Procuradora pede à Justiça ação criminal contra servidores, empresários e lobista suspeitos de fraudarem licitações. Quer ainda a quebra de sigilos telefônicos para continuar a investigação
Durante a operação, agentes da Polícia Federal apreenderam documentos e computadores das empresas suspeitas e dos acusados
O Ministério Público Federal propôs a abertura de processo penal contra dois servidores do Senado, os donos das empresas Conservo e Ipanema e o lobista Eduardo Bonifácio Ferreira, ligado ao senador Efraim Morais (DEM-PB). Representação criminal protocolada na Justiça Federal na última quarta-feira aponta formação de quadrilha, corrupção ativa, crime contra licitações e a administração pública. As penas variam de um a 12 anos de reclusão, além de multa.
Um dia antes, a procuradora da República Luciana Marcelino Martins, autora da denúncia, entrou com um pedido de quebra de sigilo de dados e telefônico em cima do mesmo caso, indicando a continuidade das investigações apesar da solicitação de abertura de ação penal.
Os dois servidores do Senado denunciados são Dimitrios Hadjinicoloau e Aloysio Brito Vieira. Eles são acusados de favorecer, em 2006, as empresas Conservo e Ipanema durante o processo licitatório para o fornecimento de mão-de-obra terceirizada. Dimitrios é o diretor da Secretaria de Compras do Senado e Vieira comanda a Secretaria de Fiscalização e Controle, setor responsável pela verba indenizatória de R$ 15 mil mensais que cada senador recebe.
Desde o início de agosto, o Correio tem revelado detalhes da apuração do MPF e da Polícia Federal. A investigação começou na Operação Mão-de-Obra, que prendeu empresários e servidores em julho de 2006. Um mês depois, foi protocolado um pedido de ação penal, já aceito pela Justiça, em relação aos ministérios. Faltava a parte criminal do Senado, entregue na quarta passada pelo MPF.
Um dia antes aliás, o presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), recebeu os editais das licitações que substituirão os contratos suspeitos, que somam R$ 35 milhões por ano. Os serviços haviam sido prorrogados no início deste ano pelo primeiro-secretário, Efraim Morais, até 2009. Pressionado após a divulgação de trechos da investigação, Garibaldi prometeu cancelá-los e escalou uma comissão especial para cuidar do assunto. As licitações devem ocorrer na primeira semana de novembro. A estimativa é que os novos contratos economizem, pelo menos, R$ 6 milhões anuais.
A investigação destaca que, além da ajuda dos servidores, os empresários contaram ainda com a intermediação do lobista Eduardo Ferreira, também alvo da representação criminal. A PF o flagrou em encontros com os donos da Conservo e da Ipanema negociando as licitações. No mesmo período, Ferreira aparece cumprindo expediente no gabinete de Efraim, segundo relatórios de inteligência da polícia.
Na época, o lobista não era funcionário do Senado. A investigação da PF mostra Ferreira abrindo o gabinete de Efraim com a própria chave. Além disso, uma procuração registrada em cartório revela que o lobista passou uma procuração ao senador transferindo cotas de capital numa empresa de consultoria.
Ligação
O relatório final da Operação Mão-de-Obra pede para a Justiça enviar ao Supremo Tribunal Federal (STF) os indícios da ligação do primeiro secretário com as irregularidades. Segundo a conclusão policial, é preciso “apurar as eventuais responsabilidades do senador Efraim Morais”. “O mesmo (Efraim) supostamente estaria envolvido na organização criminosa de fraudar os procedimentos licitatórios junto ao Senado Federal”, diz a PF. O senador nega ligação com as fraudes.
Em agosto, o caso foi parar nas mãos do corregedor do Senado, Romeu Tuma (PTB-SP). Sem ouvir uma testemunha, ele o arquivou no começo de setembro num relatório de três páginas. Tuma foi pressionado a enterrar o assunto. Aliados de Efraim ameaçaram arrastá-lo para a crise, já que o corregedor era o primeiro-secretário em 2004, quando as empresas suspeitas fecharam contratos emergenciais com a Casa.
Sem qualquer “participação”
O advogado Eduardo Toledo, que defende Eduardo Bonifácio Ferreira, informou ontem ao Correio que não tinha conhecimento da representação criminal do Ministério Público Federal contra seu cliente. Ainda assim, o criminalista afirmou que Ferreira “não praticou nenhum ato no sentido de beneficiar empresários ou quem quer que seja em licitações realizadas pelo Senado Federal”. “Até porque, na época dessas licitações, ele já não era mais funcionário da Casa, não tendo qualquer acesso a informações dessas licitações.”
Perguntado sobre as relações que Ferreira manteria com o senador Efraim Morais, o advogado se limitou a dizer que “o relacionamento pessoal entre os dois nunca se confundiu com questões profissionais”. E finalizou: “Meu cliente nunca utilizou o nome do senador para solicitar informações junto a servidores públicos ou obter vantagens junto a empresários”.
Procurado por telefone, José Carvalho de Araújo, dono da Ipanema, não foi localizado nem na empresa nem em sua residência. Não retornou o recado deixado com um de seus funcionários em sua residência. A reportagem enviou, por e-mail, pedido de informação a Victor Cúgola, dono da Conservo, mas também não houve resposta até o fechamento desta edição. A Secretaria de Comunicação Social do Senado também foi acionada, mas não houve manifestação sobre o assunto.
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