Polícia Federal fiscaliza as fronteiras do país e acredita que Michelli Tocci esteja no Brasil. Outros envolvidos serão presos a qualquer momento. Marco Antônio Gorayeb se recusou a prestar depoimento.
Leia abaixo, matéria na íntegra
TRÁFICO
Polícia caça o barão do ecstasy
Agentes das divisões de Operações Especiais (DOE) e contra o Crime Organizado (Deco) da Polícia Civil do Distrito Federal e equipes da Polícia Federal seguem várias pistas – não reveladas – da possível localização do líder da quadrilha de distribuição de ecstasy, que começou a ser desmontada na semana passada com a prisão de sete integrantes brasilienses e do líder da organização internacional de tráfico de drogas sintéticas. O publicitário Michelli Tocci, 33 anos, está foragido desde a madrugada de quarta-feira, depois de escapar do cerco policial na BR-020, a 120 km de Brasília. A organização levava cocaína para a Europa e a Ásia e trazia para vender no país drogas sintéticas como ecstasy, LSD e skank, escondidos, em boa parte dos casos, em pranchas de surfe e equipamentos para a prática de esportes radicais.
De acordo com o coordenador-geral da Polícia de Repressão a Entorpecentes da PF, Ronaldo Urbano, as fronteiras já foram avisadas, mas a polícia acredita que Tocci continua no Brasil. “Todos os agentes que atuam nos pontos de saída estão em alerta. Estamos de olho nos aeroportos, em especial, nos vôos com destino à Itália”, informa. Filho de um ex-funcionário da Embaixada da Itália, Tocci teve a prisão temporária decretada no início da semana. A polícia estima que o grupo por ele liderado negociava mais de 600 comprimidos de ecstasy por mês.
Até agora sete brasilienses foram presos. O último capturado, o surfista Marco Antônio Gorayeb, 42 anos, chegou sábado a Brasília, transferido de Fernando de Noronha, onde foi preso. Conduzido à Deco, ele não quis prestar depoimento. Se reservou ao direito de falar apenas em juízo. Os delegados que conduzem as investigações preferem não revelar se há outros integrantes sob investigação e nem suas identidades, mas não descartam a possibilidade de decretar a prisão de novos envolvidos no esquema no DF e em outros estados. “Eles fazem parte de uma organização internacional onde os participantes têm várias funções, que eram trocadas para dificultar a ação da polícia. Tudo o que fazem é por meio de fraudes, como a compra de passagens aéreas, adquiridas sempre com cartões clonados. Tem muita gente dando suporte ao tráfico”, explica Miguel Lucena, diretor da Divisão de Comunicação Social da Polícia Civil do DF.
Elo de ligação
A prisão de Tocci é considerada uma das mais importantes pela polícia não só porque é o líder da ramificação de Brasília. “Ele é o elo de ligação com o chefe do esquema (Dimitrius Papageorgiou) preso na semana passada. Com a prisão dele, vamos poder definir como funcionava a distribuição da droga no país. Tocci certamente tem algo a acrescentar na investigação”, acredita Ronaldo Urbano. “Ele organizava e financiava a exportação e importação da droga”, acrescenta.
Segundo Urbano, um integrante da quadrilha chefiada pelo publicitário foi preso em 2001 com um carregamento com cerca de 600 a 800 comprimidos de ecstasy. Desde a época, a polícia investiga a quadrilha de tráfico internacional (leia detalhes do esquema abaixo). “Estamos desmontando uma das maiores organizações de tráfico de drogas sintéticas do país.”
Ainda de acordo com Urbano, o publicitário ajudava Dimitrius a enviar cocaína para Holanda, onde era feita a troca por drogas sintéticas, e a recrutar “mulas” – que fazem o transporte. Estes jovens aliciados eram de classe média alta, quase sempre praticantes de esportes radicais, como o surfe. Ao todo, informou o delegado, cerca de 50 pessoas foram presas nos últimos 15 meses no país, alguns componentes com a ajuda das polícias australiana e holandesa.
O coordenador da PF informa ainda que intensificou o combate ao tráfico de drogas sintéticas por causa do crescimento do consumo deste tipo de substância no país. Cocaína e maconha ainda lideram a lista de apreensões de drogas da polícia, mas deixaram de ser a preferência dos moradores de alto poder aquisitivo, como ocorre em Brasília, um dos grandes mercados consumidores, segundo a polícia. “Brasília tem um mercado cativo de substâncias sintéticas quase no mesmo nível das drogas naturais”, informa Urbano.
O consumo desses produtos, bem mais caros, triplicou nos últimos três anos. Só de ecstasy, os agentes federais apreenderam mais de três mil comprimidos entre 2003 e 2004. Cada unidade pode custar ao usuário até R$ 70. O delegado da PF diz ainda que a quadrilha movimentava muito dinheiro, mas não soube calcular o montante. Mas a Deco, que conduz as investigações em Brasília, informa que o braço no DF movimentava R$ 500 mil por mês com a venda de comprimidos de ecstasy importados da Holanda.
