Ugo Braga e Izabelle Torres
Da equipe do Correio
Na véspera da decisão constitucional mais esperada pelos políticos este ano — a respeito da fidelidade partidária —, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem à tarde projeto aumentando os salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), justamente os juízes da causa. Pelo texto, que ainda precisa passar pelo plenário da Casa, o vencimento dos magistrados do STF passa dos atuais R$ 24.500,00 para R$ 25.269,73 mensais. A alta corresponde a 3,14% de reajuste e foi calculada com base na inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) entre janeiro e dezembro de 2006.
Deputados de todos os matizes repetiram juras ao longo da tarde, segundo as quais uma coisa (o aumento aos ministros) nada tem a ver com a outra (o julgamento da fidelidade partidária). “Foi só coincidência”, garantiu o petista Sérgio Barradas Carneiro (BA), integrante da comissão. “Foi só coincidência mesmo”, confirmou Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), que é uma espécie de líder da oposição na CCJ.
A proposta entrou na pauta da comissão há duas semanas. Não fora votada ainda porque os deputados Flávio Dino (PCdoB-MA) e Carlos Willian (PTC-MG) pediram vista. Só a entregaram de volta ontem. E ela entrou imediatamente na pauta. A aprovação se deu por votação simbólica. Isto é, houve concordância de todos os presentes. O deputado José Genoino (PT-SP) chegou a chamar a atenção dos colegas sobre o fato de que se estava elevando o teto salarial do funcionalismo público. Mas não chegou a ser um entrave à aprovação.
O projeto havia sido mandado pela presidente do Supremo, Ellen Gracie. A versão dela era pouco mais ambiciosa do que a aprovada. Pedia reajuste de 5% e estabelecia vencimentos de R$ 25.725,00. Os deputados reduziram-nos evocando a necessidade de economia de recursos públicos. A despeito da preocupação, o aumento se dará com retroatividade a 1º de janeiro passado e se desdobrará em efeito cascata por todos os níveis da Federação — porque os salários dos magistrados das cortes inferiores são atrelados aos dos ministros do STF.
Efeitos
Logo depois de concederem reajuste salarial aos ministros, os deputados da CCJ aprovaram outro projeto de lei estendendo o benefício ao procurador-geral da República — conseqüentemente, a todos os integrantes do Ministério Público da União. O salário dos subprocuradores-gerais da República sobe dos atuais R$ 23.275,00 para R$ 24.006,25. O dos procuradores-regionais e dos procuradores de Justiça passa de R$ 22.111,25 para R$ 22.805,93. Já o dos procuradores e promotores de Justiça sobe de R$ 21.005,69 para R$ 21.665,63 e o do promotor de Justiça adjunto do Ministério Público,de R$ 19.955,40 para R$ 20.582,35.
Do outro lado da rua, na sede do STF, os ministros descartaram a hipótese de que a aprovação do aumento em seus salários tenha sido uma forma de os deputados agradá-los, na véspera da decisão crucial sobre os mandatos. “Nossa decisão vai satisfazer a alguns e desagradar a outros tantos. Não acho que há uma relação de causa efeito entre as duas votações”, disse o ministro Ricardo Lewandowski. O ministro Marco Aurélio Mello valeu-se do mesmo argumento. “É preciso perceber a diferença entre os dois conceitos. Eu até que gostaria de ter um aumento de salário, mas o que tivemos foi apenas um reajuste”, comentou. “O meu salário não compra mais o que comprava anos atrás, por isso a necessidade do reajuste”, emendou.
