Justiça organizacional refere-se à justiça percebida nas trocas que ocorrem dentro da organização, sejam elas econômicas ou sociais, e que envolvem o indivíduo em suas relações com seus superiores, subordinados, pares e a organização como um todo (Beugré 1998). De acordo com Beugré, a justiça organizacional é importante para uma organização por se tratar de um fenômeno psicossocial e ter penetração na vida social e organizacional do ativo mais importante de uma organização, que é a sua força de trabalho, ou seja, o seu material humano.
A justiça organizacional aplicada em uma organização que afeta as atitudes e comportamentos subseqüentes, como o comprometimento, confiança, desempenho e sentimento de pertencimento àquela determinada organização. E este senso de justiça leva os servidores em direção a uma força de trabalho mais qualificada, mais exigente, e pressupõe que os indivíduos possam reivindicar tratamento digno e respeitoso dentro de suas organizações.
A atual gestão da Polícia Federal tem se mostrado sensível às questões de qualidade de vida e bem-estar no trabalho dos Policiais Federais e Administrativos, o que é louvável, pois só o fato de abrir canais que possam discutir tais temas já é um primeiro passo para buscar soluções. Porém, o que se tem percebido é que as ações até agora desenvolvidas carecem de um projeto mais direcionado a atacar as questões estruturantes do mal-estar na Polícia Federal. Nesse sentido, algumas ações de promoção de bem-estar no trabalho, de iniciativa dos próprios gestores da PF, que independe da gestão do MJSP podem ser executadas de forma imediata, como por exemplo:
- a distribuição democrática de função de chefia;
- critérios objetivos e normatizados para a seleção de candidatos para as Adidâncias;
- remoções para todos os servidores com ajuda de custo, e tantas outras ações que, de per si, poderão ser adotadas.
Enquanto as políticas de gestão de pessoas da PF privilegiarem um cargo em detrimento de outros, os servidores dos demais cargos, que ficam em segundo plano, irão se sentir à margem da justiça organizacional. O resultado disso é a percepção de desprestígio e falta de pertencimento à Polícia Federal.
Imagine qual a percepção de um servidor da PF em processo de remoção que se vê obrigado a desistir de sua ajuda de custo para que o seu processo tenha prosseguimento?
E o pior, sabendo ele que aquele valor que lhe foi subtraído, servirá para atender a um servidor de outro cargo?
Com certeza não será um sentimento de respeito, de reconhecimento e tampouco de pertencimento a essa Organização!!!!! Exemplos como esse são comuns em todas as Unidades da Polícia Federal. É na esteira do sentimento de injustiça que o mal- estar se fortalece e faz despencar a Qualidade de Vida no Trabalho. E, enquanto o foco não forem as causas estruturantes do mal-estar, qualquer ação visando minimizar suas consequências será mero ofurô corporativo (Ferreira 2017).
Para implementar um programa de Qualidade de Vida no Trabalho eficiente e alcançar o bem-estar no trabalho é necessário atuar nas causas reais dos problemas. Oferecer aos servidores comemorações de aniversários, datas festivas, amigos ocultos, dança de salão, ioga, artes marciais e cafés da manhã podem contribuir para melhorar o clima organizacional. No entanto, essas medidas isoladas, sem o devido planejamento para alcançar a justiça organizacional será como oferecer ao servidor um banho em uma tina japonesa (ofurô), o qual depois do banho voltará ao mesmo ambiente laboral, que diariamente lhe causa mal-estar e o leva à ansiedade, ao estresse e ao burnout, e nos casos mais graves, ao suicídio.
Há mais de três décadas a Polícia Federal vem tratando o servidor como uma variável de ajuste, ou seja, o trabalhador que deve se ajustar à PF, sem considerar as necessidades do indivíduo e suas especificidades, o que pode explicar o alto índice de suicídio, totalizando até o momento 56 casos nos últimos 20 anos. Além disso, a PF atualmente possui alto índice de servidores afastados das atividades laborais em virtude do acometimento de doenças da mente.
Considerando que a atual gestão assumiu o compromisso de implementar uma política de gestão de pessoas mais humanizada é importante que os protagonistas organizacionais (gestores) renovem sua cultura organizacional, incluindo uma gestão mais participativa e democrática, incluindo uma cidadania organizacional em que todos os cinco cargos da carreira Policial e os cargos da carreira de Apoio sejam contemplados de forma equânime. Somente a partir desta mudança que os servidores terão uma percepção de justiça organizacional consolidada na PF, o que poderá gerar maior engajamento, satisfação e bem-estar.
O Bem-estar no trabalho e a Qualidade de Vida no Trabalho só existirão quando coletivamente se adquirir a consciência de que todos são importantes na Polícia Federal. E o cargo que hoje domina os postos de gestão da Polícia Federal deverá ser o primeiro a ter essa consciência, até mesmo porque é quem detém o poder de decisão para as mudanças.
Brasília, 20 de junho de 2023.
EGÍDIO ARAÚJO NETO
Presidente do SINDIPOL/DF
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