Na contramão dos alegres discursos presidenciais sobre como o Brasil está melhor, de uns tempos para cá, um grupo de 26 entidades civis apresentou ontem, em São Paulo, o relatório “Direitos Humanos no Brasil – 2005”. São 260 páginas desoladoras, onde despontam, entre as principais denúncias, um total de 50 mil mortos na violência urbana (eram 40 mil no relatório anterior), um déficit de 7 milhões de moradias (eram 6 milhões em 2004), uma mulher brasileira espancada ou forçada a relações sexuais a cada 15 segundos, trabalhadores em canaviais perdendo a cesta básica se não produzirem 10 toneladas de cana por dia e crianças indígenas morrendo de subnutrição porque as terras de lavoura das tribos são continuamente invadidas por madeireiros.
Esses números, e uma penca de outros de igual sabor a respeito de trabalho escravo, Amazônia, favelas e cortiços, migrantes ilegais – entre outros itens – preenchem os artigos, escritos por 36 autores. Eles chegarão, certamente, às mãos da representante das Nações Unidas, a paquistanesa Hina Jilani, que está no País para avaliar os direitos humanos. Seu relatório geral, a ser apresentado em Genebra, em abril de 2006, talvez contenha impressões que o governo não esperava.
“O que se percebe por trás dos muitos índices divulgados é que não existem ainda, no Brasil, políticas estruturais para lidar com violações, em área nenhuma”, adverte Maria Luisa Mendonça, diretora da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos e uma das coordenadoras do trabalho.
“Essa situação permanece, ano a ano, e não vemos medidas eficazes sendo adotadas”, acrescenta.
A violência policial nas metrópoles é um dos pontos críticos do trabalho. O total de 50 mil mortos, adverte Maria Luisa, “é superior ao dos países que vivem em guerra civil”. E são dados oficiais, recolhidos principalmente por ouvidorias junto a governos dos Estados. Cabe lembrar que no Iraque, em dois anos e meio de guerra, o total de vítimas civis foi de aproximadamente 30.900 (segundo o site do grupo Iraq Body Count).
Preparado pela professora Silvia Ramos, da Universidade Cândido Mendes, do Rio, o capítulo da violência policial mostra que apenas a polícia de três estados – São Paulo, Rio e Minas Gerais – matou “quase cinco vezes mais que todas as polícias de todos os Estados americanos, juntas”.
Entre os autores dos artigos estão o economista Marcio Pochman, o suíço Jean-Pierre Leroy, do Projeto Brasil Sustentável, Suzana Lisboa, da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, e o líder do MST João Pedro Stédile.
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