Reviravolta nas investigações da CPI dos Bingos. Novos dados dos sigilos telefônicos revelam que o economista Vladimir Poleto, ex-diretor do Departamento de Contadoria da Secretaria da Fazenda da Prefeitura de Ribeirão Preto, mantinha contato freqüente com o gabinete do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, seu ex-chefe. Foram trocados cerca de 1.200 telefonemas entre Poleto e o celular de número (61) 8111-7197, de Ademirson Ariovaldo da Silva, assessor de Palocci. Eles foram feitos durante 24 meses dos anos de 2003, 2004 e 2005, o que dá uma média de quase duas ligações por dia no período. Esse também é o celular por meio do qual Palocci atendia telefonemas. Há outras 190 ligações entre Poleto e o celular (61) 8118-0136, também de Ademirson da Silva.
Flagrado em grampos telefônicos feitos com autorização judicial tramando esquemas com Rogério Tadeu Buratti, outro ex-assessor de Palocci enrolado em falcatruas, Poleto vinha tentando se manter longe do foco da CPI. Mas foi jogado no caldeirão da crise política ao afirmar ter transportado dólares que teriam vindo de Cuba para a campanha petista em julho de 2002. Ele próprio confessou ter carregado as três caixas que conteriam mais de US$ 1 milhão, mas jura que achava que fossem bebidas. A reportagem procurou a assessoria do Ministério da Fazenda na sexta-feira para saber o que tanto Ademirson ou o ministro falavam com Poleto, mas a pasta não se manifestou.
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Amanhã, Poleto depõe na CPI dos Bingos. Ele já tinha sido convocado anteriormente para explicar seu envolvimento no polêmico caso da propina para a renovação do contrato da Caixa Econômica Federal com a multinacional Gtech, mas vinha escapulindo. Agora, terá muito o que explicar. Mas, por via das dúvidas, já pediu habeas corpus ao Supremo Tribunal Federal para não responder a perguntas que possam comprometê-lo.
Os dados do sigilo telefônico de Vladimir Poleto revelam ainda que ele manteve contatos com o gabinete do ministro da Fazenda no auge da crise política atual, entre junho e agosto deste ano. Nesse período, 161 ligações partiram de quatro números de celulares registrados em nome de Poleto (dois deles com prefixo do Rio, um de Brasília e outro de Ribeirão Preto) para o celular 8111-7197, do assessor de Palocci. Poleto recebeu no mesmo período 17 ligações do mesmo terminal. Já entre janeiro e maio e 2005, foram 68 telefonemas entre eles. Nesse levantamento a que a reportagem do Correio teve acesso, ainda não foram computados os telefonemas de Vladimir Poleto no período de maio a setembro de 2004, o que engrossará ainda mais o bolo de contatos com a cúpula da Fazenda.
Peixe graúdo
Até então o que se sabia é que o interlocutor com o gabinete de Palocci seria basicamente Rogério Buratti, apontado nas investigações do Ministério Público paulista e da CPI como um dos operadores mais atuantes de esquemas de corrupção e tráfico de influência em administrações petistas. Nas últimas semanas, o Correio já vinha revelando, em diversas reportagens, a participação de Poleto em várias negociatas, com base em dados do sigilo telefônico e das conversas de Buratti gravadas por autorização judicial, a pedido do Ministério Público de São Paulo, que investiga o esquema de fraude em licitações de prefeituras paulistas.
A suspeita de integrantes da CPI é de que Poleto é um peixe mais graúdo no suposto esquema de tráfico de influência e de corrupção no governo petista do que se supunha. Foi Vladimir Poleto quem, por exemplo, recebeu telefonema da secretária do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, cobrando-lhe uma contrapartida, que não foi detalhada na conversa telefônica entre Poleto e Buratti, interceptada no dia 19 de julho de 2004.
“Recebi uma ligação, que eu tinha que operacionalizar uma coisa, entendeu?”, disse Poleto a Buratti, que não entendeu e perguntou com quem. Respondeu Poleto: “É Dé-lu-bio (com a voz pastosa e acento na primeira sílaba, tentando dificultar a identificação do nome se a conversa fosse ouvida por terceiros). Com a insistência de Buratti, Poleto falou claramente que se tratava de Maria Silvia, secretária do Delúbio: “Mas eu não tô sabendo de nada. Ela falou que eu tinha alguma coisa… ela recebeu uma … sinalização.. que eu tinha um encontro com ela…”
Nos dias críticos de negociação do contrato da Gtech, por exemplo, no início de abril de 2003, Poleto falou várias vezes com Ademirson da Silva, além de Buratti e Ralf Barquete Santos, outro ex-assessor de Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto e envolvido nos rolos.
Recebi uma ligação (de delúbio), que eu tinha que operacionalizar uma coisa, entendeu? |
A República de Ribeirão
O economista Vladimir Poleto foi chefe da Contadoria da Secretaria da Fazenda de Ribeirão Preto quando Ralf Barquete Santos era o secretário. Barquete, que morreu em 2004, é outro envolvido no suposto esquema da propina da Gtech. Segundo versão de Buratti, foi Ralf que o consultou, em nome de Palocci, como trazer os dólares de Cuba. Até morrer em meados de 2004, Ralf Barquete, ex-assessor da presidência da Caixa Econômica Federal, integrava a chamada “República de Ribeirão Preto”, formada por ex-assessores de Palocci na prefeitura da cidade paulista que passaram a ocupar cargos no governo federal. Buratti e Poleto não foram nomeados para cargos no governo petista. Mas, de acordo com os indícios levantados pela CPI e pelo Ministério Público com base nos grampos telefônicos, eles ficaram encarregados de operar esquemas com parceiros de fora do governo federal. Poleto chegou a atuar como consultor do Banco Prosper, com sede no Rio, cuja diretoria chegou a agendar encontro com Palocci. Nas interceptações telefônicas do Ministério Público paulista feitas entre maio e setembro de 2004, Rogério Buratti conversa sobre negócios com Poleto e com o engenheiro Rodrigo Cavallieri, dono da MC Consulting e da MC Participações, especializada em viabilizar empréstimos para prefeituras junto a organismos internacionais, como o Banco Mundial. Os grampos indicam tráfico de influência de Buratti com autoridades de Brasília para ajudar os negócios da MC Consulting. A CPI suspeita de que Buratti seja um parceiro oculto da sociedade e já decidiu quebrar os sigilos fiscal, bancário e telefônico dos sócios e da MC. Buratti será convocado novamente para explicar sua ligação com a MC. Em outra conversa telefônica, Vladimir Poleto comenta com Buratti sobre a “estruturação financeira de uma instituição”, sem entrar em detalhes. Ele cita Rui Barquete Santos, irmão de Ralf Barquete, que teria um encontro com o “chefão” em Brasília. Segundo Buratti, “chefão” é a forma como eles se referiam a Palocci. Rodrigo Cavallieri também é citado. (AD) |
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