PRESOS – PF DESBARATA SUPOSTO ESQUEMA MILIONÁRIO DE LAVAGEM DE DINHEIRO
Alessandra Pereira
Da equipe do Correio
São Paulo – Depois de uma investigação iniciada há quatro anos, a partir de desdobramentos do escândalo que tornou-se conhecido como mensalão, a Polícia Federal prendeu ontem o banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, o megainvestidor Naji Nahas, o ex-prefeito da capital paulista Celso Pitta e outras 14 pessoas, durante a Operação Satiagraha. Todos têm seus nomes ligados à participação em duas organizações criminosas que agiam de forma associada e fraudulenta no mercado financeiro. Eles devem ser indiciados sob as acusações de lavagem de dinheiro, corrupção, evasão de divisas, sonegação fiscal e formação de quadrilha.
Dantas, Nahas e Pitta tiveram prisão temporária decretada pelo juiz da 6ª Vara Federal Criminal
Na denúncia oferecida à Justiça, o MPF acusa o grupo do banqueiro Daniel Dantas de ter movimentado, entre 1992 e 2004, cerca de US$ 2 bilhões por meio do Opportunity Fund, uma offshore localizada no paraíso fiscal das Ilhas Cayman, no Caribe. Ao longo da investigação foram identificadas pessoas e empresas supostamente beneficiadas no esquema montado pelo empresário mineiro Marcos Valério para intermediar e desviar recursos públicos.
Tanto a PF quanto o MPF evitaram dar detalhes sobre investigações ainda
Cruzando todos os dados, os policiais concluíram tratar-se não de um grupo, mas de um grande esquema. “Essa organização criminosa tinha como seu líder o Daniel Dantas”, afirmou, em entrevista coletiva ontem à tarde, o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, responsável pelas investigações. “Nos deparamos, primeiramente, com um grupo de pessoas e, depois, com uma organização sofisticada e muito bem estruturada”, disse.
Mercado
Para burlar toda a legislação, a organização usava empresas de fachada, as laranjas e, para determinados negócios, associava-se a outra organização, comandada por Naji Nahas e formada por doleiros e empresários que supostamente atuavam no mercado financeiro para lavar dinheiro. Segundo a PF e o MPF paulista, os dois grupos praticavam fraudes no mercado de capitais valendo-se de informações privilegiadas. A organização de Nahas, segundo a PF, teria atuado também no mercado paralelo de moedas estrangeiras. Ainda de acordo com as investigações, haveria indícios de que o grupo recebia informações privilegiadas sobre a taxa de juros do Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano).
A ligação do economista Celso Pitta, ex-prefeito de São Paulo (1997-2000), nos esquemas, ainda está sob apuração. Por enquanto, o delegado Queiroz informa apenas que Pitta recebia recursos de Nahas, fazia “vultosas e freqüentes” retiradas de quantias. O delegado e os procuradores do MPF não informaram se já há uma conclusão sobre o dinheiro que seria recebido por Pitta. “Ainda não sabemos se era para seu uso pessoal ou se eventualmente pudesse ser repassado para terceiros com alguma finalidade específica”, respondeu Protógenes Queiroz.
“BUSCA DA VERDADE”
O nome escolhido pela Polícia Federal para batizar a operação que resultou na prisão do banqueiro Daniel Dantas do investidor Naji Nahas e do ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta é inspirado na história política da Índia. Satiagraha foi o termo usado pelo pacifista indiano Mahatma Gandhi durante sua campanha pela independência da Índia. Em sânscrito, “Satya” significa verdade. Já “agraha” quer dizer firmeza. Assim, Satyagraha é a “firmeza na verdade”, ou “firmeza da verdade”. Gandhi foi um dos idealizadores e fundadores do moderno Estado indiano e um influente defensor do Satiagraha (princípio da não-agressão, forma não-violenta de protesto) como um meio de revolução. Satiagraha também é freqüentemente traduzido como o caminho da verdade ou a busca da verdade. Historicamente, a atuação de Gandhi e seus conceitos também inspiraram gerações de ativistas democráticos e anti-racistas, como Martin Luther King e Nelson Mandela.
DANIEL DANTAS
Dono do grupo Opportunity, fundado em 1993.
Acusações – deve ser indiciado por crimes de lavagem de dinheiro, corrupção, evasão de divisas, sonegação fiscal e formação0 de quadrilha. Em virtude da suposta tentativa de subornar um delegado para tentar escapar da prisão, pode ser acusado também de corrupção ativa.