Expectativa no Judiciário Izabelle Torres Da equipe do Correio O julgamento de hoje que decidirá se os parlamentares que trocaram de partido devem perder seus mandatos esvaziou os plenários das turmas do Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde de ontem. Somente três ministros compareceram à sessão das turmas. Ao justificar a ausência, afirmaram que estavam estudando para elaborar seus pareceres sobre os três mandados de segurança impetrados pelos partidos de oposição. Em uma campanha discreta pela declaração de vacância dos cargos dos parlamentares que trocaram de partido, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Cesar Asfor Rocha — relator da consulta do DEM, que resultou no entendimento do tribunal a favor da fidelidade partidária — visitou o Supremo. Rocha está otimista em relação ao resultado do julgamento de hoje, porque tem notado que há disposição em acabar com o troca-troca de partidos. “Creio que o Supremo deverá seguir o TSE. Quando apresentei o relatório, achei que ficaria sozinho. Surpreendeu-me os outros cinco votos que a fidelidade partidária recebeu. Aqui (no STF) não será diferente”, prevê. Votação A votação dos mandados de segurança impetrados pelo PPS, DEM e pelo PSDB está prevista para ser o primeiro item da pauta de hoje, às 14h. Os três relatórios entrarão na pauta ao mesmo tempo. A primeira etapa do julgamento será a leitura dos pareceres dos relatores. Após o pronunciamento dos relatores, os advogados dos partidos terão 15 minutos cada um para apresentar seus argumentos. A etapa seguinte do julgamento será a de apresentação da defesa dos parlamentares que trocaram de legenda. Os 23 deputados citados nos mandados de segurança terão 90 minutos para apresentar seus argumentos. Na tarde de ontem, a defesa dos parlamentares tentava um acordo para nomear um único advogado para todos os deputados citados nos mandados. A sustentação oral do PPS será feita pelo presidente do partido, Roberto Freire, o PSDB será representado pelo advogado Eduardo Alckmin e o DEM pelo ex-ministro do Supremo Paulo Brossard. Em seguida, os ministros iniciam a leitura dos votos. Se o Supremo decidir que os mandatos pertencem aos partidos, não serão somente os 23 deputados citados nos mandados que irão deixar seus cargos. A decisão do STF poderá abrir caminho para que outros partidos tentem reaver as vagas. A Câmara dos Deputados registrou, desde outubro do ano passado, que 46 parlamentares trocaram de legenda 55 vezes. Ontem, o PTC entrou com um mandado para tentar reaver a vaga ocupada por Clodovil Hernandes, que deixou a legenda para ingressar no PR. |
Dia de preocupação no Planalto Daniel Pereira Da equipe do Correio
O Palácio do Planalto está preocupado com o desfecho do processo sobre fidelidade partidária hoje no Supremo Tribunal Federal (STF). Teme que a decisão resulte na redução das bancadas governistas na Câmara e no Senado, o que dificultará a aprovação, nas duas casas, da proposta de emenda constitucional (PEC) que prorroga a cobrança da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) até 2011. O governo trabalha com a possibilidade de o STF decidir que o mandato pertence ao partido, e não ao candidato eleito, conforme entendimento firmado neste ano pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Pelo bem do caixa da União, o Planalto torce para que o Supremo considere a regra válida só daqui para frente. Se for afastada a retroatividade da norma, parlamentares que mudaram de partido manterão seus mandados, e legendas oposicionistas não recuperarão cadeiras perdidas para o governo. Desde a eleição de 2006, 23 deputados migraram de PSDB, DEM e PPS para o exército do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Câmara. Em primeiro turno, a Casa aprovou a prorrogação da CPMF com 338 votos favoráveis, 30 a mais do que o mínimo necessário, o que demonstra o potencial de dor de cabeça para o governo caso a oposição recupere os mandatos. “Sou favorável (ao entendimento do TSE) desde que seja daqui para a frente. Não aceito que meus colegas sejam pegos pelas costas”, defende José Múcio Monteiro (PTB-PE), líder do governo na Câmara. Segundo Múcio, os parlamentares mudaram de legenda porque a Constituição e a lei não deixavam claro que a troca era passível de punição. A perda do mandato, portanto, seria indevida. O ministro de Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia, segue a mesma linha e ecoa o discurso entoado pelo presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP): “Nem a ditadura cassou tantos deputados (caso a decisão do Supremo seja favorável às legendas)”. Além da redução da base, integrantes do governo temem que a oposição tente anular a votação em primeiro turno da proposta da CPMF se o STF punir deputados que mudaram de partido. Vício PSDB, DEM e PPS podem alegar, por exemplo, que a decisão pela prorrogação do imposto do cheque foi viciada, porque contou com a participação de parlamentares sem direito a mandato. No Senado, a preocupação é com o futuro. De acordo com o líder do governo na Casa, Romero Jucá (PMDB-RR), só 45 dos 81 senadores votariam hoje a favor da prorrogação da CPMF, quatro a menos do que o mínimo necessário. Para tirar a diferença, o governo assedia senadores oposicionistas. Convida-os a mudar de trincheira. César Borges (BA) já trocou o DEM pelo PR. Romeu Tuma (DEM-SP) e Adelmir Santana (DEM-DF), entre outros, estão perto de trilhar o mesmo caminho. Não o farão se o STF decidir que o mandato pertence ao partido. “O mandato deve ser do partido. Agora, seria uma violência uma decisão como essa retroagir”, declara o deputado Henrique Fontana (RS), vice-líder do governo na Câmara. Ontem, o julgamento foi abordado na reunião do chamado conselho político, realizada no Palácio do Planalto. Parlamentares não esconderam a aflição com a possibilidade de colegas perderem o mandato. De acordo com o porta-voz da Presidência, Marcelo Baumbach, o presidente se limitou a responder que não pode interferir na decisão do Supremo. |
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