Fonte: Agência Fenapef
A Federação Nacional dos Policiais Federais vem a público defender o profissionalismo na Polícia Federal, ao apoiar a Nota Técnica nº 021/2014 da ANPR e repudiar a visão retrógada, fantasiosa e burocrática contida numa nota emitida por entidades de delegados.
Para a maioria absoluta dos policiais federais, um chefe deve provar competência e ter experiência antes de liderar numerosas equipes em investigações complexas ou administrar orçamentos milionários. E os maiores responsáveis pela crise institucional da Polícia Federal são seus péssimos gestores, bacharéis em Direito, que não possuem uma formação acadêmica que possibilite a capacidade gerencial.
Os argumentos utilizados pelas associações confundem qualquer leitor, com uma hermenêutica carente de técnica jurídica, e recheada de anseios corporativistas que ignoram a necessidade gritante de modernização da segurança pública.
O que dizer do fantasioso argumento de que “o delegado de polícia coordena e comanda, pessoal e efetivamente, os demais policiais, tanto em trabalhos externos como internos, determinando e realizando todo o tipo de diligência necessária, enfrentando o crime organizado com risco à sua própria vida”.
Ora, em 1940, talvez esse cenário existisse. Mas hoje todo policial federal possui formação acadêmica, e nos concursos públicos de todos os cargos policiais são exigidos conhecimentos científicos específicos de Direito Penal e Direito Processual Penal. Aliás, esse é o grande motivo da crise na PF: a crise de identidade promovida pelas associações de delegados.
Se um policial federal é capaz de produzir prova e elaborar um relatório de investigação ou inteligência com metodologia científica, e também possui o conhecimento necessário para analisar e indicar quais os crimes cometidos, torna-se ultrapassada a figura do delegado?
Essa pergunta aterrorizante criou um movimento político dentro da PF nos últimos dez anos, com uma política gerencial que estabeleceu um dogma ilegal de que somente delegados poderiam ocupar cargos da administração, somado ao desmantelamento das chefias ocupadas por agentes e escrivães federais, e a fragmentação dos núcleos operacionais.
Ao invés de evoluir profissionalmente em sintonia com os demais cargos policiais, para fazer surgir uma nova natureza jurídica do cargo, as lideranças dos delegados, nas associações e na administração da PF, preferiram combater de forma implacável o crescimento profissional dos demais cargos, como se estes fossem concorrentes a serem eliminados.
Inicialmente foi promovido um aumento desproporcional do número de delegados, com ênfase específica no seu concurso público, de forma a ocupar todos os espaços de chefias. E por que não se preocupar durante anos com a escassez de agentes e escrivães federais, quando é alarmante a falta de efetivo em todo o país?
O curso de pós-graduação previsto para a progressão dos agentes, escrivães e papiloscopistas foi extinto, e criaram-se duas novas vertentes somente para delegados e peritos. Também foi perceptível a regressão proposital do nível de conhecimento científico exigido nos concursos públicos de agente, escrivão e papiloscopista da PF.
De repente, lideranças de delegados começam a sugerir um cargo policial com nível médio de instrução, como se quiséssemos regredir na evolução das polícias. É o ápice da política institucionalizada de segregação funcional.
Através da hedionda politização da Academia Nacional de Polícia, uma escola de governo, a definição dos perfis profissionais de todos os cargos é comandada por aqueles que infelizmente interpretam o crescimento profissional dos demais como uma ameaça ao equilíbrio político de um órgão que precisava somente ser eficiente.
Os antigos cursos especiais e superiores são substituídos por um curso chamado de aperfeiçoamento. Pois, quando o curso especial dos agentes, escrivães e papiloscopistas melhorou o órgão, valorizou o efetivo ao gerar especialistas de nível superior reconhecidos pelo MEC, a crise de identidade das lideranças dos delegados se acentuou.
O mesmo fenômeno é observado na diminuição do grau de conhecimento científico dos cursos de formação profissional dos agentes, escrivães e papiloscopistas da PF. Nitidamente, nos últimos anos, é fácil observar que tem sido retirada a complexidade de suas competências.
