Jailton de Carvalho
O governo brasileiro protestou ontem contra a decisão das autoridades de imigração da Espanha de impedir a entrada de brasileiros no aeroporto internacional de Madri, e expulsá-los de volta ao Brasil. O Itamaraty convocou o embaixador espanhol em Brasília, Ricardo Peidró, e ameaçou dar aos espanhóis que vierem ao Brasil o mesmo tratamento recebido pelos brasileiros naquele país. Numa dura nota, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que recebeu a notícia da detenção dos brasileiros com “profundo desagrado”, e lembrou que não é a primeira vez que isso ocorre.
Um grupo de 30 brasileiros ficou horas detido numa sala no aeroporto de Barajas, e terá de voltar ao Brasil. No grupo há dois alunos de mestrado do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). Eles estavam em trânsito para Lisboa, onde participariam de um congresso científico. Ontem à noite, em Salvador, agentes da Polícia Federal impediram a entrada no Brasil de oito espanhóis, cinco homens e três mulheres. Os espanhóis chegaram às 21h15m, num vôo da Air Europa. Segundo a PF, eles não declararam onde ficariam hospedados ou quanto dinheiro tinham. Três dos barrados são agentes de viagem.
À tarde, a embaixada da Espanha afirmou que os brasileiros teriam, a partir de ontem, 48h para deixar Madri. Eles serão repatriados pela Ibéria, companhia pela qual chegaram à Espanha. A notícia da retenção dos brasileiros irritou diplomatas. De manhã, o secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, Samuel Pinheiro Guimarães, convocou Peidró para explicar a retenção dos brasileiros.
A conversa não satisfez Guimarães. Logo depois do encontro, o Itamaraty divulgou uma nota exigindo melhor tratamento aos brasileiros em viagem à Espanha, sob pena de o Brasil dar tratamento recíproco para os espanhóis. “O Ministério das Relações Exteriores está examinando a adoção de medidas apropriadas em resposta ao ocorrido, tendo em conta, inclusive, o princípio da reciprocidade”, adverte a nota. O texto informa que Celso Amorim recebeu “com profundo desagrado”, a notícia da “denegação da entrada de brasileiros na Espanha”.
A nota diz ainda que, no encontro com Peidró, Samuel Guimarães manifestou a “inconformidade do governo brasileiro com novo episódio”. Essa não é a primeira vez que o Itamaraty reclama contra o tratamento dispensado pelas autoridades espanholas a brasileiros. Há duas semanas, Amorim se queixou diretamente ao ministro de Assuntos Exteriores espanhol, Miguel Ángel Moratinos, do exagero das autoridades de imigração contra brasileiros. O número de brasileiros deportados cresceu nos últimos meses.
Em entrevista, Peidró tentou minimizar o peso das declarações das autoridades brasileiras. Segundo ele, não há maus-tratos nem discriminação contra brasileiros. O embaixador argumentou que os brasileiros foram barrados em Madri porque chegaram à Espanha em situação irregular. Peidró disse que a retenção de estrangeiros é comum. Ele afirma ainda que espanhóis também são barrados nos aeroportos brasileiros, e nem por isso o governo espanhol tem se queixado.
– Eu lamento esses acontecimentos, mas nenhum deles reunia as condições necessárias para entrar na União Européia – afirmou.
Entre as exigências para o viajante entrar na Espanha está a apresentação de passagens de ida e volta, cartão de crédito e 60 euros por dia de permanência em território espanhol. Também se exige a comprovação do local de hospedagem. Em caso de estudantes, professores visitantes ou palestrantes, cobra-se ainda a apresentação do convite que motivou a viagem. Peidró disse ainda que a ameaça de reciprocidade não afetará as relações do Brasil com a Espanha.
– A reciprocidade é uma possibilidade. Mas é uma situação que de modo algum se enquadra às relações dos dois países. Não acho que ela (a reciprocidade) está na mente de brasileiros e espanhóis – disse.
A entrevista do embaixador também não agradou ao Itamaraty. Diplomatas argumentam que os espanhóis estão aumentando o rigor para dificultar o acesso de brasileiros e outros latinos pobres à Espanha. Eles estariam usando os antigos critérios de acesso à União Européia, mas exigindo o cumprimento de cada item, o que não faziam antes. A Espanha estaria cedendo à pressão de outros países da UE para conter a imigração ilegal.
Pelas informações do Itamaraty, três mil brasileiros foram impedidos de entrar na Espanha ano passado. O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), criticou o tratamento das autoridades espanholas aos detidos. Chinaglia disse que a Espanha precisa rever a relação com os brasileiros.
– A Espanha tem que melhorar sua relação com os brasileiros e ter uma relação de respeito. Se houver necessidade, quem sabe a gente convide o embaixador para dar explicações aqui, na Câmara. Mas agora não é necessário – disse Chinaglia.
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