Gilberto Nascimento
Da equipe do Correio
Guarulhos (SP) — O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamou ontem à noite da Polícia Federal (PF) que, em razão de “problemas internos” e “brigas políticas”, estaria “pingando” informações para jornais. Também condenou o envolvimento de seu irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá, com empresários de jogo e considerou que ele seria “mais ingênuo do que lobista”. Durante a abertura do Congresso Nacional dos Metalúrgicos, em Guarulhos, na Grande São Paulo, Lula afirmou que, por causa do parentesco, o indiciamento de Vavá desperta “mais atenção” do que alguém que “fizesse um lobby infinitamente maior”, mas acentuou que ele terá “que pagar um preço”.
Na avaliação do presidente, “só pelo fato de ser meu irmão, ele teria que ter mais responsabilidade e deveria saber das implicâncias que tem”. No entanto, ressaltou que a PF, “ao quebrar o sigilo telefônico de uma pessoa, se prepara para encontrar um cardume de pintado” e Vavá, “nessa história, parece mais um lambari que foi pego”. A vantagem disso, no entender de Lula, “é que ele é um lambari especial por ser irmão do presidente da República”. De qualquer forma, para o presidente, seu irmão “como qualquer brasileiro que cometa um erro, tem que pagar pelo que cometeu”.
Lula informou que visitou Vavá há cerca de 15 dias e o achou um pouco abatido. “Na verdade ele envelheceu”, observou. Disse ter um “carinho todo especial” por ele, que seria “um paizão” da família. “Fora disso, quero saber se há algum atendimento, alguma coisa do Vavá em algum órgão do governo, para mostrar que ele não era lobista. Eu duvido que tenha uma coisa. Não nesse dois anos, mas nesses quatro anos e meio, que tenha sido atendida”.
O presidente não falou se pediu para outro irmão, o ex-dirigente sindical e militante comunista José Ferreira da Silva, o Frei Chico, para conversar com Vavá sobre a “bronca” que pretenderia lhe dar, por apresentar uma pessoa a determinado ministério. Disse não ter “controle sobre Frei Chico”, por ele ser mais velho, e considerou normal que ele fale com Vavá. A conversa em que Frei Chico repreende Vavá foi gravada pela PF e o ex-sindicalista foi identificado inicialmente como um suposto Roberto.
Ao se queixar da Polícia Federal, o presidente disse estar vivendo “um momento de reflexão”, em razão de haver uma investigação de escuta telefônica que deveria ser sigilosa. “(Mas) todo o dia tem informação que você não sabe se ela é verdadeira, você não sabe se ela é truncada”. Para ele, um presidente da República não pode ficar respondendo a questões sobre telefonemas como esses. “A Polícia Federal é uma instituição que tem um poder enorme. E não é possível, se há problemas internos na PF, que esses problemas tenham como vítima o trabalho legal que ela faz”, comentou. “Não cabe ao delegado vazar para a imprensa. O que eu tenho percebido é que, dependendo se houver briga política, as pessoas vão pingando para um jornal uma coisa, para outro jornal outra coisa, e as pessoas sem terem o direito de se defender vão sendo execradas, condenadas aos olhos da opinião pública, sem poder provar que são inocentes”. Para ele, empresário que tem pedido favor a seus parentes “é picareta”.
Ao quebrar o sigilo telefônico de uma pessoa, se prepara para encontrar um cardume de pintado.E (Vavá) nessa história, parece mais um lambari que foi pego |
Preocupações durante telefonemas Marcelo Rocha Da equipe do Correio As conversas gravadas pela Polícia Federal no inquérito da Operação Xeque-Mate mostram que o presidente e outras pessoas estariam preocupados com a atuação do irmão. É o caso, por exemplo, de um alerta que Vavá recebeu de mulher não identificada pela PF.. A chamada ocorreu no final da tarde do dia 23 de maio. A interlocutora iniciou a conversa dizendo que Genival sumiu e que precisava conversar com ele pessoalmente. Ela demonstrou impaciência. Argumentou que não podia esperar. “A coisa tá feia e depois que o copo quebra não tem como colar”, alertou a mulher. Genival retrucou que tinha ciência disso e a agradeceu. No mesmo diálogo, Genival ressaltou ainda que o irmão Lula queria falar com ele, mas afirmou desconhecer o motivo da conversa. Vavá justificou ainda que, por motivos de saúde, deixou de viajar a Brasília. No trecho do inquérito policial em que foi transcrito esse diálogo, não constou o número do telefone da mulher que conversou com Vavá. O advogado Nelson Alfonso, que defende Vavá, disse que seu cliente não teria capacidade intelectual para participar da organização. Os irmãos Nivaldo e Nilton Cezar Servo