POR PAULO IASZ DE MORAIS
Às vésperas da quadra natalina e Ano Novo, a 1ª Vara das Execuções Criminais de São Paulo expediu a Portaria 008/2010, regulamentando a Lei 12.258/2010, que estabeleceu a possibilidade da utilização do monitoramento eletrônico de presos com as famosas tornozeleiras.
Na verdade, a lei em comento alterou a Lei de Execuções Penais, admitindo a hipótese da utilização do sistema de monitoramento eletrônico para detentos em cumprimento de prisão domiciliar, bem como para os casos daqueles com direito à saída temporária, o famoso e conhecido indulto de Natal e Ano Novo.
Respeitada toda a discussão sobre a constitucionalidade dessa nova norma, bem como as críticas que se possam fazer de que a lei não proporcionará o desafogamento do sistema penitenciário, resta certo que o estado de São Paulo iniciará a utilização desse novo sistema de monitoração de detentos.
Assim, compreendemos que a Lei 12.258/2010 foi concebida dentro de um objetivo diferente do originalmente estabelecido, uma vez que o monitoramento eletrônico de detentos sempre foi estudado como forma de possibilitar o desafogamento do sistema penitenciário, jamais para os fins de fiscalização de presos em regime semiaberto ou prisão domiciliar, ainda que a sociedade demonstre enorme preocupação com aqueles presos que nesse período de indulto possam estar na reincidência criminosa ou fuga, que na verdade representam apenas 5% do universo de presos que recebem esse benefício.
Nesse ponto, cumpre colocar alguns pontos relevantes a cerca dos procedimentos e forma de aplicação das tornozeleiras. O primeiro deles é que o estado de São Paulo adquiriu apenas 4.800 aparelhos para o monitoramento, quando na verdade sabe-se que o número de presos que terão direito ao benefício de saída temporária, o indulto de Natal e Ano Novo, poderá atingir o número de 20.000 presos. O segundo é que a aplicação da tornozeleira jamais poderá expor o preso a uma situação vexatória ou de constrangimento, ou seja, a sua utilização deverá ocorrer de forma a garantir a dignidade daquele que utilizará esse aparelho.
Com relação à evidente falta de equipamentos eletrônicos para todos aqueles presos que terão direito ao benefício, resta claro e evidente que esse descompasso não poderá ser motivo e ou justificativa para aqueles que não tiverem tornozeleiras disponíveis, para não gozarem do benefício conquistado nos termos da Lei de Execuções Penais. Ao nosso entender, nessa situação e momento de inexistência de equipamentos suficientes para atendimento de todos os beneficiados, o sistema não deveria ser implantado, uma vez que criará a possibilidade de aplicação das tornozeleiras dentro de critérios subjetivos. Quais presos sairão com o monitoramento? Que critério de escolha será utilizado para aplicação da tornozeleira?
Além disso, cumpre salientar que os críticos da lei argumentam que o monitoramento eletrônico, na forma como tratado na lei, na verdade estabeleceu o controle de livres, e não de presos, e, portanto, a referida norma poderá ser ferida pela inconstitucionalidade. Embora estejamos convencidos de que a lei em tela não afronta qualquer dispositivo constitucional, a inexistência do equipamento para aplicação da lei em tela jamais poderá servir de fundamento para negativa da saída temporária no período da festas de Natal e Ano Novo.
A preocupação de que a tornozeleira possa ferir a dignidade da pessoa humana, ao impor ao cidadão a utilização de uma “coleira”, na forma como ocorria no período da escravatura, não merece prosperar, haja vista que estamos absolutamente convencidos de que o atual sistema carcerário brasileiro é o maior elemento de ataque à dignidade humana. Aqueles que conhecem o sistema prisional sabem que ali a última coisa que podemos encontrar é o tratamento digno e correto de um ser humano.
Por fim, entendemos que esse é apenas o início de um processo de implantação de uma nova metodologia, que possibilitará a ampliação da sua utilização para os casos de detentos em prisão cautelar, ou até mesmo em cumprimento de pena, ou seja, inicia-se com aqueles em regime de cumprimento de pena menos severo para que, em momento posterior, compreendido o regular controle e funcionamento de todo o sistema (equipamentos e pessoas que estarão envolvidas no trabalho de controle) seja possível avançar, efetivamente, para aqueles presos em regime de prisão cautelar e até mesmo em regime de cumprimento de pena.
Nesse sentido, o projeto do novo Código de Processo Penal, em trâmite no Congresso Nacional, caminha para a efetiva aplicação e utilização do sistema de monitoramento eletrônico de forma a melhorar e desafogar o sistema penitenciário.
As tecnologias criadas pelo homem, no campo da informática no século XX avançaram em todas as áreas das nossas vidas e, nesse campo, também não poderá ser diferente. Assim, precisamos tirar proveito das possibilidades existentes, até mesmo como forma de se garantir um tratamento mais humano daqueles que cumprem pena, abrindo-se caminho para uma efetiva recuperação e inclusão na sociedade daqueles que em algum momento tiveram um desvio de conduta.
Experiências vividas por outros países, onde o sistema eletrônico de presos já vem sendo utilizado por mais de dez anos, mostram com clareza que o mesmo proporcionou uma importante melhora nos índices de recuperação dos detentos, quando comparado com os resultados conquistados com sistema penitenciário tradicional.
Portanto, a aplicação e utilização das tornozeleiras no estado de São Paulo em um momento em que o número de equipamentos não consegue atender o universo total de detentos com direito ao benefício da saída temporária parece-nos medida temerária, uma vez que possibilitará a ocorrência de critérios aparentemente ilegais.
No mais, estaremos observando o processo de implantação e utilização desse novo dispositivo de controle de presos, na torcida de que os resultados sejam positivos para os presos e para toda sociedade.
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