TÚNIS, Tunísia. Imagine se, durante cinco dias, ninguém conseguisse se comunicar com a Receita Federal pela internet. Na teoria, bastaria o governo dos Estados Unidos querer e o endereço eletrônico www.receita.fazenda.gov.br sairia do ar. Essa discussão sobre quem controla o que na Internet transformou-se no principal tema da cúpula mundial da Sociedade de Informação, que começa hoje na Tunísia.
Muitos países — entre os quais Brasil, Índia, China e, mais recentemente, os 25 membros da União Européia — acham que é hora de acabar com o monopólio americano. Mas os EUA, mesmo isolados, insistiam em manter tudo do jeito que está.
Tudo indicava que, depois de anos de negociações, não haveria consenso, e a cúpula — patrocinada pela ONU — seria um fracasso. Mas no fim do dia de ontem, as delegações governamentais pareciam estar chegando a um acordo. Os EUA aceitariam a criação de um fórum internacional para discutir a governança da internet, desde que este fórum não tivesse poder de decisão.
— Comparada com a posição dos Estados Unidos, dois anos atrás, é um avanço monumental — disse o embaixador Antonino Marques Porto, diretor do Departamento de Temas Científicos e Tecnológicos do Itamaraty.
Se houver acordo, o fórum se reunirá pela primeira vez na Grécia, em 2006. Nele serão discutidos vários temas relacionados à governança da internet, entre eles, como combater os crimes cibernéticos. Também provoca polêmica a administração dos nomes e números da maior rede mundial de computadores, a cargo da Icann — empresa sem fins lucrativos, com sede na Califórnia, e que responde ao Departamento de Comércio americano.
Cabe à Icann organizar os endereços da internet — tanto os domínios de 248 países (os do Brasil terminam em br), como os 14 domínios genéricos (.com, .gov, entre outros). A empresa foi criada em 1998 pelo governo de Bill Clinton, que prometeu abrir a questão da governança a uma maior participação internacional a partir de 2006. Mas seu sucessor, George Bush, prefere deixar tudo como está.
— Para que perder tempo e dinheiro, discutindo algo que já está resolvido, quando existem outros temas mais importantes, como o acesso dos mais pobres à internet? — disse um dos negociadores americanos.
Problemas financeiros e políticos com endereços
Não é tão simples assim, diz Rogélio Santanna, secretário de Logística e Tecnologia da Informação. Segundo ele, as decisões do Icann nem sempre são tão técnicas. Como exemplo, ele citou a proposta da empresa de criar o domínio genérico .xxx para agrupar tudo relacionado ao sexo.
— Para cada nome registrado neste domínio o Brasil teria que pagar US$ 50 anuais. Se não, perderia o direito ao nome.
Além do aspecto financeiro, existe também o político:
— O Brasil e outros foram contra a criação do domínio .xxx. Os EUA também, o que levou a Icann a rever sua posição. Se os EUA tivessem sido favoráveis, será que a empresa teria mudado de opinião?
Os debates continuarão hoje. Mais de 20 mil representantes de governos, empresas tecnológicas e ONGs se reunirão sob forte esquema de segurança. A Tunísia não quer correr riscos: a Jordânia e o Paquistão sofreram, nos últimos dias, atentados de fundamentalistas islâmicos e muitos no mundo árabe não estão satisfeitos com a presença da delegação de Israel. A Tunísia, por sua vez, é criticada por censurar a internet e perseguir jornalistas.
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16
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