As comissões criadas no âmbito do Senado e da Câmara para analisar a reforma do Código Penal (Decreto-lei No 2.848/1940) reuniram-se nesta sexta-feira (4) para se inteirar sobre os trabalhos desenvolvidos nas duas Casas do Congresso. A desproporção das penas, a grande quantidade de leis especiais e a inadequação de grande parte das leis penais à realidade são alguns dos principais desafios enfrentados pelos dois colegiados.
Instalada em outubro, a Comissão de Reforma do Código Penal do Senado é formada por 16 juristas e dividida em grupos que estudarão a parte geral do código; a parte especial, que trata dos crimes e das penas; e a chamada legislação extravagante, que, apesar de tratar de crimes, não faz parte do código.
Já a Subcomissão de Crimes e Penas, ligada à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, analisa apenas a parte especial e a legislação não incluída no código.
A desproporcionalidade nas penas é apontada pelo relator da subcomissão da Câmara, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), como ponto central do trabalho naquela Casa. Como exemplo, o deputado citou o fato de a pena mínima para quem falsifica um cosmético, de dez anos, ser maior que a pena mínima do crime de homicídio, de apenas seis anos. O deputado também disse considerar branda a pena para o crime de corrupção.
– Não é razoável que a pena mínima para o crime de roubo seja de quatro anos e para o crime de corrupção a pena mínima seja de dois anos. É preciso aumentar a pena do crime de corrupção – disse.
Uma das razões apontadas para as distorções são os inúmeros projetos que pedem aumento de pena apresentados após crimes de grande repercussão nacional. Uma das soluções que a subcomissão discute é a exigência de Lei Complementar para a mudança de penas, o que tornaria as mudanças mais difíceis. Para o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Gilson Dipp, presidente da comissão do Senado, a idéia não está descartada.
– É uma idéia que pode ser ponderada. Eu realmente não tenho uma pré-opinião com relação a isso, mas é um caminho para que não haja esse desvirtuamento de penas ou essa mutabilidade das penas ao sabor da ocasião – afirmou.
Tipos penais
A grande quantidade de crimes previstos no Código Penal também foi lembrada pelos participantes da reunião, que relataram a existência de mais de mil crimes na lei brasileira. Como o código é de 1940, muitos desses crimes poderiam ser retirados do texto e reenquadrados como infrações administrativas, civis ou tributárias.
Para outros delitos, segundo Dipp, falta a previsão legal. É o caso dos crimes cibernéticos, por exemplo. Como não há previsão em lei, eles acabam sendo enquadrados como estelionato ou furto qualificado pela fraude.
– Vai chegar um momento em que crimes graves, como por exemplo entrar em um site de governo, vão ficar em aberto, porque nós não temos um tipo penal – alertou o ministro, que lembrou da complexidade desse tipo de crime.
Para tentar resolver essas deficiências do código, foram criadas, ao longo do tempo, outras leis que tipificam crimes como a lavagem de dinheiro, por exemplo. A grande quantidade de leis especiais também é um problema que deverá ser discutido nos dois colegiados. Para Gilson Dipp, é preciso incluir no código os crimes previstos nessas leis extravagantes, o que facilitaria o trabalho da polícia e da justiça.
Penas alternativas
Integrantes dos dois colegiados concordam que é preciso ampliar a possibilidade de penas alternativas para alguns tipos de crime. A alegação é de que, em alguns casos, a permanência no sistema prisional acabe corrompendo ainda mais quem sofre a punição.
– Hoje em dia, as cadeias, muitas vezes, são escolas de crime. Não faz sentido colocar alguém que praticou um pequeno furto numa cela com alguém que praticou 20 homicídios. Isso é ruim para a sociedade – afirmou Molon.
Para o professor René Ariel Dotti, que relatará os trabalhos do grupo responsável pela parte geral do código, é necessário ampliar a possibilidade da aplicação da pena de multa, como já ocorre em países como Portugal, por exemplo.
Trabalhos
A previsão para que os trabalhos da comissão do Senado sejam concluídos é de 180 dias, prazo que poderá ser prorrogado. O trabalho integrado dos colegiados nas duas casas, segundo os integrantes, pode evitar o desperdício de tempo. De acordo com o deputado Molon, ao final dos trabalhos, a subcomissão pretende apresentar as propostas ao colegiado do Senado antes que elas sejam protocoladas como proposições.
– Tudo aquilo que for proposto na Câmara será revisto no Senado e vice-versa. Pra evitar que a gente perca tempo com isso, por que não dialogar antes da apresentação dos projetos, ganhar tempo e portanto fazer mais justiça mais rapidamente no Brasil? – indagou.
Além de ouvir as propostas da Câmara, os integrantes da comissão do Senado receberão sugestões da população. As manifestações podem ser feitas pelo site criado dentro do serviço Alô Senado sobre o tema ou pelo telefone 0800-612211. O material será encaminhado à comissão de juristas.
– Com o portal, receberemos sugestões de toda a sociedade. Também tentaremos realizar audiências públicas e algumas consultas com pessoas da sociedade civil, associações de classe, ministério público, juízes – informou Dipp.
As próxima reunião da comissão está marcada para o dia 1° de dezembro, com as três subcomissões reunidas separadamente. No dia 2 de dezembro, todo o grupo se reunirá.
Fonte: Agência Senado
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