Fonte: Correio Braziliense
Duas funcionárias do deputado Antônio Andrade (PMDB-MG) são suspeitas de receber salários sem trabalhar. Elas estão lotadas no mesmo gabinete de um dos casos denunciados na semana passada
Mais duas funcionárias da Câmara são suspeitas de receber salário sem aparecer no trabalho. E elas estão lotadas no mesmo local de um dos casos revelados na semana passada. Depois de mostrar que Elias José Ferreira é investigado pelo Ministério Público Federal por acumular cargos ilegalmente e receber vencimentos durante 22 anos sem trabalhar, o Correio teve acesso à denúncia de que outras duas pessoas também seriam funcionárias fantasmas do mesmo gabinete, do deputado Antônio Andrade (PMDB-MG).
As secretárias parlamentares Amália Marisa de Assis Ferreira, mulher de Elias; e Naiara Rosa Peres, filha da ex-prefeita de Coromandel (MG) Dione Maria Peres, recebem, juntas, R$ 7.814 por mês para assessorar o deputado, mas nem sequer são conhecidas pelos demais funcionários de Andrade. Os casos ainda não são investigados pela Câmara, que tem abertos 178 processos administrativos disciplinares contra servidores que cometeram algum tipo de irregularidade.
De acordo com dados oficiais disponíveis no site da Câmara dos Deputados, Amália é contratada pelo gabinete de Antônio Andrade desde julho de 2009, com um salário de R$ 4.808,62. Já Naiara presta serviço desde março de 2011. Recebe R$ 3.005,38 por mês. No entanto, nem funcionários do gabinete de Andrade em Brasília nem os do escritório que ele mantém com verba da Câmara em Belo Horizonte sabem da existência das duas. Moradores da cidade de Coromandel afirmam que Amália é constantemente vista trabalhando em uma loja de produtos agrícolas do irmão e que ela vive com o marido, Elias José Ferreira. Até meados de 2012, a filha da ex-prefeita da cidade havia sido estagiária em Belo Horizonte de duas empresas de consultoria sobre mercado financeiro, que confirmaram a informação ao Correio.
A regra administrativa da Câmara determina que secretários parlamentares devem cumprir 40 horas presenciais de trabalho no gabinete na capital federal ou no estado que o deputado representa. No entanto, funcionários dessa categoria não precisam registrar ponto eletrônico e quem tem controle sobre a frequência deles é o próprio parlamentar. Os salários variam entre R$ 601,08 e R$ 8.040; e o número de contratados por gabinete está limitado a 25, com o custo total de R$ 78 mil. O pagamento é repassado diretamente pela Câmara, após receber do deputado a lista de contratados assíduos. Procurado pela reportagem, Antônio Andrade e seus assessores não retornaram as ligações.
Ampla defesa
A diretoria-geral da Câmara afirma que todas as denúncias contra funcionários são apuradas de acordo com o Regimento Interno e a Lei nº 8.112/90, que aborda o regime jurídico do funcionalismo público. As normas determinam que haja ampla defesa ao acusado e que a sindicância interna torne-se processo administrativo se houver indício de descumprimento das regras disciplinares. Comprovada a falha, o caso segue para a esfera cível ou criminal, no Ministério Público Federal. Entre os 178 processos abertos ou que estavam em andamento nos anos de 2011 e 2012, pelo menos 28 chegaram ao MPF com indicação de advertência, destituição de cargo em comissão ou demissão, no caso dos efetivos.
Desse total, 42 processos tratam de irregularidades na emissão de passagens aéreas, seis referem-se a suspeita de acúmulo de cargos públicos e dois são acusados de improbidade administrativa, como receber salário sem efetivamente trabalhar. Outros 73 processos foram abertos para apurar o envolvimento de funcionários da Casa com a máfia das ambulâncias, em escândalo conhecido como o dos sanguessugas, de 2006, em que uma quadrilha era suspeita de desviar verbas públicas destinadas à compra de veículos de transporte de doentes. Os casos estão sob a tutela da Comissão Permanente de Disciplina, criada no ano passado para apurar “responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições”.
As situações investigadas pela comissão incluem o uso irregular de auxílio-transporte, a comercialização de passagens aéreas pagas pela Casa e a acumulação remunerada de cargos públicos. Em muitos casos, a solução é dada administrativamente — ou seja, o servidor pode ser suspenso, exonerado e até obrigado a devolver o valor desviado —, sem o envio do processo às esferas cível ou penal. De acordo com a diretoria-geral, a maioria dos casos investigados diz respeito a secretários parlamentares, indicados livremente pelos deputados.
178
Quantidade de processos abertos pela Câmara desde 2011
para apurar irregularidades praticadas por servidores da Casa
Casos recentes
» Votos
O Correio revelou na quinta-feira da semana passada o caso de um ex-funcionário da Câmara dos Deputados que recebeu salário por 22 anos sem efetivamente trabalhar e ainda acumular o cargo com outro em uma cidade distante 400km da capital. A Justiça Federal está avaliando a irregularidade. O Ministério Público Federal no Distrito Federal (MPF-DF) pede que Elias José Ferreira devolva todos os salários recebidos irregularmente e que os bens dele tornem-se indisponíveis.
O ex-funcionário trabalhou na Câmara de setembro de 1980 a março de 2010, passando por cargos como auxiliar de gabinete e técnico legislativo. Em julho de 1988, ele também assumiu o posto de defensor público em Coromandel (MG). A investigação começou a partir de um procedimento disciplinar aberto pela própria Câmara contra Ferreira, concluído no ano passado.
Nos depoimentos, ele acabou admitindo que, quando esteve lotado no gabinete do deputado Antônio Andrade (PMDB-MG), sua função era conseguir votos para o parlamentar na cidade do interior de Minas. O parlamentar alegou que Elias estava cedido a seu gabinete e sempre compareceu normalmente ao
trabalho em Brasília.
» Investigação
Na edição de sábado passado, o Correio revelou que o MPF-DF instaurou inquérito civil público para investigar denúncia de que a senadoraVanessa Grazziotin (PCdoB-AM) empregou funcionários fantasmas em seu gabinete na época em que exercia o mandato de deputada federal, entre 2007 e 2010. A apuração está na fase de coleta de provas para embasar uma futura ação civil pública contra a parlamentar e os servidores. A congressista pode ser enquadrada por improbidade administrativa.
Ao término do inquérito, o órgão deve pedir à Justiça Federal que determine a devolução imediata dos salários pagos aos fantasmas de maneira irregular. A senadora não se pronunciou sobre as supostas irregularidades até agora.
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