Fonte: Blog do Noblat
Os números não mentem — sempre que são honestos, é claro. E também quando sabemos interpretá-los. Por exemplo, no caso de nossa população carcerária. O GLOBO descobriu que ela cresceu consideravelmente — e, portanto, assustadoramente — no Brasil, segundo levantamentos realizados pela Universidade de Essex, da Inglaterra, que investigou e comparou a nossa situação em 2003 e 2013.
Não sei por que a instituição inglesa se preocupou com o número de cidadãos cumprindo pena num país tão distante e tão diferente do seu, tanto em população quanto em costumes. Mas devemos agradecer, mesmo que seja remota a possibilidade de que os dados levantados pelo pessoal de Essex influenciem a nossa política carcerária.
Ao menos, os brasileiros ficarão agradecidos pelos dados levantados pelos pesquisadores ingleses. Com a exceção, é claro, de autoridades e políticos ferozmente nacionalistas que, em vez de agradecer o serviço prestado, venham a se declarar indignados com o que definirão como invasão de uma situação que deve ser administrada pelo poder público.
Mesmo que não se tenha notícia, até agora, de qualquer reconhecimento do problema por governantes e legisladores nativos — nem mesmo da boca para fora, só para enganar o eleitorado.
Lamentavelmente, as descobertas dos especialistas ingleses têm forte cheiro de verdade. O pessoal de Essex tem prestígio internacional e não brinca em serviço. É indispensável — mas ninguém garante que vá acontecer — que as autoridades locais, pelo menos, confiram os números revelados pelos especialistas ingleses. Mas não é provável que o façam. Porque, certamente, conhecem as deficiências do nosso sistema penitenciário.
Parece indispensável uma análise séria do estudo dos especialistas ingleses. Até mesmo na suposta esperança de que eles tenham errado em suas conclusões. Mas as autoridades brasileiras sabem que essa turma é séria. Não será desdouro para elas — inclusive porque a crise no sistema penitenciário é histórica: não representa novidade alguma para nós.
Há uma certa dose de humilhação no uso de um estudo de estrangeiros para fundamentar iniciativas que resultem em alguma melhoria do nosso sistema penal. Mas pior ainda será não tomar iniciativa alguma apenas porque ela estaria sendo provocada pelas constatações de estudiosos ingleses. Afinal, a situação seria mais séria se um programa de melhoria do sistema penal fosse provocado por revelações — digamos, sem ofensa alguma — de uma expedição de especialistas paraguaios.
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