Fonte: Laboratório da Inclusão
Observando a mobilidade humana dentro dos espaços funcionais da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), em um tempo de mais de duas décadas, acompanho a saída de um grande número de funcionários para a aposentadoria, que não deixaram substitutos em termos de preparação técnica, e a entrada de um grande número de colaboradores terceirizados, a maioria sem processo seletivo. O engavetamento de projetos importantes, que não tiveram continuidade, o aumento assustador do número de adolescentes abandonados, vitimizados e em conflito com a Lei, das vulnerabilidades e exclusões sociais.
A dedicação e competência de alguns gestores, funcionários e colaboradores, outros despreparados e sem afinidade numa realidade de opostos. Essa mistura imensa de intenções e interpretações, de erros e acertos, de conflitos e fortes parcerias fazem o serviço público. Multiplicam-se e se repetem nos conflitos internos os assédios morais e os abusos de poder, que são semelhantes.
Então, vêm as reflexões: Estamos evoluindo? Regredindo? Ou em um momento de grandes transformações sociais no Brasil e no mundo? Existem os pessimistas que dizem “não tem mais jeito”, os acomodados “pode ser que melhore”, os idealistas “vamos ter que lutar para melhorar”. Assim assistimos e participamos da queda e ascensão do serviço público. E, como um fio de esperança, vem a possibilidade de um futuro melhor.
Quando estudamos e pesquisamos os motivos e consequências da prática do assédio moral, concluímos as semelhanças com o abuso de poder. Desigualdades sociais, competições funcionais, preconceitos, egoísmos, isolamentos dos cargos, simbologias, pensar ser melhor e mais importante do que os outros, ser incapaz de tratar bem as pessoas, escolher ser um multiplicador de conflitos em uma sociedade extremamente excludente, violenta e injusta. O assédio moral, assim como outras sequelas de uma sociedade em conflitos, revela o lado oposto da generosidade humana, da solidariedade, da verdadeira inclusão social.
A manutenção de gestores ou funcionários que praticam o assédio moral retarda uma possível reestruturação e recuperação na qualidade do serviço público no Brasil ou mantém a incoerência de ganhar no grito, organizar humilhando, adoecendo as pessoas e ainda ser considerado competente porque desperta medo nos outros. No ponto de vista de desenvolvimento social, o assédio moral é inútil, desnecessário e visivelmente incompetente.
Vejo na STDS, como observador e membro do público interno, toda essa mobilidade humana, alternâncias de poder, um quadro semelhante ao resto do Brasil. Ou seja, em cada repartição pública brasileira, os relacionamentos humanos são reflexo de uma só “cultura” que vem se multiplicando e se espalhando ao longo do tempo, sem muitos opositores atuantes. São poucas as reações, as novas ideias, as resistências, mas significantes. Esperamos um milagre ou essas manifestações recentes de brasileiros nas ruas podem significar uma possibilidade de esperança de melhores dias no futuro?
Acho melhor interpretar como uma possibilidade de esperança ou estarei admitindo que estou trabalhando também em vão? A evolução do serviço público passa pelo respeito à diversidade humana, à ética, à liberdade de expressão, de poder discordar do que se percebe de errado, de saber diferenciar gestores arrogantes e autossuficientes de líderes e do direito de não ser subserviente a este modelo de sociedade falido.
Podemos acreditar em um Brasil melhor, de melhores pessoas. Podemos acreditar em um serviço público de qualidade, sem assédio moral, sem abuso de poder. Dessa forma, poderemos promover políticas públicas consistentes que venham a diminuir o número de adolescentes em conflito com a Lei, mulheres vítimas de violência, idosos em situação de abandono, crianças e adolescentes abandonados e vitimizados, pessoas deficientes excluídas etc.
Podemos imaginar ou relembrar que, em algum lugar do Brasil, em uma repartição pública qualquer, um gestor foi exonerado por denúncias de prática de assédio moral e abuso de poder. Entre a imaginação e a realidade, surge a esperança que tanto sonhamos. Podemos conquistar a qualidade do serviço público com atitudes conscientes de generosidade, perdendo o medo de dizer com orgulho: “Eu sou um funcionário público”.
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