Retornando à nota das associações de delegados, curioso ler o trecho: “transformar agentes federais, em um toque de mágica, em delegados, como quer a ANPR, fere o princípio do concurso público e repercutirá negativamente na estrutura da PF, prejudicando as investigações”.
Ora, a Nota Técnica nº 021/2014 da ANPR sugere a modernização da carreira com a extinção do cargo de delegado, afinal, é difícil conceber que um investigador queira ficar atrás de uma mesa, lidando apenas com papel.
Além disso, não há que se falar em afronta ao princípio do concurso público, uma vez que estamos diante de uma única carreira policial federal. Os cargos são em número de cinco, mas a carreira, como o próprio número da palavra sugere, é singular. Além disso, investigações não seriam prejudicadas, mas sim otimizadas.
As entidades de delegados se utilizam de falácias ao comparar os analistas e técnicos do Ministério Público aos servidores policiais federais diversos do cargo de delegado. Na verdade, a crise de identidade de expõe, pois promotores são cargos políticos, ao contrário do que o alter ego das lideranças dos delegados supõe.
E mais, os analistas e técnicos do MPU são servidores que atuam na atividade-meio deste órgão, ao passo que agentes, escrivães e papiloscopistas, sem esquecer dos peritos, atuam na atividade-fim, cada cargo com seu espectro de atribuição na formação do resultado buscado pelo órgão.
Não há que se falar na velha ladainha do “trem da alegria”, pois o instituto do concurso público será mantido, como já o é, além de que não se está buscando a ocupação, por meio da promoção, do cargo de delegado pelos servidores dos demais cargos policiais federais.
Como é sabido, de fato a Polícia Federal goza de grande respeito da sociedade brasileira, mas isso não se dá em razão do comando dos delegados, mas sim do empenho e dedicação, em sua maioria, dos agentes, escrivães e papiloscopistas federais. São estes que abdicam do convívio familiar e da segurança das instalações prediais para, efetivamente, combater a corrupção, o tráfico de drogas e armas, além de inúmeros outros tipos penais, sem esquecer das funções de polícia administrativa.
A nota das associações de delegados diz ainda que “a ANPR propõe a perigosa eliminação da “infundada divisão hierárquica da Polícia Federal”, um dos sustentáculos, juntamente com a disciplina, de todos os segmentos armados do poder público. Sem esses dois componentes, hierarquia e disciplina, tais instituições podem tornar-se verdadeiros e incontroláveis bandos armados, possibilitando graves riscos para a sociedade. Recentes episódios nos estados da Bahia e de Pernambuco, envolvendo policiais militares, bem retratam tal possibilidade”.
O teor do parágrafo acima mostra total desconhecimento da ideia que se propõe a comentar. Hierarquia e disciplina são institutos que devem estar presentes em todo o serviço público, inclusive nas polícias, fato que o cargo único não exclui, ao contrário, o mantém.
As polícias militares são tidas como verdadeiros exemplos de hierarquia e disciplina e os fatos ocorridos nos estados da Bahia e Pernambuco nada têm a ver com a falta destas (hierarquia e disciplina).
Além disso, todos os países desenvolvidos do mundo, e com melhores índices de combate à criminalidade do que o Brasil, adotam o modelo da carreira única, sem esquecer nossa respeitada Polícia Rodoviária Federal (PRF). Ademais, não temos conhecimento de casos relevantes de problemas com hierarquia e disciplina envolvendo a PRF ou mesmo casos no FBI, Scotland Yard e outras mais, que pudessem ter relação com a carreira única.
Repudiamos ainda a frase de cunho estritamente marqueteiro e irreal que diz que o “delegado de polícia exerce função essencial à justiça e é o primeiro garantidor dos direitos fundamentais do cidadão”.
Tal afirmação demonstra grande desconhecimento jurídico, especificamente do texto constitucional, ao dizer que o delegado de polícia exerce função essencial à justiça. As funções essenciais à justiça são tratadas entre os artigos 127 e 135 da Constituição Federal e não mencionam tal cargo, incluindo no referido rol taxativo apenas o Ministério Público, a Advocacia Pública, a Advocacia e a Defensoria Pública.
Por fim, fica o questionamento: Primeiro garantidor dos direitos fundamentais do cidadão? Onde? Como? E Por quê?
Diretoria da FENAPEF
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