Em encontro a portas fechadas, os ministros do Planejamento, Paulo Bernardo, e da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, acertaram a liberação de R$ 100 milhões do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP), que garante repasses às polícias civis e militares dos estados. O dinheiro, contingenciado pela equipe econômica, estará disponível até o final do mês.
Ronaldo de Oliveira/CB/20.10.05)
Antes mesmo de sair o resultado do referendo sobre comércio de venda de armas e munições no país, realizado no domingo, Bastos previu que as urnas mandariam um recado: a população passaria a examinar com lupa as iniciativas do governo em relação à segurança pública.
O Planejamento apertou o cinto da maioria dos ministérios em abril deste ano. No caso da Justiça, não foi diferente. A pasta teve que reduzir a verba prevista para o fundo, que abastece o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). De R$ 412 milhões, o valor despencou para R$ 169 milhões, o equivalente a 58,8% do que a equipe de Bastos havia planejado investir nos estados ao longo deste ano. O acordo entre os dois ministros elevou a verba para R$ 270 milhões, que têm de ser gastos até dezembro. Mas R$ 142 milhões não têm prazo para ser liberados.
“Mesmo nas derrotas, existem conquistas”, reconhece o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), secretário-geral da Frente Parlamentar Brasil Sem Armas, que saiu derrotada na consulta popular. Ele acredita que “o referendo vai projetar a sua sombra sobre 2006, e a segurança pública vai estar no centro das discussões”. Para o parlamentar, o referendo contribuiu para aumentar a cobrança da população em relação ao tema, e o fato de o governo rever os valores que gasta com segurança demonstra que o Executivo vai encarar o assunto com mais rigor.
Críticas
Adversário de Jungmann na campanha, o deputado Alberto Fraga (PFL-DF), presidente da Frente Parlamentar pelo Direito à Legítima Defesa, disse que o aporte de mais R$ 100 milhões não elevou o valor do fundo, a ponto de ultrapassar de forma significativa o que foi gasto com a realização do referendo: R$ 250 milhões, segundo o Tribunal Superior Eleitoral. “Qualquer pesquisa aponta que o anseio maior do povo, depois de emprego, é segurança. Esses valores mostram o total descaso do governo com a área”, criticou o parlamentar.
Fraga anunciou que os parlamentares que compõem a frente irão se reunir nos próximos dias para elaborar uma pauta de reivindicações ao governo. Uma das sugestões será a de assegurar repasses constitucionais do FNSP aos estados, assim como ocorre nas áreas de saúde e educação. A proposta encontra respaldo nos secretários estaduais de Segurança Pública que, em maio, estiveram em Brasília para exigir a medida do Ministério da Justiça. No Congresso Nacional, a vinculação de recursos também é defendida por adversários de Fraga, como o próprio Raul Jungmann. “Junto com a saúde e a educação, a segurança é um dos pilares da sociedade. Mas não tem sido uma prioridade”, reclama.
A avaliação de que o resultado reflete a insatisfação da sociedade com as políticas de prevenção e combate à criminalidade não se limita ao Congresso. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, afirma que a avaliação popular da segurança pública é péssima. “Quando o povo votou em Lula, votou em um metalúrgico, em um operário exatamente para trazer a esse país as grandes reformas que o país necessitava. E dentro dessas reformas, uma de suas maiores aspirações era uma política clara e decente para a segurança pública. E agora o povo volta para dizer a Lula, pela primeira vez depois de sua eleição, que sua nota é zero em relação à segurança pública no país”, avaliou.
Mas o especialista George Felipe Dantas aponta que os programas de segurança pública e sua execução são eficientes. “Mas a gasolina para rodar é pouca”, compara, referindo-se aos recursos parcos. “A política de segurança pública está correta. O que não está certo é destinar poucos recursos à área”, critica. O assessor de políticas de direitos humanos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) Caio Varela concorda. “O Plano Nacional de Segurança Pública é muito bom, mas, com a verba recebida pelo Ministério da Justiça, não há como executá-lo”, lamenta. A crítica encontra respaldo dentro do próprio governo. O secretário nacional de Segurança Pública, Luiz Fernando Corrêa, costuma defender que os recursos para o FNPS deveriam chegar a R$ 1,2 bilhão, quatro vezes mais do que o valor do orçamento deste ano.
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