Em confronto direto com o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, Federação Nacional dos Policiais Federais diz em documento que está instalado dentro do próprio funcionalismo público federal um núcleo duro que impede a plenitude e avanços da Lei.
Claudio Julio Tognolli _247
Em confronto direto com o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, a Fenapef, Federação Nacional dos Policiais Federais, divulgou nesta quarta-feira documento que coloca em xeque os caciques da corporação. Maior entidade de classe da PF, com 15 mil filiados, a Fenapef diz que está instalado dentro do próprio funcionalismo público federal um núcleo duro que impede a plenitude e avanços da tão celebrada Lei de Acesso às Informações – vendida como uma das meninas dos olhos do governo Dilma.
Conheça o documento dos federais:
A Lei nº 12.527/2011, batizada de Lei de Acesso à Informação, em vigor desde 16 de maio, tem sido considerada um marco para a democracia brasileira. Para a Controladoria Geral da União (CGU), encarregada de fiscalizar o cumprimento da legislação, o acesso da sociedade às informações públicas vai resultar na melhoria da gestão pública, ao possibilitar maior participação popular e controle social das ações governamentais.
O acesso passou a ser a regra, e o sigilo, a exceção. No entanto, essa máxima da transparência ainda não foi bem assimilada pelos dirigentes da Polícia Federal. O diretor de comunicação a Fenapef, Josias Fernandes Alves, através do sistema eletrônico do SIC, do Ministério da Justiça, encaminhou seis solicitações ao órgão, relacionadas à política de pessoal. Três foram negadas pela Diretoria de Gestão de Pessoal (DGP) e pelo diretor-geral da PF, Leandro Daiello Coimbra. Outros três pedidos estão em andamento.
O primeiro pedido indeferido foi quanto às remoções ex officio, efetivadas nos últimos cinco anos, incluindo os gastos com ajuda de custo, passagens e transporte de mobiliário. O setor de recursos humanos argumentou que a consolidação de informações relativas ao quantitativo, distribuição, localização e mobilização de servidores da Polícia Federal no território nacional foi classificada, recentemente, como “reservada”.
A DGP alegou que a “restrição temporária” de acesso às informações levou em conta a necessidade de proteger a instituição e a integridade física de seus servidores e familiares, bem como pelos riscos de “comprometer as atividades de inteligência, investigação e fiscalização”.
Até então, as informações sobre remoções, publicadas no boletim de serviços do órgão, não eram consideradas de caráter reservado. A rotina do cumprimento de missões, por equipes reduzidas, em várias unidades da PF do país, principalmente em regiões de fronteira, bem como a falta de meios de comunicação para a maioria dos policiais federais (forçados a usar o telefone pessoal), são apenas alguns exemplos de que a segurança dos servidores da PF não parece ser prioridade entre as preocupações dos dirigentes do órgão.
Se a segurança dos policiais federais e de seus familiares fosse prioritária, a direção-geral do órgão, certamente, teria tomado medidas para evitar a divulgação do nome completo de todos os policiais federais, através do Portal da Transparência, disponível para consulta desde 27 de maio. O portal não disponibilizou os dados dos servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), considerados sigilosos, por força de lei. Não se tem notícia de qualquer iniciativa por parte da direção da PF junto ao governo para tentar restringir a divulgação dos dados dos servidores, principalmente os que atuam nos setores operacionais e de inteligência policial.
Na prática, os gestores da PF devem estar receosos com a divulgação de informações que revelem a falta de critérios e de justificativa para muitas remoções de ofício. Transparência nunca foi o forte da política de pessoal do órgão. Nos últimos três anos, mais de 600 servidores foram removidos no interesse da Administração, na modalidade “de ofício”. A movimentação de pessoal ocorreu em detrimento do concurso interno de remoções, com regras objetivas, e provocou insatisfação generalizada e uma avalanche de ações judiciais, por parte dos servidores preteridos.
CEDIDOS – Outro pedido indeferido foi da relação atualizada de servidores da PF cedidos a outros órgãos. Na resposta, os gestores de pessoal da PF “descobriram a pólvora” e informaram que os atos de cessão e requisição são publicados no Diário Oficial da União, nas páginas referentes ao Ministério da Justiça e ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, acessíveis através do site da Imprensa Nacional. Pela lógica dos dirigentes da PF, a lei de acesso à informação seria supérflua ou redundante, já que por lei todos os atos administrativos devem ser publicados.