NAJI NAHAS
Megainvestidor, foi acusado de quebrar a Bolsa de Valores do Rio em 1989. Anos depois, foi absolvido pela Justiça.
Acusações – a principal acusação deve ser lavagem de dinheiro no mercado de capitais e evasão de divisas, além de sonegação fiscal, corrupção e formação de quadrilha.
CELSO PITTA
Economista, foi prefeito de São Paulo entre 1997 e 2000. Acusações – como participava ou se beneficiava dos esquemas ilegais, recebendo quantias em dinheiro, deve ser indiciado com base em acusações semelhantes às que recairão sobre Dantas e Nahas, como corrupção, sonegação e evasão de divisas.
AÇÃO CONTRA EMPRESÁRIO- BANQUEIRO PRESO É TRANSFERIDO PARA A SEDE DA POLÍCIA FEDERAL
Ricardo Miranda e Izabelle Torres
Da equipe do Correio
Rio de Janeiro – Mesmo num país acostumado às ações cinematográficas da Polícia Federal, onde operações com nomes estranhos misturam-se às prisões de muita gente conhecida e endinheirada, ver o poderoso banqueiro Daniel Dantas deixar preso sua cobertura de frente para o mar em Ipanema, Zona Sul do Rio, surpreendeu muita gente que caminhava ontem pelo calçadão da Avenida Vieira Souto. Um dos homens mais ricos do país, dono do grupo Opportunity, fundado há apenas 15 anos, Daniel Dantas foi preso no início da manhã, poucos meses depois de vender suas participações da Brasil Telecom e Telemar (Oi) por cerca de US$ 1 bilhão, no que ficou caracterizado como um dos maiores negócios do mercado de telecomunicações brasileiro.
Bem relacionado politicamente – foi conselheiro do antigo PFL (hoje DEM) e mantém amizades influentes no governo Lula -, com passagem por diversas instituições de peso – trabalhou na empreiteira Odebrecht e no Bradesco, dirigiu o Banco Icatu e foi sócio de Nizan Guanaes na agência de publicidade DM9 -, com um império montado em cima de fundos de pensão públicos, Dantas parecia intocável. Só parecia.
Segundo a Procuradoria da República no Estado de São Paulo, ao saber que seria preso, o empresário ainda teria usado dois prepostos, presos pela PF, para subornar um delegado federal, oferecendo R$ 1,2 milhão para que alguns nomes do inquérito policial fossem retirados. A tentativa de suborno foi revelada pelo delegado a um juiz, que autorizou que os contatos continuassem para garantir o flagrante de corrupção ativa. “O grupo chegou a dar R$ 129 mil (R$ 50 mil e depois R$ 79 mil) ao policial”, informa o comunicado do MPF. A outra parte do dinheiro foi apreendida ontem durante a ação policial em poder de Hugo Chicaroni, ligado a Dantas, segundo a PF. A Polícia Federal e o MPF informam que estão apurando ainda o vazamento de dados sigilosos do inquérito.
Comboio
Segundo o procurador da República Rodrigo de Grandis, do Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo, responsável pelas investigações, o objetivo do suborno seria “evitar que as investigações indicassem a participação de Dantas e de sua irmã, Verônica Dantas no esquema”. No início da tarde, depois de uma rápida escala na Superintendência da PF no Rio, Dantas foi levado num comboio com sete carros e um microônibus para o aeroporto rumo a São Paulo, onde ficará preso.
A operação começou no início da manhã, por volta das 5h30, quando cerca de 20 agentes da PF, em cinco carros, dividiram-se entre as sedes do Banco Opportunity e da Brasil Telecom, na Avenida Presidente Wilson, no Centro do Rio, onde realizaram varreduras e apreenderam computadores e pastas com documentos. Quase ao mesmo tempo, a PF chegou às residências do banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, e de diretores do banco. Todos foram presos.
Entre os diretores e executivos do Opportunity também foram presos, segundo fontes policiais: Verônica Dantas, irmã e sócia de Dantas; Arthur Carvalho, cunhado e braço direito de Daniel Dantas; Dório Ferman, um dos mais antigos colaboradores do banqueiro e que cuidava do asset (gestão de recursos) do Opportunity; Eduardo Penido, que trabalhava com Dório; Danielle Silbergleid, diretora-jurídica do banco; Maria Amália Coutrim, diretora do banco e há mais de 10 anos trabalhando com Dantas; e Humberto Braz, ex-presidente da holding da Brasil Telecom e ex-lobista da construtora Andrade Gutierrez.
