Fonte: Correio Braziliense
Para mostrar a insatisfação com a proposta de consulta popular, enviada ontem pelo Palácio do Planalto, oposição e parte da base aliada, liderada pelo PMDB, preparam um contra-ataque ao governo. Uma pauta de projetos de consenso sobre o sistema político pode ser colocada em votação nos próximos meses. A ideia é esvaziar o plebiscito, já que o TSE pediu 70 dias para realizar todo o processo, e a avaliação é que dificilmente as mudanças serão aprovadas antes de 5 de outubro, data-limite para que possam valer no pleito de 2014. Ontem, peemedebistas mandaram dois recados a Dilma: vão pedir a redução do número de ministérios e podem levar a plenário vários vetos
Presidência da Câmara cria um grupo paralelo para elaborar o texto da reforma política e, com isso, parlamentares pretendem deixar de lado a consulta popular defendida pelo PlanaltoNotíciaGráfico
Na tentativa de tirar o mérito por uma eventual reforma política das mãos da presidente Dilma Rousseff, deputados e senadores querem esvaziar o plebiscito proposto pela petista e fazer mudanças paralelamente à iniciativa do Planalto. A mensagem da presidente com sugestões de temas para um plebiscito sobre o assunto foi entregue ontem ao Congresso pelo vice-presidente Michel Temer e pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Ao mesmo tempo, líderes partidários já articulavam a formação de um grupo para selecionar projetos sobre o sistema político que tenham consenso para votação.
A articulação paralela ganhou força depois que o TSE informou que só conseguirá viabilizar o plebiscito até setembro (leia matéria na página 3), o que praticamente impede que as mudanças entrem em vigor para as eleições de 2014, como quer o Planalto. De acordo com a Constituição, só valem para um determinado pleito regras aprovadas com pelo menos um ano de antecedência. O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), admitiu que a ideia do plebiscito com efeitos válidos já para 2014, como quer o Planalto, não tem viabilidade nem encontra consenso na Casa.
Para “não correr o risco de se perder a oportunidade de votar a reforma política”, Alves anunciou que criará um grupo de trabalho na próxima semana para elaborar um texto com os principais itens da reforma. O projeto primeiro tramitaria no Congresso para depois passar por consulta popular por meio de um referendo. “Vamos tentar como primeira opção, o plebiscito, mas ele só se viabilizaria se houvesse consenso, então estou criando uma alternativa. Pelo prazo de 70 dias (dado pelo TSE) fica muito apertado, por ser uma pauta extensa, tecnicamente complicada”, comentou.
A um ano das eleições, a saída de Henrique encontra respaldo em diversos partidos, inclusive da base, que não querem perder os louros de uma possível reforma política. A bancada do PMDB apressou-se em divulgar uma nota destacando ser a favor da consulta popular, desde que seja realizada “concomitantemente com as eleições de 2014”, e adiantando que sugerirá temas como o parlamentarismo, a reeleição e o tempo de mandato, que não estavam presentes na mensagem de Dilma.
A presidente destacou cinco pontos em sua mensagem (veja quadro). Deixou de fora temas polêmicos, como o fim da reeleição. “Não há nenhum problema que o Congresso coloque esse ou aquele assunto. Nós tínhamos que escolher cinco. Ou quatro, ou três, nos pareceu que eram esses. O Congresso é soberano para colocar o que ele acha”, respondeu Cardozo sobre a ausência do tema, reforçando que a palavra final sobre os assuntos que entram no plebiscito é do Congresso.
A oposição, que já defendia o referendo no lugar do plebiscito, criticou a mensagem da presidente. “Acabar com o voto secreto, por exemplo, já é um assunto que está em plena tramitação no Congresso, foi de um oportunismo inusitado a presidente incluir na mensagem”, comentou o líder do PPS, Rubens Bueno (PR). “Esse plebiscito é um engodo, uma farsa, um gasto a mais no bolso do brasileiro que não vai surtir nenhum efeito prático”, reclamou o líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO). Dizendo-se ciente de que o acordo para viabilizar a proposta presidencial não será facilmente alcançado, o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), resumiu a situação: “A reforma política nunca desceu do telhado”. A bancada do PT na Câmara, por sua vez, saiu em defesa de uma proposta de “plebiscito já” para a reforma política, mas evitou falar sobre a validade da proposta.
No Planalto, embora o plebiscito já esteja sendo visto como item quase vencido, o discurso ainda é de levá-lo em frente, “Acho que nós devemos fazer antes, bem antes (das eleições de 2014). Queremos que a grande mobilização seja em torno de temas, não de candidatos, por isso deve ser feito antes”, disse Temer.
Avaliação
O professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer avalia que faltou incluir outros temas na mensagem da presidente, como a questão do voto facultativo por parte do eleitor, o fim da reeleição de políticos e a possibilidade de convocação de um novo pleito caso o cidadão não aprove a gestão ou mandado do eleito. “Mas a Dilma só mandou uma sugestão. O Congresso, agora, tomará duas decisões: se convoca o plebiscito e o que colocará no texto. Serão respostas sim ou não ou de múltipla escolha?”, afirma.
O cientista político Ricardo Caldas acredita que houve uma mistura de reforma política com eleitoral na mensagem do Planalto ao Congresso e que o texto atende apenas em parte os desejos da sociedade. “Como sugestão, é uma boa iniciativa, mas que deve ser melhorada. Há questões muito óbvias, como a do voto secreto. E outra: a pergunta sobre se um suplente de senador (que não recebe nenhum voto) assumir ou não em caso de vacância da cadeira é relevante para o referendo?”, questiona.
Colaboraram Leandro Kleber, Juliana Braga e Julia Chaib
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