Fonte: Veja
A tensão entre manifestantes e a Polícia Militar do Rio cresceu desde a última segunda-feira, com as acusações, pelo lado dos integrantes do protesto, de que agentes infiltrados teriam começado os ataques ao fim da cerimônia com presença do papa Francisco. Imagens que se multiplicam nas redes sociais foram parar até no jornal americano The New York Times, que publicou em um blog vídeos de diferentes ângulos dos ataques e o do momento da prisão de um integrante da ‘Mídia Ninja’ – grupo que filma e transmite em tempo real as manifestações, identificado com as causas dos protestos.
O uso de policiais à paisana é legal e é o recurso que a PM utiliza, por exemplo, para identificar e prender traficantes em áreas onde um homem fardado seria rapidamente assassinado. A Polícia Militar divulgou uma nota admitindo o uso de policiais à paisana infiltrados na manifestação, e disse à reportagem do site de VEJA que a missão desses policiais – ou P2, como é chamado o serviço reservado da PM – é identificar pessoas que iniciam atos de vandalismo, lançam bombas e tumultuam os protestos.
Na tarde desta quarta-feira, o jornal O Globo obteve, de um perito criminal, a informação de que não há indícios de que o homem filmado lançando um coquetel molotov contra os policiais seja o mesmo que, minutos depois, foi filmado junto à fileira de PMs. Ele e outros três homens foram expulsos da manifestação de segunda-feira acusados de serem “da P2”. Ao sentirem-se ameaçados, os homens, todos fortes e com uma pulseira preta que os diferenciava do resto do grupo, correram para se abrigar atrás da linha de PMs que dava segurança ao palácio.
A PM admite o uso de infiltrados, e não nega que em alguns momentos eles atuem mascarados, como os manifestantes. A máscara passa a ser, assim, o centro de uma discussão paralela. Os manifestantes não aceitam em hipótese alguma que um policial atue sem identificação ou mascarado; mas mesmo os manifestantes pacíficos não conseguem evitar que grupos de rosto coberto promovam a quebradeira, como se viu no Leblon, na semana passada, e nos atos da Assembleia Legislativa, da Avenida Presidente Vargas e em outros protestos.
Diz uma nota divulgada pela corporação: “Em nenhum momento a PM negou que a Inteligência tivesse agentes acompanhando a manifestação, com o objetivo de obter informações e prever movimentos. Estas informações são importantes para as decisões de comando”.
A animosidade crescente cria, para os protestos e a polícia, uma repetição do que se deu nas favelas cariocas: práticas violentas ao longo de décadas transformaram o policial fardado em “inimigo”, mesmo para jovens e crianças que não têm qualquer ligação com o crime. Agora, no momento em que os policiais atuam contra a massa na qual estão inseridos jovens da classe média, estudantes e uma infinidade de tipos e categorias de cariocas, o recrudescimento tende a desgastar a imagem da corporação e fazê-la regredir, depois de um período em que houve avanços, com a reconquista de áreas tomadas pelo tráfico de drogas. O momento de maior otimismo em relação à polícia foi, certamente, a ação no Complexo do Alemão, quando, apoiados por militares do Exército e policiais civis, os policiais militares ocuparam o conjunto de favelas dominado há 30 anos por bandidos.
Amarildo – No momento, a polícia e o governo do estado têm ainda outro problema nas mãos. Desaparecido desde o dia 14, o pedreiro Amarildo Souza Lima foi transformado em uma espécie de mártir das manifestações. O grito “cadê Amarildo” foi o mais ouvido na última segunda-feira, nos protestos em frente ao Palácio Guanabara. Amarildo desapareceu depois de ser abortado por policiais da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha.
Nesta quarta-feira, o governador Sérgio Cabral recebeu a família do pedreiro, em mais uma tentativa de restabelecer com os manifestantes e a população um diálogo perdido. Cabral tem sido o alvo principal das manifestações, e tentou, sem sucesso, aplacar o ânimo dos manifestantes recebendo um grupo que se dizia dissidente dos acampados no Leblon, na rua onde mora. A estratégia não deu certo e os jovens recebidos por ele foram classificados como “sem relação” com o movimento.
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