Habeas corpus
Daniel Dantas já temia a prisão. No dia 28 de maio entrou com um pedido de habeas corpus preventivo no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O pedido foi negado pelo relator Arnaldo Esteves Lima, alegando ausência de fatos concretos que justificassem a ação. Diante da derrota, a defesa de Dantas entrou com o mesmo pedido no Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 11 de junho. Desde então, pouca coisa evoluiu no processo. O ministro-relator, Eros Grau, apenas pediu informações à 6ª Vara da Justiça Federal sobre as acusações que já constavam no órgão e pediu parecer ao Ministério Público sobre o caso. O procurador-geral ainda não se posicionou.
Diante da demora no julgamento e da iminência da prisão, a defesa do empresário apresentou na semana passada dois requerimentos para que o ministro Eros Grau marcasse a data para apreciação da matéria. Tudo
Único a se pronunciar, Nélio Machado disse, na porta da PF no Rio, que a prisão de seu cliente foi ilegal, irregular e anunciada. Nos ataques contra o que chamou de um tratamento pior do que aquele que se concedia no tempo do AI-5, Machado chegou a afirmar que as operações da PF ainda não prenderam integrantes do PT. “Eu o tenho (Dantas) como pessoa de bem e acredito que a acusação tem um componente de vingança, de natureza medieval, porque a cabeça dele tem sido oferecida a prêmio, não é de agora”, insinuou Nélio.
E acrescentou: “Daniel Dantas é um empresário reconhecido por sua competência. Tem um trabalho feito em favor do país, gerando empregos, mas o que eu percebo é que ele vem sendo estigmatizado, não de agora, como se ele fosse artificialmente transformado em uma espécie de inimigo público. E não é de agora que pretendem praticar uma violência contra ele. E acabaram hoje, pelo visto, consumando-a. A Justiça pode tardar, mas ela acaba prevalecendo”. Ele disse desconhecer qualquer ligação entre o seu cliente e os demais detidos pela operação da PF, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e investidor Naji Nahas. O Palácio do Planalto nega qualquer ação política na prisão dos envolvidos. Destaca que a PF é independente tanto que até investigou o irmão mais velho do presidente Lula, Genival Inácio da Silva.
Chacal
Dantas já respondia à ação penal decorrente da Operação Chacal, deflagrada pela PF em setembro de 2004. Foi acusado de ter praticado os crimes de violação de sigilo de informação reservada e corrupção, ao contratar a empresa Kroll para ter acesso a dados de pessoas e empresas em órgãos públicos, os quais são considerados reservados.
Os laudos periciais obtidos na Operação Satiagraha indicam que o grupo de Dantas teria cometido crime de evasão fiscal de divisas por meio do Opportunity Fund, uma offshore no paraíso fiscal das Ilhas Cayman, no Caribe. O fundo teria movimentado quase US$ 2 bilhões entre 1992 e 2004. As investigações que deflagraram a operação da PF são decorrentes de informações enviadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para atender requerimento do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, no processo conhecido como Mensalão. O site do Opportunity colocou ontem no ar um comunicado seco: “Informamos que as operações de nossos fundos de investimento estão funcionando normalmente. Em caso de dúvidas, entre em contato conosco”.
PRESIDENTE DO STF CONDENA “ESPETACULARIZAÇÃO” – PARA GILMAR MENDES, “FOI UMA ATUAÇÃO TOTALMENTE INCOMPATÍVEL COM O ESTADO DE DIREITO”
Izabelle Torres
Da equipe do Correio
Carlos Moura/CB/D.A Press – 19/5/04
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, criticou os métodos utilizados pela Polícia Federal. O alvo foi a operação Satiagraha, que prendeu o empresário Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta, entre outros. Segundo ele, os policiais fizeram “espetacularização” das prisões e mais uma vez praticaram o uso abusivo de algemas. “Foi uma atuação totalmente incompatível com o Estado de Direito”, opinou.
