Pouco comum no Brasil, a conta do DPF está no azul. Para barrar as fraudes de R$ 9,08 bilhões, a PF consumiu, em média, R$ 8,5 milhões com as operações especiais, o que corresponde a pouco mais de 1% do total surrupiado pelos grupos criminosos. Algumas operações envolveram o trabalho de mais de 200 homens, considerando apenas o dia D da ação, já que algumas consumiram recursos por mais de dois anos, durante o trabalho de inteligência e investigação, que tem um efetivo menor.
A análise do número de operações ano a ano demonstra que a estratégia tem sido vitoriosa. Em 2003, a PF fez 16 operações, número que saltou para 42 no ano seguinte e, em 2005, foram 60. O total de 2.292 presos foram assim distribuídos: 223, em 2003, 703, em 2004, e 1.366, no ano passado. O diretor do DPF, delegado Paulo Lacerda, atribui o sucesso desse tipo de ação ao aprimoramento dos serviços de inteligência, de planejamento e ainda de mobilização de pessoal. “É a reunião desses três fatores que viabiliza as operações.
Temos um efetivo relativamente pequeno para agir em todo o país”, explica.
Com intenção de intensificar esse tipo de trabalho, Lacerda anunciou novos investimentos, como a compra de uma aeronave Jet Classic, com capacidade para 50 homens e autonomia para viajar a qualquer lugar do país. “Antes contávamos com o apoio da Aeronáutica e agora podemos ter mais agilidade nos deslocamentos”, complementa. Para o diretor, a tendência este ano é intensificar as operações de grande porte, com a melhoria da análise de informação e os instrumentos adequados
de logística.
Diretriz mantida
Indiferente às pressões dos investigados, Lacerda diz que esta é uma característica do trabalho de investigação e a diretriz de combate à corrupção será mantida.Com um orçamento anual de pouco mais de R$ 2 bilhões, os R$ 1,59 bilhão em bens apreendidos seriam suficientes para pagar as contas da PF no período. Mas, apesar dos mecanismos
que prevêem o confisco dos bens em favor da União, a realidade é outra. A Polícia Federal, que poderia ser auto-suficiente, ao contrário, defende agora uma melhoria na legislação para conseguir se beneficiar dos recursos.
A demora na confirmação das sentenças de perdimento dos bens pelo Judiciário e a burocracia da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) para dar destinação a eles ou mesmo organizar os leilões, de acordo com juízes federais, impedem o repasse de 40% dos valores arrecadados à PF. O diretor Paulo Lacerda, um defensor do confisco de bens, confirma a
dificuldade e diz que a corporação tem se beneficiado apenas pontualmente desse instrumento.
“Especialmente no tráfico de drogas, aeronaves e veículos que interessam à polícia, têm sido disponibilizados de imediato”, afirma Lacerda.
Confisco
O juiz da 5ª Vara da Justiça Federal (criminal) de Goiás, Alberico Rocha, diz que o confisco dos bens é, de fato, a mais eficaz forma de combate às organizações criminosas, já que o patrimônio muitas vezes é colocado acima da liberdade e da própria vida pelos homens. Entretanto, admite que esse instrumento pode se transformar em problema
devido à demora no processo de perdimento.
Pa ra vencer essa barreira, Rocha explica que uma interpretação cuidadosa da lei
permite a venda de bens, como fazendas, cabeças de gado e empresas, antes mesmo do trânsito em julgado. Os valores são depositados numa conta judicial até o término do processo. Em abril, acontece naquele estado, o leilão dos bens apreendidos do traficante Leonardo Mendonça, durante a operação Diamante, ocorrida em 2002.
Os inúmeros recursos têm dificultado a administração das 10 fazendas que pertenciam a Mendonça e, por isso, a necessidade do leilão. Um levantamento da polícia demonstrou que integrantes do grupo do traficante tinham rendimento mensal de R$ 50 mil, somente com a venda de cacau de um dos imóveis, sem contar os negócios com 5 mil cabeças de gado.
Rezando na mesma cartilha, o juiz federal de Tocantins,José Godinho Filho, que autorizou o leilão, vai mais longe e diz que somente para responder a um ofício sobre a possível destinação de um bem apreendido a Senad consumiu mais de cinco meses. “Quando a resposta chegou, já tinha dado a sentença. É preciso uma legislação mais ágil e menos burocracia para que o Estado possa, de fato, tirar vantagem dos valores produzidos pelas atividades criminosas”, conclui.
PF gastou R$ 8,5 mi
MARIA CLARA PRATES
DO ESTADO DE MINAS
Dados do Departamento de Polícia Federal (DPF) revelam aos brasileiros que a farra com o dinheiro público no país, nos últimos três anos, atingiu a impressionante cifra de R$ 9,08 bilhões, somente em fraudes contra o INSS, o sistema financeiro, o meio ambiente e também com a sonegação de impostos federais. A conta bilionária,entretanto, representa apenas os valores de 25 operações de maior destaque, de um total de 118, realizadas em 2003, 2004 e no ano passado pela PF, e deixa o cidadão ainda mais preocupado, por ser um retrato de pouco mais de um quinto das operações. Além de estancar a sangria, em alguns
casos iniciada ainda na década de 90, os federais também arrecadaram R$ 1,59 bilhão, no mesmo período, em bens apreendidos de organizações criminosas, dedicadas
ao tráfico de drogas ou mesmo quadrilhas especializadas em usurpar as verbas públicas.
Do total de 2.292 pessoas presas, quase um terço é formado por servidores públicos, que usaram da função para facilitar os inúmeros golpes.Algumas dessas operações tiveram o objetivo de atingir praticamente toda a estrutura administrativa
e política de estados, como ocorreu em Roraima. No dia 26 de novembro de 2003, foram presas 53 pessoas, entre elas, o exgovernador Neudo Campos, sob a acusação de inflar, com fantasmas, a folha de pagamento do estado.
O esquema funcionava desde 2002 e o dinheiro arrecadado, por meio dos falsos salários, era repartido depois entre os aliados. Estima- se que o prejuízo tenha superado os R$ 300 milhões.
Vampiro
Em Brasília, o Ministério da Saúde também teve sua estrutura abalada desde a operação Vampiro, em maio de 2004, com reflexos também no Rio de Janeiro e em São Paulo. A pedido do próprio ministério, foi desmontada uma quadrilha que gerou um rombo de US$ 2 bilhões, no período de 1990 a 2002, por intermédio da compra de produtos
derivados de sangue a preços superfaturados. Nessa farra, pelo menos 14 servidores estavam envolvidos, além de outras 14 pessoas, entre lobistas e empresários.
No Rio de Janeiro, a operação Caravelas, para reprimir o tráfico internacional de cocaína, abalou o charmoso mundo gastronômico carioca, em setembro passado. Sócios do badalado restaurante Satyricon e da pizzaria Capricciosa foram presos sob a acusação de enviar a droga para Portugal, acondicionada em buchos bovinos. Somente nessa investida, os federais apreenderam bens avaliados em mais de R$ 40 milhões, sendo que entre eles estavam R$ 5 mil em euros e dólares, além de 22 carros, 17 deles importados e blindados.
Uma atenção especial foi dedicada também às fraudes contra os cofres do INSS. Várias ações da PF tentaram conter o ralo em diversos estados, especialmente no Rio, onde no ano passado foram realizadas operações como a Caronte, Ajuste Fiscal e Monte Negro.
“Temos um efetivo pequeno para agir em todo o país”
Paulo Lacerda
NÚMEROS
Dos 2.292 presos,
60 %
foram detidos
em 2005
Matéria publicada em15/01/2006 – Domingo
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