Na gravação, delegado explica a superiores atuação na Satiagraha. Para STF, conversa mostra que presidente do tribunal foi monitorado.
O Supremo Tribunal Federal (STF) e a CPI dos Grampos na Câmara dos Deputados devem receber hoje (18) a gravação de uma conversa entre o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz e a cúpula da PF sobre a atuação na Operação Satiagraha.
Durante a Satiagraha, deflagrada em julho, foram presos o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, e executivos do banco, além do megainvestidor Naji Nahas e do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, suspeitos de crimes financeiros. Dantas também responde por supostamente ter tentado subornar um delegado para seu nome sair da investigação.
Para o STF, a conversa entre Protógenes e seus superiores mostra que o gabinete do presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes, foi monitorado.
Na gravação, de quase três horas, Protógenes, que comandou a operação, dá explicações a seus superiores sobre os métodos utilizados na Satiagraha.
Num trecho, Protógenes diz que sabia que um HC, abreviação de habeas corpus, que poderia beneficiar investigados na operação, estava sendo preparado no STF. Veja abaixo a transcrição.
Protógenes: “Nós sabíamos que tinha HC preparado e outro HC que estava sendo gestado num gabinete do STF.”
O delegado negou também na conversa participação de agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), embora haja informações de que a agência cedeu mais de 80 agentes à Satiagraha.
Superior: “Tinha gente da Abin trabalhando na operação?”
Protógenes: “Não, os agentes da Abin trocaram informação conosco.”
Superior: “Neste específico teve requisição de agentes da Abin para trabalhar no caso?”
Protógenes: “Não é requisição expressa, é requisição informal.”
Superior: “Como assim? Não entendi.”
Protógenes: “Confirmação de endereço [exemplo]. Confirma o endereço da fazenda de “A” e de “B” que não teríamos tempo de confirmar esse dado. Então nós pedimos a confirmação e eles nos informaram, apenas isso.”
Segundo a assessoria de imprensa do STF, a gravação confirma que o gabinete de Gilmar Mendes era alvo de espionagem.
A PF e o delegado não comentaram as gravações divulgadas. “Eu não posso me manifestar por que isso é objeto de investigação”, afirmou Protógenes.
Câmara
Para o deputado Raul Jungman (PPS-PE), presidente da comissão de segurança pública, a gravação é sinal de que o gabinete pode ter sido monitorado.
“Significa que o Supremo Tribunal Federal estava sendo monitorado ilegalmente, que se sabia o que estava sendo passado no gabinete no presidente do Poder Judiciário, o ministro Gilmar Mendes”, avaliou Jungman.
Se comprovada, a participação da Abin na Satiagraha pode complicar a situação do diretor afastado da agência, Paulo Lacerda, que deixou o cargo após a divulgação de que a Abin teria atuado no grampo no STF.
Deputados da CPI dos Grampos avaliam que uso irregular da Abin pela PF poderá gerar indiciamentos por falso testemunho na CPI.
Presidente da CPI, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), considera que Lacerda mentiu na CPI quando disse que deu apenas ajuda ao delegado Protógenes. “O Paulo Lacerda faltou com a verdade bem como outras pessoas que lá compareceram. Então essa análise [de indiciamento] será realizada e a proposta será votada pelos membros da comissão.”
Atuação da Abin
No fim de agosto, uma reportagem da revista “Veja” apontou ainda a existência de escutas ilegais feitas supostamente por integrantes da Abin nos telefones de Gilmar Mendes.
A publicação transcreve uma conversa de cerca de dois minutos entre Mendes e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), que teria ocorrido às 18h32 do dia 15 de julho. No telefonema, de acordo com a revista, Torres pede a Mendes ajuda contra a decisão de um juiz de Roraima que teria impedido uma importante testemunha de depor na CPI da Pedofilia, da qual é relator.
No diálogo, Mendes agradece ao senador, por ter subido à tribuna do Senado para criticar pedido de impeachment do presidente do STF, feito por um grupo de promotores descontentes com habeas corpus concedido ao banqueiro Daniel Dantas. Na época, a PF prendeu Dantas duas vezes, mas o banqueiro acabou solto por determinação de Gilmar Mendes.
Juiz do caso
Em sessão realizada na segunda (17), a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu que o juiz Fausto De Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal, continuará no processo que investiga crimes financeiros e corrupção supostamente cometidos pelo banqueiro Daniel Dantas e outros envolvidos na Operação Satiagraha.
A defesa de Dantas havia pedido o afastamento do juiz do caso sob a alegação de imparcialidade.
Mas a permanência de De Sanctis, que foi o juiz que concedeu as ordens de prisão para Dantas e os demais suspeitos, será novamente discutida nesta terça-feira (18) pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). De Sanctis é suspeito de repasse indevido de senhas de cadastros telefonicos a policiais federais.
Além disso, o juiz terá de decidir também nesta terça se pede promoção a desembargador, o que o tiraria do caso.
A ordem de prisão de Dantas duas vezes por De Sanctis e a ordem de soltura em ambas as ocasiões por Gilmar Mendes gerou impasse no Poder Judiciário.
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