Mendes também criticou o pedido feito pela Polícia Federal para prisão da jornalista Andréa Michael da Folha de S. Paulo, sob a justificativa de que ela teria publicado relatos sobre as investigações antes de os policiais a terem deflagrado. Para o presidente do Supremo, o pedido suscita inúmeras indagações e representa verdadeiro abuso do instrumento da prisão preventiva. Ainda bem que o juiz negou. Se tivesse aceitado seria um absurdo. Temos nesse caso outro desdobramento: a tentativa de prender um jornalista por revelar uma informação. Isso faz inveja ao regime soviético, comentou o presidente.
Habeas corpus
Logo depois de conceder a entrevista na qual criticou os métodos usados durante a operação, o presidente Gilmar Mendes recebeu uma ação d a defesa do empresário Daniel Dantas. Nela, os advogados do banqueiro cobram o julgamento imediato do habeas corpus preventivo pedido ao Supremo há 40 dias. O caso tinha como relator o ministro Eros Grau, que não chegou a decidir. Como o STF está em recesso, o próprio Gilmar assumiu o processo. Até o fechamento desta edição, ele não tinha dado seu despacho. O presidente do Supremo deve julgar hoje o pedido apresentado pela defesa de Daniel Dantas, que inclui também sua irmã, Verônica Dantas.
Além do julgamento da liminar, o advogado Nélio Machado pede a permissão para que a defesa de Dantas tenha acesso ao inquérito policial que tramita na 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo. No processo, o advogado alega que um pedido semelhante fora negado anteriormente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) porque o ministro Arnaldo Lima entendeu não haver justificativas para a concessão do instrumento, visto a inexistência de ameaça iminente de prisão. “Pois bem, concretizaram-se as ameaças que vinham sendo noticiadas na imprensa e que foram utilizadas pelos impetrantes para fundamentar a pretensão deduzida nos diversos habeas corpus”, diz o texto.
Polícia
As críticas do presidente do Supremo à conduta da Polícia Federal são corriqueiras. Na semana passada, Gilmar Mendes chamou de gângsteres os policiais que incluem de forma irresponsável nomes de autoridades nos vazamentos de informações referentes a investigações em andamento.
Para intensificar a ofensiva contra a PF, o presidente articula a edição de uma nova legislação tratando de abuso de autoridade, que inclua a divulgação de dados de uma investigação em andamento na lista de ilícitos criminais. A lei atualmente em vigor data de 1965 e foi editada durante o governo Castelo Branco.
Interesse público
A Polícia Federal pediu à Justiça a prisão da jornalista Andréa Michael, do jornal Folha de S. Paulo, por vazamento de informação sigilosa. Além da prisão da jornalista, foram solicitadas busca e apreensão de documentos na casa da repórter, que trabalha na sucursal da Folha
Em nota, o jornal rebateu qualquer insinuação de que o comportamento da repórter não tenha sido correto. “A repórter apurou fatos de notório interesse público relatados em texto publicado pela Folha em abril passado, no qual se noticiava que a PF preparava a operação desencadeada hoje (ontem). Cabe às autoridades competentes manter informações desse tipo em sigilo”, afirmou o comunicado.
Greenhalgh sob suspeita
Alessandra Pereira
Da Equipe do Correio
São Paulo – Para o Ministério Público Federal (MPF-SP), o ex-deputado federal pelo PT e advogado Luiz Eduardo Greenhalgh também deveria estar preso. Ele é apontado como um suposto elo entre a organização criminosa que seria comandada pelo banqueiro Daniel Dantas e os poderes Executivo e Legislativo. Por conta das suspeitas, os procuradores pediram prisão temporária e mandados de busca e apreensão para a residência e o escritório de Greenhalgh. A Justiça negou.
Segundo o procurador da República Rodrigo de Grandis, o ex-deputado e Guilherme Sodré, que seria próximo a Dantas, teriam agido de forma irregular. “Foi detectado no curso das investigações que essas duas pessoas atuavam junto ao Poder Executivo e ao Parlamento brasileiro, funcionando como um elo entre a organização, o Executivo, a Câmara, o Senado Federal”, disse o procurador.
Segundo Grandis, quando houve “vazamento criminoso” a respeito do trabalho da PF (por meio de matéria no jornal Folha de S. Paulo), a organização de Dantas tentou descobrir detalhes sigilosos sobre o caso: “É aíque entra o Luiz Eduardo Greenhalgh. Ele participa dessa, digamos, articulação, no sentido de descobrir onde é que está o procedimento, qual o delegado encarregado e demais circunstâncias. Tudo o que, por natureza e por determinação legal, é sigiloso.” Ainda segundo o procurador, para obter as informações, Greenhalgh teria usado de influência e contatos no governo federal.