Entenda o caso
A INVESTIGAÇÃO
De acordo com a Polícia Federal, a organização internacional começou a ser investigada em 2001, quando recebeu uma importação de 600 a 800 comprimidos de ecstasy. A descoberta do carregamento foi graças a uma ação conjunto entre a PF e a polícia holandesa. Durante a apuração, os agentes descobriram uma grande rede de distribuição de drogas sintéticas em Brasília, que passou a ser monitorada, em 2003, pela Divisão de Combate ao Crime Organizado (Deco) da Polícia Civil do Distrito Federal. Com as ações locais acompanhadas de perto, a PF passou a investir na apuração do esquema internacional, com negócios em outros estados, como São Paulo e Santa Catarina. Na apuração, a polícia descobriu que os integrantes costumavam aliciar jovens para fazer o transporte. Eram geralmente surfistas, praticantes de vôo livre ou de outros esportes radicais, com o domínio de um segundo idioma e filhos de classe média alta. Os produtos ilícitos são distribuídos em festas de Brasília desde 2001.
O ESQUEMA
Na investigação, conduzida pela Deco, descobriu-se que o grupo brasiliense viajava a cada 15 dias até Amsterdã, na Holanda, para levar a cocaína. Lá, a droga funcionava como moeda de troca para trazer ecstasy, haxixe e skank (derivados da maconha). Para fazer o transporte ao Brasil, os envolvidos costumavam ingerir a droga ou escondê-la em objetos na mala, como frascos de xampu, dentro de pranchas de surfe, de windsurfe ou entre equipamentos de vôo livre. A cocaína que chegava para a quadrilha em Brasília vinha de São Paulo, mas a polícia não descobriu a rota da droga. Há informações de que a substância vinha de carro da Colômbia, Bolívia, Peru e Paraguai. Na capital paulista também tinha uma pessoa, mencionada no inquérito apenas pelo apelido de “Cabeludo”, como o responsável pela compra de passagens áreas, adquiridas sempre por meio de cartões de crédito clonados. O bando conta, ainda, com ajuda de alguém na Europa, que ficava responsável pela hospedagem e viagens das “mulas” – pessoas escaladas para o transporte do ecstasy ou outras drogas. Existe a suspeita de que este integrante seria o elo entre os brasileiros e os traficantes europeus. O grupo também fazia viagens aos estados de Santa Catarina, São Paulo e Bahia. Parte delas, em carros de luxo. As despesas de viagem (como alimentação, transporte e hospedagem) ficavam por conta da quadrilha.
AS RAMIFICAÇÕES
O grupo de Brasília sempre mantinha contato com outra quadrilha da organização internacional de distribuição de ecstasy em São Paulo. O elo de ligação entre o líder do bando paulista, o carioca Dimitrius Papageorgiou, de 36 anos, preso quarta-feira, é o publicitário Michelli Tocci, 31 anos, que comandava a quadrilha de Brasília. Ele ainda está foragido. Foi a quadrilha de Dimitrius que mandou para a Indonésia o brasileiro Rodrigo Gularte, 32, condenado à morte por tráfico de drogas no país. Gularte foi preso em julho do ano passado no Aeroporto Internacional de Jacarta com seis quilos de cocaína escondidos dentro de pranchas de surfe. O grupo também é responsável pelo aliciamento de jovens presos nos últimos meses em Frankfurt, Paris, Amsterdã e Lisboa. Eles eram recrutados com a promessa de receberem dois mil euros (cerca de R$7 mil) para cada quilo de cocaína transportado.
AS PRISÕES
A Justiça expediu mandado de prisão no início da semana passada por associação ao tráfico (três a dez anos de prisão). As prisões foram desencadeadas na noite de terça-feira, depois que a polícia recebeu informação de que Sandra Gorayeb , 36 anos, chegaria a Brasília com a droga. Ela foi flagrada ao desembarcar no aeroporto com 800 gramas de haxixe e 2,5 quilos de skank e 46 gramas de MDMA (princípio ativo do ecstasy) em pó, um total de US$ 40 mil em drogas. Até às 6h de quarta, ocorreram mais cinco prisões. Augusto César de Almeida, 32, foi localizado na Lagoa da Conceição, em Florianópolis (SC). Marcelo Maghenzani, 29, estava no Jardim Paulista, bairro nobre de São Paulo. O empresário Leandro Caetano Pompeo, o professor de inglês Wladimir Bilotta Duarte, 33, e o estudante de Direito Ricardo de Paranaguá Piquet Carneiro, 33, foram presos em Brasília. Com os integrantes da quadrilha em Brasília foram apreendidos dois carros importados: uma Pajero Mitsubishi e um Audi. O surfista e irmão de Sandra, Marco Antônio Gorayeb, 42, foi preso em Fernando de Noronha e está desde o final da tarde de sábado em Brasília. Com a prisão de sua irmã, todo o grupo passou a responder pelo flagrante do tráfico de drogas (três a 15 anos de prisão), com pena podendo ser acrescida em dois terços, pela configuração de tráfico internacional. Na quarta-feira, a polícia capturou o carioca Dimitrius Papageorgiou, 36, que também tem nacionalidade grega. Ele é acusado de comandar uma quadrilha no país. No mesmo dia, a PF localizou, em Florianópolis, mais dois integrantes do esquema: Temístocles Emanuel da Silva, 28, e Rodolfo dos Santos Felício, 27.
Fonte: Correio Braziliense
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