Fonte: Blog do Elimar Côrtes
A Polícia Federal, uma das instituições mais respeitadas e de credibilidade do País, atravessa uma crise interna que está refletindo em seu desempenho. De um lado, agentes, escrivães e papiloscopistas, que reclamam da falta de reconhecimento por parte do governo federal com a categoria; do outro, os delegados, que, sem a mão de obra intelectual e de ação dos três primeiros, veem seus trabalhos de investigação prejudicados. Resultado: a instituição está praticamente estagnada em todo o Brasil.
O diretor de Seguridade Social da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), o agente Marcus Firme dos Reis, explica que todo o trabalho de investigação é realizado pelos agentes, escrivães e papiloscopista. Eles são responsáveis pelas investigações em campo, interceptações telefônicas (quando autorizadas pela Justiça) e outros procedimentos.
O dirigente classista frisou que os profissionais da Polícia Federal são regidos pela Portaria 523/1989, que prevê que as atividades dos agentes, escrivães e papiloscopistas são de nível médio. No entanto, acrescentou Marcus Firme, o governo federal, na hora de publicar editais para a abertura de concurso para qualquer cargo na Polícia Federal, exige do candidato o curso superior:
“O governo esquece que, a partir da Constituição Federal de 1988, a Polícia Federal passou a ter diversas outras atribuições, como o controle de armas e de agentes químicos. A lei de 1996 passou a exigir que todos os candidatos a cargos na Polícia Federal tenham nível superior completo, o que é um ganho para a instituição e à sociedade. Aqui mesmo no Espírito Santo temos um agente com mestrado em Física e logo ele terá doutorado. O conhecimento que tem na área ele dá ao povo brasileiro, por meio de seu trabalho na Polícia Federal. Mas o trabalho dele e de todos os colegas não é reconhecido pelo governo federal”, disse Marcus Firme, que acrescentou:
“Continuamos, equivocadamente, sendo regulamentados por uma portaria de 89, que nos trata como sendo profissionais de nível médio. É assim que o governo pensa e age quando define o salário de um agente federal, por exemplo. O agente, em início de carreira, recebe R$ 5 mil líquidos. Já um delegado federal, em início de carreira, recebe R$ 14 mil líquidos”.
Segundo o dirigente da Fenapef, há mais de seis anos a categoria tenta negociar com o governo federal melhoria salarial e uma reestruturação para a Polícia Federal num todo: “Há uma má vontade muito grande para com a Polícia Federal, inclusive com diminuição de verba para a instituição, o que enfraquece o trabalho ainda mais. O contracheque dos agentes federais em janeiro de 2014 é o mesmo de 2009. Como o governo não reconhece a categoria como sendo de nível superior, o nosso salário é baixo”, disse Marcus Firme.
Segundo ele, “devido à falta de reconhecimento por parte do governo federal, os agentes federais passaram a fazer somente o que determina a portaria de 89, que nos trata como sendo profissionais de nível médio”. Marcus Firme explica então porque a Polícia Federal está estagnada:
“Só realizamos missões que estejam dentro de nossas atribuições. Os agentes, escrivães e papiloscopistas só cumprem o que é de atribuição de nível médio. Em tese, os delegados é que realizam as atribuições de nível superior”.
Para o presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Espírito Santo, Marivelton Fernandes de Souza, o tratamento inadequado dispensado pelo governo federal à Polícia Federal “provoca descontentamento e desmotivação”. Segundo ele, “esta crise reflete, infelizmente, em todo o trabalho da Polícia Federal. Tudo que queremos é a reestruturação do órgão, que vem sendo discutido há mais de seis anos”.
Ele pondera que o agente e outros profissionais da Polícia Federal dão dedicação exclusiva à instituição. “Depois de aprovado em concurso público, o agente fica de quatro a seis meses fazendo curso na Academia Nacional da Polícia Federal (ANP), em Brasília. Depois do curso, toma posse e vai trabalhar em um dos estados de fronteira. A maioria fica longe de casa por mais de três anos – isso quando dá sorte, porque muitos atuam nas fronteiras até por cinco anos antes de conseguir remoção para outros centros, próximos a seus familiares. E, mesmo assim, o governo nos trata com descaso”, pontuou Marivelton Fernandes de Souza.
Números comprovam estagnação
Relatório da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) revela que a Polícia Federal reduziu as operações de combate à corrupção nos últimos anos. O documento aponta queda significativa em investigações dos crimes de peculato, concussão, emprego irregular de verba pública, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, entre outros crimes que, em linhas gerais, indicam malversação de recursos públicos.
Segundo a Fenapef, o total de indiciamentos nesses crimes caiu de 10.164, em 2007, para 1.472, em 2013 – uma redução de 86%. De acordo com a Fenapef, a queda das operações de combate à corrupção começou a partir de 2007, quando o delegado Luiz Fernando Corrêa assumiu a direção da PF em substituição a Paulo Lacerda. A baixa produção se prolongou na administração do atual diretor, Leandro Daiello, que está no cargo desde o início do governo Dilma Roussef.
Ainda segundo a Fenapef, em 2010 a Federal indiciou 3.874 pessoas por formação de quadrilha; 771 por peculato; nove por emprego irregular de verba pública; 99 por cobrança de propina; 367 por corrupção passiva; 1.201 por crime contra o sistema financeiro; e 456 por lavagem de dinheiro. Naquele ano, a PF também indiciou 704 prefeitos por crime de responsabilidade.
Agora em 2013, de janeiro até o fim de novembro, data do levantamento da Fenapef, a Polícia Federal indiciou 759 pessoas por formação de quadrilha; 185 por peculato; uma por emprego irregular de verbas públicas; 14 por concussão (cobrança de propina); 78 por corrupção passiva; e 123 por lavagem. Nestes 11 meses, 102 prefeitos foram indiciados por crime de responsabilidade.
A Fenapef, formada por agentes, escrivães e papiloscopistas, reivindica reajustes na remuneração e ocupação de cargos que, hoje, são reservados a delegados e, em, menor número, a peritos. Em novembro, o governo chegou a repetir a oferta de reajuste escalonado de 15,8%. Mas a proposta foi rejeitada.
Os agentes dizem que o reajuste parcelado resultaria num aumento de pouco mais de R$ 200 por ano. Para eles, se aceitassem essa proposta, os policiais teriam poucas vantagens materiais.
“Hoje, ao tomar posse, qualquer delegado já assume um cargo de chefia na Polícia Federal. A administração dividiu unidades só para que mais delegados possam ser chefes de setores, que antes eram dirigidos por apenas um profissional. Até o canil da Polícia Federal, que fica em Brasília, tem um delegado como chefe. Lá no canil, o que ele vai investigar? Nada”, diz o agente Marcus Firme.
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