Em nota oficial, Greenhalgh esclareceu desconhecer as razões pelas quais seu nome foi envolvido no caso. Ele afirmou não ter tido acesso aos autos. “Fui contratado por Daniel Dantas para assisti-lo na qualidade de advogado criminalista, atividade que exerço há mais de 30 anos. Atuei na defesa de meu cliente nos estritos marcos da legalidade e da ética profissional”, disse.
PREOCUPAÇÃO NO CONGRESSO – TEMOR ATINGE PARLAMENTARES DA BASE DO GOVERNO E DA OPOSIÇÃO QUE TÊM LIGAÇÕES COM O GRUPO OPPORTUNITY
Leandro Colon e Daniel Pereira
Da equipe do Correio
Ontem, o telefone do ministro da Justiça, Tarso Genro, não parou de tocar. Do outro lado da linha, parlamentares de alto calibre da oposição e da base do governo buscavam informações sobre a operação da Polícia Federal que prendeu, entre outros, o banqueiro Daniel Dantas.
São políticos que se aproximaram dele no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e na gestão atual, do petista Luiz Inácio Lula da Silva. Pegos de surpresa pela operação da PF que prendeu o dono do Opportunity, os partidos agora não querem assistir aos seus líderes envolvidos com o personagem central da investigação.
“O caso deixou todo mundo preocupadíssimo. Ninguém sabe direito o
motivo das prisões, e o Dantas tem relação com o governo pelo menos desde as privatizações no setor de telecomunicações”, diz um parlamentar petista de bom trânsito com colegas de PSDB e DEM. “A gente não sabe no que vai dar a operação”, acrescenta.
Nas conversas por telefone, Tarso Genro aumentou ainda mais a dúvida dos parlamentares. Ele descartou qualquer relação da operação da PF com o esquema do mensalão e reafirmou a versão oficial de que a apuração policial tem tentáculos que passam a largo do esquema de compra de votos que foi alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso em 2005. Ou seja, esclareceu pouco para quem não esconde o temor pelo o que pode vir pela frente.
“Do que li sobre as investigações, trata-se de um caso de espionagem industrial, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O governo está tranqüilo”, declara um ministro, descartando, ao menos por enquanto, uma relação direta com o mensalão. A oposição está preocupada porque alguns de seus líderes são ligados a Dantas desde o governo de Fernando Henrique, quando o banqueiro começou a mostrar sua força na privatização das telefonias.
Ontem à tarde, o senador Heráclito Fortes (DEM-PI) telefonou para um filho de Carlos Rodenburg, preso na operação da PF. Ex-cunhado de Dantas, Rodenburg é diretor do banco Opportunity, o carro-chefe dos negócios do polêmico banqueiro. Amigo de Dantas e Rodenburg, Heráclito queria detalhes da operação. Publicamente, o senador evitou comentar a ação da polícia. “Ainda preciso entender o que está acontecendo”, afirmou. Heráclito afirmou que não conversou com o ministro Tarso Genro.
Relações com o governo
O pedido de prisão do ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT) assustou os governistas. Dantas se aproximou de interlocutores do Palácio do Planalto depois que foi afastado do controle da Brasil Telecom no primeiro mandato do presidente Lula. O banqueiro queria o apoio de integrantes do governo para retomar o poder na empresa de telefonia.
A CPI dos Correios, por exemplo, o acusa em seu relatório final de usar o publicitário Marcos Valério como ponte com o comando do PT. Empresas de Dantas contrataram as agências de Valério. Um dinheiro que, segundo o relatório da comissão, chegou a mãos de políticos.
Outros casos
Ontem não foi a primeira vez que o ministro da Justiça teve que conversar com parlamentares sobre uma operação da PF. Em abril, Tarso foi procurado pelos deputados Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Os dois queriam informações sobre a inclusão de seus nomes na ação policial denominada Santa Tereza que desmontou um esquema de desvio de dinheiro em empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Paulinho é acusado de receber dinheiro desviado do banco e, por isso, sofre um processo por quebra de decoro na Câmara dos Deputados. O parlamentar cobrou de Tarso Genro sua citação no caso. Ontem, a conversa foi outra: deputados e senadores tentaram sondar o ministro sobre eventual envolvimento na investigação em torno do banco Opportunity.