também o rotulam assim, mas no inquérito reclamam que ele teriam sido passados para trás por Genival. Os dois se referem a “lobby” com o qual o irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentaria reverter suposta decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ) referente a desapropriação de terras no município de Assis (SP). A PF interceptou a conversa em 22 de março. Nivaldo se queixou a Nilton, apontado como principal articulador da máfia dos caça-níqueis, que “(eles) já deram o tombo”, numa referência a Vavá e alguém de nome André, que teria interesse no tal processo do STJ. As gravações sugerem que foi combinada uma reunião em Brasília para discutir o assunto, mas que Vavá e André teriam dado informações truncadas sobre a reunião, deixando os irmãos Servo de fora. Ocorre que Nilton e Nilvado, de acordo com os investigadores, tinham interesse em receber “comissão” caso Vavá tivesse êxito. “Nivaldo diz a Nilton que então eles estiveram em Brasília, com o telefone dele (Nivaldo) na mão, com o do Nilton e que nem ligaram nem nada, chapéu na certa. Nilton diz que foi uma palhaçada. Nivaldo diz que são vagabundos mesmo. (…)”, descreve transcrição de diálogo anexada ao inquérito policial. |
Voz de Frei Chico não é reconhecida
Diz o advogado Nélson Passos Afonso, defensor de Genival Inácio da Silva, o Vavá, irmão mais velho do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que seu cliente não reconhece como sendo de José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão dos dois, a voz que aparece num dos grampos da Operação Xeque-Mate, da Polícia Federal. Na véspera, o próprio Frei Chico reivindicara a “voz” para si. “Esse áudio não é tão claro assim. Ele (Vavá) não reconhece como sendo Frei Chico, nem ninguém mais que ele lembre”, disse ontem Afonso, ao sair da Superintendência da Polícia Federal no Mato Grosso do Sul. No arquivo de áudio gravado pela PF no dia 20 de março, um domingo, a voz, creditada ao interlocutor identificado apenas pelo prenome “Roberto”, alerta Vavá sobre o lobby que ele tentava em Brasília e avisa que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer conversar pessoalmente sobre o assunto. “Tem uma bronca (…)!”, diz “Roberto”. Ao transcrever o grampo para o inquérito, a PF identificou o número de “Roberto” — (11) 4231.2199 —, cuja linha está registrada no endereço de Frei Chico. Este, em entrevista dada na segunda-feira, afirmou lembrar de ter falado com o irmão “alguma coisa parecida”. Até aqui, no entanto, não apareceu qualquer explicação para o fato de Vavá chamar o interlocutor de “Roberto” se tratava-se de seu irmão José, que é conhecido por Chico e ainda com o título “frei”. Hospital Frei Chico passou mal no final da noite de anteonteme recebeu alta do Hopistal do Coração (Incor), no centro de São Paulo. O ex-sindicalista foi encaminhado ao hospital, por volta de 23h30 de segunda-feira e passou por exames. |
“A coisa não tá boa, não, Vavá” Confira trecho do diálogo de Vavá com uma mulher não-identificada Mulher — Vê se você vem, que eu preciso falar com você… Vavá — Eu até procurei o coisa pra falar com ele… Mulher — Urgentemente, Vavá. Vavá — Tá bom. Mulher — Tu não conseguiste falar com teu irmão não, né? Vavá — Não, ainda não. Eu ia ontem em Brasília ontem, não consegui ir. Tava doendo muito a perna e eu não fui. Mulher — Quem que vai com você? Vavá — Hein? Mulher — Quem vai com você? Vavá — Pra onde? Mulher — Pra Brasília. Vavá — Não, eu ia com um amigo meu, mas ele foi, eu não fui não. Mulher — Vavá? Vavá — Eu não fui, eu não consegui ir. E o Lula tá querendo falar comigo. Mulher — Vavá? Vavá — Oi? Mulher — Olha, meu filho. Vavá — Só um minutinho, só um minutinho (pausa). Alô? Mulher — Vavá? Vavá — Pode falar. Tá muito barulho, só um minutinho. Oi, fale. Mulher — Tu vai falar com ele quando? Vavá — Eu tenho (inaudível) falar com ele semana ainda. Ele quer falar comigo, eu não sei o que ele quer. Mulher — Vavá, a coisa não tá boa não, Vavá. Vavá — Hã. Mulher — Vavá, eu tô tendo aviso muito feio aqui. Vavá — Sei, sei. Mulher — Mas muito feito mesmo, eu queria até falar contigo pessoalmente, mas não dá de esperar, Vavá. Vavá — Tudo bem, pode deixar que até sexta-feira eu vou aí. Mulher — A coisa tá feia. Porque depois que o copo quebra, não adianta querer colar. Vavá — Eu sei disso, eu sei disso. Eu agradeço, mas eu vou aí, pode ficar sossegada, viu? Tá bom? Mulher — Tá bom. Vavá — Um beijo pra senhora, um abraço pra senhora, tá? Mulher — Outro. Fica com Deus, Vavá. Vavá — Tchau, minha querida. |
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