Por L.O Agente de Polícia Federal
Esta semana inúmeros veículos de comunicação noticiaram de modo alvissareiro que uma zeladora de 32 anos foi autuada em flagrante após ser filmada por câmeras comendo um chocolate do delegado da Polícia Federal Agostinho Cascardo, que teria entendido se tratar de furto qualificado. O produto estava em uma caixa sobre uma mesa na sala dele. Ela disse ter assinado ainda um documento sobre a apreensão da embalagem do bombom, que serviria como 'prova do crime'.
Em defesa do delegado a pomposa Comissão Nacional de Prerrogativas da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal correu para desagravar publicamente Delegado Federal Agostinho Gomes, quando classificou de fantasiosa e falaciosa as reportagens inseridas nos sites de notícias, uma vez que após terem constatado através de webcam que a zeladora fez “a ingestão sem autorização do proprietário de bem de consumo perecível” (frise-se o bombom de chocolate), o referido delegado teria se limitado a apresentar os fatos para registro e apreciação do Delegado de plantão no dia para fins de autuação no livro de ocorrências, sendo que O Delegado Natural responsável pela apreciação de toda e qualquer ocorrência durante o dia envolvendo a Polícia Federal e seus membros e servidores, conheceu dos fatos, arrecadou os objetos e materiais relacionados como determina a legislação administrativa vigente, ouviu os envolvidos e não conheceu dos fatos apresentados como crime.
Pois bem! Partindo de uma expressão amplamente conhecida e clichê para iniciar apreciação do quadro antes exposto: seria cômico se não fosse trágico!
Há muito os Escrivães, Agentes e Papiloscopistas, que adiante serão chamados de EPAs, vem clamando por necessárias e urgentes mudanças na estrutura da Polícia Federal, pois a despeito de esta ser uma das Instituições mais conceituadas de nosso País, graças as grandes operações de repressão ao tráfico internacional de drogas e a corrupção generalizada entranhada na Administração Pública, internamente vem passando por uma grave crise interna que é motivada basicamente pela manutenção de uma estrutura antiquada, que não aproveita de modo eficiente o grande potencial profissional da esmagadora maioria dos policiais que integram seus quadros.
Assim, sem paralelo em nenhum país do mundo, temos aqui os famosos concursos para chefe, onde um acadêmico de direito com somente três anos de atividade jurídica ou policial, passa a ocupar cargos de chefias de policiais com anos de vivência e experiência de atividade, e que também possuem formação de nível superior.
Neste cenário o caso do bombom é somente mais uma das tantas mazelas vivenciadas pelos policiais federais que trabalham nas “salas de máquinas”, se dedicando horas a fio em longos trabalhos de investigação, produção de doutrina institucional de técnicas policiais como armamento e tiro e abordagem, inteligência, operações aéreas, aprimoramento de métodos de ensino e logísticos, dentre outras tantas atividades relevantes, sendo que no exercício destas importantes tarefas, além de não terem perspectivas nenhuma de carreira, em não raras vezes são submetidos as agruras decisórias de “chefes” inexperientes e “tudólogos”, pois o simples diploma de bacharel em direito e um concurso, os coloca na confortável posição de segregar grandes profissionais de polícia com décadas de trabalho, e poderem dá a última palavra em qualquer uma das muitas áreas do conhecimento que envolvem a ação da polícia federal brasileira.
É justamente neste cenário que exsurge o tal caso do bombom, onde a zeladora infelizmente foi mais uma colocada na posição de EPA e sentiu a agrura de um modelo de polícia que já motivou nada menos que 18 (dezoito) suicídios nos últimos três anos, e é absolutamente incompatível com envergadura alcançada pela festejada Polícia Federal.
Mas o que é ruim ainda pode piorar, pois enquanto os EPAs defendem a modernização do Órgão com a implementação de uma estrutura que seja calcada na meritocracia, e aproveite o melhor de TODOS os policiais que entregam sua força de trabalho para a Polícia Federal que um dia admiraram e se orgulharam em fazer parte, vemos a antes comentada nota da majestosa “Comissão Nacional de Prerrogativas da Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal” caminhar justamente na direção contrária das melhores e mais eficientes polícias do mundo.
Assim, vemos a entidade de classe do envolvido no “caso do bombom” usar na defesa de seu associado termos como “Delegado Natural”, polícia dividida em “membros” e “servidores”, tudo apontando na direção de aprofundamento do já comprovadamente ultrapassado modelo posto, na busca de um inconcebível espelhamento da Instituição Polícia com o Poder Judiciário, onde os delegados logicamente seriam os “juízes” (membros), e os demais servidores (serventuários de polícia), em um verdadeiro devaneio calcado em invencionices que atende somente aos seus egos, vaidades desmedidas, e quiçá frustração de não terem seguido a carreira de juízes, não importando em nada se a crise interna vai se agravar, se mais colegas vão se suicidar, se a grande maioria dos policiais vai ficar sem perspectivas e desmotivados, se os grandes índices de evasão de EPAs vai aumentar ainda mais, não importando ainda se as grandes operações mascaram uma ineficiência.
Enfim! Temos como claro que o caso do bombom, ou melhor “bem de consumo perecível! Serviu tão somente para mais uma vez desnudar a triste e grave realidade interna da Polícia Federal do Brasil.
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