A greve promovida pelos policiais federais em 1994 serviu para muitas coisas. Além de ter consolidado a consciência de que a união torna os sonhos mais próximos, o movimento paredista também revelou a ala dos fura-greves, medrosos, puxa-sacos e bundões. Gente que ficou escorada à sombra dos valentes, aqueles que apostaram tudo no movimento, colocando em jogo, durante meses, o sagrado leite das crianças.
Em meio ao cotidiano da greve, esperando o já famoso cachorro-quente do Sindicato e observando os diários rojões atirados contra a janela do coronel de plantão na cadeira do nono andar, nos divertíamos coletando informações sobre os diversos tipos que passavam ao largo da greve, entrando às escondidas no prédio do edifício-sede do DPF em Brasília.
Outros furões, com a cara-de-pau mais afiada, aqui acolá arriscavam descer do prédio na hora do lanche, misturando-se aos demais para fazer perguntas e saber exatamente “como andava a nossa greve”. Outros, ainda, bastante criativos, inventavam desculpas mirabolantes para justificar a ausência. Foram muitos os tipos “fotografados” pelo grupo grevista. A cada dia aparecia uma dessas figuras, que era atentamente observada e catalogada conforme sua tipificação.
Vejamos alguns desses tipos.
Antes disso, é interessante dar a definição do termo pelego conforme os dicionários: “s. m. (bras.) Pele de carneiro, com a lã, usada como xairel ou coxinilho; (deprec.) designação comum dada aos membros mais ou menos disfarçados do Ministério do Trabalho dentro dos sindicatos de trabalhadores; (fig.) indivíduo subserviente; (bras. do sul) passo errado nas danças gaúchas”.
No caso da nossa greve, levaram a pecha de pelegos os indivíduos subservientes, medrosos, bundões, cascateiros, covardes e puxa-sacos. Poucos, é bem verdade. E, graças a Deus, bem desafinados!
Pelego Fantasma – É aquele que entra e sai do prédio pensando que ninguém está vendo.
Pelego Fominha – É aquele que só participa do movimento na hora do lanche. Depois some.
Pelego Pão-duro – É aquele que não adere ao movimento e ainda reclama que o Sindicato usa do seu dinheiro para pagar o lanche dos grevistas.
Pelego Mula – É aquele que não participa do movimento, para carregar a pasta do Delegado.
Pelego Hipocondríaco – É aquele que fica doente só de ouvir falar em greve e entra logo em Licença para Tratamento de Saúde (LTS)
Pelego Inteligente – É aquele que acha que sabe de tudo e que greve é coisa de Terceiro Mundo.
Pelego Cara de Pau – É aquele que não participa do movimento e desce de vez em quando para perguntar: – “E aí? Tem alguma novidade? Saiu alguma coisa para nós?”.
Pelego Corno – É aquele que pede para viajar a serviço e solicita que o chefe tome conta de sua mulher.
Pelego Cauteloso – É aquele que pega Atestado Médico um dia antes de começar a greve.
Pelego Covarde – É aquele que não luta por seus direitos, com medo de perder as mordomias.
Pelego Caroneiro – É aquele que não adere ao movimento e argumenta: – “Se vocês ganharem eu também ganho”.
Pelego Atencioso – É aquele que diz estar de greve e que vai ao serviço só para “tirar as dúvidas” do pessoal.
Pelego Azarado – É aquele que retorna às atividades para viajar e a vaga já havia sido dada a outro.
Pelego Oportunista – É aquele que aproveita a greve para conseguir uma chefia.
Pelego Contabilista – É aquele que não adere ao movimento para ficar calculando de quanto vai ser o aumento.
Pelego Herói – É aquele que não entra em greve porque carrega sozinho a seção nas costas.
Pelego Mentiroso – É aquele que inventa estórias fantásticas para enfraquecer o movimento.
Pelego Cínico – É aquele que ri e diz – “Porque eu vou me expor se você está lá lutando por mim?”
Pelego Professor – É aquele que diz que não pode ficar ausente da Academia porque está dando aulas.
Pelego Rancoroso – É aquele que não adere ao movimento porque na greve passada foi mal compreendido.
Pelego Osmótico – É aquele que trabalha normalmente e adere ao movimento pelos jornais e fica convencido de que é grevista.
Pelego Amparado – É aquele que não adere ao movimento dizendo que faz parte dos 30 por cento autorizado pela Lei.
Pelego Atrevido – É aquele que ataca o Sindicato para justificar a sua ausência no movimento.
Pelego Araponga – É aquele que passa por grevista só para manter a chefia informada.
Pelego Rato de Gaveta – É aquele que, na hora dos avisos, põe a cabeça na janela e depois se esconde.
Pelego Mijão – É aquele que desce um pouco, joga um lero, dá um tempo e diz que vai subir para ir ao banheiro.
Pelego Equilibrista – É aquele que prefere ficar em cima do muro.
Pelego Acanhado – É aquele que não adere ao movimento por medo de ser vaiado.
Pelego Jurista – É aquele que não adere porque consultou o chefe, que disse que a greve é ilegal.
Pelego Cívico – É aquele que não adere ao movimento com medo que a Polícia Federal se acabe.
Pelego de Tabela – É aquele que calcula direitinho o último dia da LTS com o início das férias.
Pelego Bombril – É aquele que não participa porque diz que tem mil e uma utilidades na seção.
Pelego Rico – É aquele que está muito satisfeito com seu salário.
Pelego Assumido – É aquele que não participa da greve porque é bundão.
Nota: Este texto foi escrito na década de 90 e é incrível como até hoje se encaixa perfeitamente aos Pelegos de agora. Em razão da tecnologia, há novos tipos de fura-olhos: Pelego Facebook, Pelego Internet, e outros que podem ser incluídos pelos amigos internautas.
Xavier Neto
Jornalista, bacharel em Direito e Agente Federal aposentado. É autor de dois livros sobre “causos” do folclore policial. Contatos: xaxa@xaxa.net
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