PTB, Dirceu anunciou ter entrado com um recurso na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ). O deputado exige que o PTB tenha direito de retirar a representação contra ele. A pedido de Jefferson, o PTB pediu a retirada do processo, mas o Conselho de Ética não permitiu. Dirceu avisou que pretende recorrer até o Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a seu algoz o direito de desistir da acusação.
Dirceu ainda acusou a oposição e a mídia de tramar “um golpe branco” para impedir Lula de se reeleger.
“O processo político foi ganhando contornos de golpe branco, inclusive pedido ao presidente para renunciar “ |
O que ele disse
Inocência
O deputado José Dirceu (PT-SP) voltou a dizer que não há provas contra ele e que o julgamento é apenas político. “O que está em jogo não é a acusação, seja ela qual for. Na verdade, o que está se julgando, por mais que possa parecer falta de humildade e de modéstia, é minha história. O que está se procurando julgar é o governo do presidente Lula.”
Recurso
O deputado avisou que recorreu à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara para o PTB ter direito de retirar a representação contra ele. O partido pediu, mas o Conselho de Ética impediu a retirada. “Recorri hoje à CCJ e vou recorrer aos tribunais. Se quem representa retira, isso tem um peso político extraordinário. A principal prova testemunhal é retirada.”
Golpe
O ex-chefe da Casa Civil acusou diversas vezes a oposição de usar o escândalo para derrubar o governo Lula. Acusou a mídia de agir como partido político e desejar a sua cassação. “O processo político foi ganhando contornos de golpe branco, inclusive pedido ao presidente para renunciar ao direito de se reeleger e eu de me defender e renunciar. Eu não quero renunciar, quero me defender.”
Duda
Apesar de ser presidente do PT em 2002, o petista negou saber dos valores pagos ao marqueteiro Duda Mendonça. Negou também a existência de caixa 2 na campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da República. “Quem negociou foi Delúbio Soares. Não tomei conhecimento específico dos valores e como seria pago. Para mim, tínhamos pago a campanha de Duda Mendonça.”
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