Para fundamentar a negativa ao pedido, o diretor-geral da PF citou o Art. 13, inciso III do Decreto nº. 7.724/2012. O regulamento prevê que não serão atendidos pedidos que “exijam trabalhos adicionais de análise, interpretação ou consolidação de dados e informações, ou serviço de produção ou tratamento de dados que não seja de competência do órgão ou entidade”.
A Fenapef apurou que o Setor de Lotação e Movimentação da DGP tem as informações compiladas sobre os servidores cedidos. Os relatórios atualizados eram divulgados internamente, mas a publicação foi suspensa, por ordem do diretor-geral. Na contramão dos objetivos da lei, fica evidente que a intenção é dificultar o acesso à informação.
Para acessar a informação – que poderiam ser fornecidas com o simples comando de “copiar e colar” – seria necessária a consulta de cada um dos 13.801 nomes de servidores da PF (número disponível no Portal da Transparência). Além da informação sobre a remuneração, data de nomeação e outras informações, o portal também disponibilizou os dados sobre a situação do vínculo e o órgão para o qual o servidor foi cedido.
Independente de solicitação, o sítio do Supremo Tribunal Federal (STF) disponibilizou, além da relação de nomes de ministros e magistrados convocados, todos os dados sobre a gestão de pessoas. Relatórios detalhados informam quantitativo de pessoal, nome, matrícula, cargo, órgão de lotação e de origem, número do ato e data de publicação.
Com informações atualizadas até o mês passado, é possível saber, por exemplo, que lá no STF 75 servidores encontram-se cedidos para outros órgãos, 71 servidores de outros órgãos estão cedidos ao Tribunal, 26 servidores não têm vínculo efetivo e até os nomes e postos de trabalho de 1.180 funcionários terceirizados. Tudo de forma transparente, sem mistério, nem reserva.
É provável que os diretores da PF estejam tentando evitar questionamentos quanto aos critérios, à conveniência e ao interesse público da cessão de servidores, diante das carências de pessoal enfrentadas pelo órgão.
A Agência Fenapef obteve a informação que, atualmente, só no cargo de delegado, mais de 70 estão lotados em outros órgãos federais e estaduais. O número equivale à metade do quantitativo de vagas abertas para o concurso em andamento.
Há casos que chamam a atenção, como o do delegado Adilson Batista Bezerra, nomeado pela PF em dezembro de 2003. De acordo com currículo divulgado pelo próprio delegado, em fevereiro de 2004, foi cedido para ocupar cargo comissionado no Ministério da Saúde. Em 2005, foi designado para um cargo na Agência Nacional de Saúde Suplementar; em 2007, para outro cargo em comissão na Anvisa e, em março do ano passado, nomeado assessor técnico no gabinete do senador Humberto Costa (PT/PE).
A Agência Fenapef procurou a assessoria de imprensa do gabinete do senador Humberto Costa, para tentar ouvir o servidor cedido. A assessoria pediu que as perguntas fossem encaminhadas através de e-mail. Uma das questões foi sobre o número de inquéritos policiais que o delegado presidiu, em quase nove anos na PF. Até o fechamento desta matéria, ninguém retornou o contato.
CAPACITAÇÃO – O terceiro pedido negado foi de informações sobre o processo de concessão de licença-capacitação de um ex-superintendente regional da PF em Minas Gerais, para fazer curso de mestrado. O órgão considerou que a informação tem caráter pessoal e não poderia ser fornecida, a despeito de se referir a ocupante de cargo público. Durante sua gestão, o mesmo ex-superintendente indeferiu pedidos de licença análogos, feitos por subordinados, sob o argumento de que não atendiam ao interesse do serviço.
Na Internet, já estão disponíveis os valores da remuneração da presidente da República (R$ 26.723,13 brutos), do diretor-geral da Polícia Federal (R$ 26.407,43 brutos), assim como de todos os servidores e demais gastos da União. Neste contexto, a criação de entraves para acesso pleno às informações de interesse público demonstra falta de compromisso, cinismo, desrespeito ou mero desprezo aos princípios e à nova lei da transparência.
LEI DE ACESSO – De acordo com a Constituição Federal, “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral”. A norma detalhou como órgãos e entidades públicas no âmbito federal devem divulgar, de forma proativa, informações em sítios eletrônicos. Também estabeleceu prazos para atendimento das solicitações, através do Serviço de Informação ao Cidadão (SIC).
Comments are closed.