Em depoimento à Polícia Federal, uma testemunha que atuou por 15 anos como informante do grupo do ex-subchefe operacional da Polícia Civil Carlos Oliveira – um dos 30 policiais presos na Operação Guilhotina – afirma que o ex-chefe da instituição, delegado Allan Turnowski, sabia de todas as ações criminosas do grupo. X., de 41 anos, aponta Turnowski como beneficiário de um esquema sustentado por policiais ligados a milícias, contraventores e contrabandistas. No relato, ele diz ainda que o ex-chefe recebia R$100 mil para não reprimir a venda de produtos falsos no camelódromo da Uruguaiana, no Centro.
No fim de janeiro, os 1.508 boxes do camelódromo passaram por uma devassa da Polícia Civil e da Receita Federal. A operação fora determinada pela 6ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça (TJ) para cumprir mandados de busca e apreensão de produtos falsificados, respondendo a solicitação do Grupo de Proteção à Marca, com sede em São Paulo. Investigações da PF apontam o envolvimento de policiais numa disputa pelo controle do mercado, acirrada com o assassinato de um dos líderes dos camelôs, Alexandre Farias Pereira, em maio de 2007. Ele teria sido morto por se recusar a pagar propina a policiais.
Sargento da PM pagaria propina
O relato de X. detalha também o suposto pagamento de R$500 mil mensais a Turnowski. A propina seria paga por um sargento PM que atuava como adido – policial militar lotado em delegacias especializadas – da Divisão Antissequestro (DAS) e domina uma milícia em Jacarepaguá, além de explorar caça-níqueis em Rio das Pedras. Segundo o informante, o PM, que mora num condomínio de luxo na Barra da Tijuca, costuma participar de reuniões com policiais, entre eles Turnowski, numa badalada churrascaria do bairro e circula em veículos blindados, com escolta.
O informante não esconde o medo, devido à fama de violentos dos integrantes da quadrilha, que estariam envolvidos numa série de assassinatos. X. cita a execução do sargento do Exército Volber Roberto da Silva Filho, em junho passado. Segundo ele, o militar fora o responsável pela elaboração das bombas usadas no atentado ao contraventor Rogério Andrade, em abril de 2010, na Barra. Na ocasião, o filho do bicheiro morreu. Volber também teria feito a bomba que explodiu na picape Hilux do PM Rony Lessa, que perdeu a perna no episódio. X diz que o crime teria sido queima de arquivo, pois Volber negociava armas com policiais da Decod e da Drae.
As investigações indicam ainda o suposto pagamento de R$2 milhões feito por Andrade aos policiais envolvidos na execução. A quantia seria uma recompensa pela “cabeça” do responsável pela elaboração da bomba que matou seu filho. Volber foi morto em um motel em Jacarepaguá, supostamente após reagir ao cerco montado por policiais da Decod, entre eles o PM Ivan Jorge Evangelista de Araújo, que atuava como adido e foi preso na Operação Guilhotina, acusado de vender armas a traficantes.
A vingança pela morte do filho do contraventor também teria motivado o assassinato do sargento bombeiro Antônio Carlos Macedo, em novembro passado. Ex-chefe da segurança de Andrade, ele foi executado na avenida Sernambetiba, supostamente por por três PMs, pois estaria ligado a um complô montado por PMs para matar Rogério e dominar o território onde este explora caça-níqueis.
A testemunha contou ainda que participou de uma operação nos morros de São Carlos e da Mineira, em 2008, na qual policiais de delegacias especializadas desviaram parte do material apreendido. Dos oito fuzis encontrados nas favelas, quatro foram vendidos para o chefe da segurança da Igreja Universal, que seriam um PM. X. afirmou que foram apreendidos 42 mil projéteis, mas apenas três mil foram apresentados. Drogas também teriam sido roubadas pelos policiais.
O informante passou a colaborar com a PF após ter um irmão assassinado pela quadrilha. X. e sua família estão sob proteção do Ministério da Justiça. Ele era ligado ao sargento da reserva da PM Ricardo Afonso Fernandes, o Afonsinho, apontado pela PF como segundo homem no grupo do delegado Carlos Oliveira.
Em depoimento, X. diz que o grupo de policiais também sequestrava traficantes e parentes, libertados após o pagamento de resgate. Foi o caso de Carlos Eduardo Sales, o Capilé, considerado um dos principais fornecedores de drogas da favela do Acari. Segundo X., o traficante foi preso por policiais e adidos – entre eles o sargento Afonsinho – da Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos (Drae) e Delegacia de Combate às Drogas (Decod), que ficaram rodando por quase 12 horas com o bandido, liberado após pagar R$1 milhão. Metade do valor teria ficado com Afonsinho. A testemunha diz ainda que, na ocasião, Afonsinho teria se desentendido com o PM que atuava como adido na Decod por causa da divisão do dinheiro.
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