Investigadores surpresos
Leandro Colon e Izabelle Torres
Da equipe do Correio
Pouco mais de dois anos depois do fim da CPI dos Correios, seus integrantes reagiram com surpresa à operação da Polícia Federal que prendeu o banqueiro Daniel Dantas. Avaliaram, no entanto, que isso fortaleceu os trabalhos que investigaram o esquema do mensalão e as relações do dono do Opportunity com integrantes do alto escalão do governo.
O relatório final aprovado pela CPI dedica pouco mais de 15 páginas à atuação de Dantas. A comissão de inquérito afirma que ele usou o publicitário Marcos Valério para conseguir força política no governo em torno de suas pretensões de retomar o controle da Brasil Telecom. “O Marcos Valério servia para isso e ele, em troca, contratava empresas do Valério”, disse ontem o relator daquela CPI, o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR).
A comissão de inquérito começou desacreditada, com a expectativa de ser a favor do governo. Pressionados, os parlamentares mudaram o curso da investigação e aprovaram um relatório que incomodou o Palácio do Planalto.
Segundo a CPI, a relação entre Daniel Dantas e Marcos Valério “extrapolaria” os interesses privados. Principalmente porque Valério assumiu, em depoimento aos parlamentares, que intermediou um encontro entre o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, com Carlos Rodenburg, braço-direito de Dantas no Opportunity que também foi preso ontem pela PF.
As empresas de telefonia controladas por Dantas fizeram contratos milionários com as duas empresas de publicidade de Valério, a DNA Propaganda e a SMP&B. “Dantas não mediu esforços e canalizou recursos das citadas empresas para as de Valério, que os distribuiu entre seus interlocutores com o intuito de ajudar Dantas”, afirma o relatório da CPI. “A proximidade do sr. Dantas e de seu grupo com os srs. Marcos Valérios e Delúbio Soares tinha o objetivo de persuadir e pressionar políticos”, ressalta o documento.
Processo no STF
Depois de passar nove meses parada, a ação penal que investiga o envolvimento dos 39 participantes do esquema do mensalão voltou a caminhar no último 20 de junho, depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) negou oito recursos apresentados pelos réus contra a aceitação das denúncias.
Na semana passada, o relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, enviou oito cartas de ordem autorizando as justiças de primeira instância do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Paraná a iniciarem a tomada de depoimentos de 500 testemunhas indicadas pelos acusados e pelo procurador-geral, Antonio Fernando de Souza.
No mês passado, o relator do caso autorizou a Polícia Federal a ter acesso a detalhes das operações financeiras realizadas entre a Eplo Trading e Marcos Valério. A suspeita é de que a empresa tenha lavado dinheiro para o esquema montado pelo empresário. Segundo a Polícia Federal, as irregularidades resultaram na instauração de um inquérito policial porque os fatos não foram incluídos na denúncia apresentada ao STF pelo Ministério Público Federal.
Memória
As conclusões da CPI dos Correios
As empresas do publicitário Marcos Valério foram o elo entre as fontes financiadoras e os políticos beneficiários do esquema do mensalão, que repassou dinheiro de caixa 2 para partidos e parlamentares da base aliada do governo Lula. Entre as fontes, estariam empresas ligadas a Daniel Dantas.
Empresas de telefonia então controladas por Dantas, por meio do Banco Opportunity, fizeram contratos milionários com as agências de DNA Propaganda e SMP&B, ambas de Valério.
A relação entre Valério e Dantas estava além da rotina profissional. Para a CPI, o contato entre os dois extrapolava “a linha de interesses privados e os interesses de ordem pública”.
Com a remoção do controle da Brasil Telecom após irregularidades cometidas com recursos dos fundos de pensão, Daniel Dantas não “mediu esforços” para canalizar recursos para as empresas de Marcos Valério. O publicitário teve a função de repassar parte disso para “interlocutores” ligados ao Palácio do Planalto que poderiam ajudar Dantas a retomar o poder da empresa de telefonia.
Marcos Valério confirmou que intermediou encontros entre Delúbio Soares, então tesoureiro do PT, e Carlos Rodenburg, diretor do Opportunity e ex-cunhado de Dantas preso na operação da PF.
A proximidade de Dantas com Valério e Delúbio tinha o objetivo de pressionar políticos e dirigentes de fundos de pensão para que ele não fosse removido do controle da Brasil Telecom.
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