Fonte: Sindicato dos Policiais Federais no Rio de Janeiro
Em paralisação de 24 horas, policiais federais ocuparam as principais avenidas do Centro do Rio de Janeiro hoje para protestar contra a desvalorização da carreira e o modelo de investigação no Brasil que, segundo eles, favorece a impunidade e privilegia os delegados. Com faixas como “Agentes federais, os heróis anonymous da população”, cerca de 300 escrivães, papiloscopistas e agentes (EPAs) fizeram uma passeata da Praça Mauá, na Zona Portuária, até a Assembleia Legislativa (Alerj), onde foi realizada uma audiência pública para discutir a grave crise institucional na Polícia Federal.
Um elefante branco inflável, simbolizando o inquérito policial – ferramenta considerada ultrapassada para elucidar os crimes, segundo eles -, acompanhava a manifestação. O trânsito foi interditado em meia pista e a passeata foi acompanhada por duas viaturas da Polícia Militar e uma da Guarda Municipal. Foram distribuídos panfletos à população, explicando os motivos do movimento. Os manifestantes foram aplaudidos nas ruas e muitos motoristas acionaram suas buzinas em solidariedade. Nas escadarias da Alerj, os policiais soltaram balões pretos e amarelos – as cores da PF .
“Apenas 4% das investigações na Polícia Federal se transformam em denúncias do Ministério Público e os criminosos são condenados. O resto é só papel”, explicava o vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Luiz Antônio Boudens. Segundo ele, no Rio de Janeiro, menos de 10 em cada 100 casos de homicídios são esclarecidos em função da morosidade e burocracia do inquérito policial. Para os policiais federais, a mudança no atual modelo de investigação é fundamental para um novo sistema de segurança pública, mais moderno e eficiente.
A paralisação desta segunda-feira foi deflagrada em protesto contra a precariedade de serviços sociais e de saúde no DPF, o assédio moral e o alto índice de doenças psíquicas dentro da corporação, além do veto presidencial ao Projeto de Lei (PL) 244, que reconhece o papiloscopista como perito. A audiência pública discutiu os graves problemas que têm contribuído para uma queda na produtividade da PF, reduzindo as operações policiais, comprometendo o combate à corrupção e até mesmo ameaçando a segurança de grandes eventos no País.
Denúncias de assédio moral e perseguição
Na audiência pública, o presidente da Federação, Jones Borges Leal, fez uma ampla abordagem sobre os principais problemas que afligem os policiais federais. “A atividade policial é a segunda mais estressante do mundo, só perdendo para os mineradores, mas nem lá tantos se matam”, disse ele, referindo-se ao alto índice de suicídios entre os federais – foram 12 casos nos últimos três anos.
A presidente do Sindicato dos Servidores do Departamento de Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro (SSDFPF/RJ), Valéria Manhães, apresentou a denúncia de perseguição contra um agente federal que participou legitimamente da greve da categoria no ano passado e agora foi denunciado por um delegado ao Ministério Público.
“O colega pode ser preso e até demitido por ter exercido seu direito constitucional de servidor de aderir à greve”, disse Valéria. Segundo Valéria, o agente foi denunciado por um delegado, embora sua participação não prejudicasse os 30% do efetivo mínimo em seu setor. Na época, lembrou, havia também o compromisso expresso do Ministério da Justiça de não punir os grevistas.
“Venderam a imagem de que somos o FBI brasileiro. Mas o índice de suicídios no DPF é o mais alto entre as polícias no mundo. Os policiais federais estão desmotivados, não têm perspectivas para continuar na carreira. A cada ano, cerca de 200 deixam a corporação. É uma fuga de talentos. Cada um custa de R$ 80 mil a R$ 100 mil aos cofres do Governo”, completou Valéria.
Apoio de parlamentares e promotores
Convocada pelo deputado Iranildo Campos (PSD), presidente da Comissão de Segurança Pública e Assuntos de Polícia da Alerj, a audiência lotou a sala de audiências da casa e durou mais de duas horas. O objetivo era ouvir as lideranças sindicais que representam os policiais federais, com objetivo de apoiar o movimento também em âmbito estadual.
Um dos convidados, o deputado federal Otoniel Lima (PRB-SP), coordenador da recém-criada Frente Parlamentar pela Reestruturação da Polícia Federal, na Câmara dos Deputados, disse que a intenção é realizar outras audiências nas assembleias legislativas dos demais estados para fortalecer o movimento e buscar apoio para um amplo projeto de reforma da segurança pública, a ser apresentado no Congresso Nacional.
O procurador-chefe do Ministério Público Federal no Rio, Guilherme Raposo, que também participou da audiência, disse que apoia a reformulação no modelo de investigação atualmente vigente hoje. “É preciso rever as estruturas de investigação, desburocratizar o inquérito. Não basta dar melhoria salarial ou aumentar o efetivo”, disse, ao propor que a mesma mobilização que culminou na derrubada da PEC 37 ocorra agora, em torno do atual modelo de investigação.
Presentes à audiência, o deputado estadual Flávio Bolsonaro e o deputado federal Eurico Júnior também prometeram empenho na mobilização para que projetos de interesse dos policiais federais sejam pautados. ”Continuem investigando empresários, políticos. Não desanimem, nós precisamos de vocês”, encerrou o deputado Iranildo Campos.
Paralisação – De acordo com o Sindicato, a adesão à paralisação desta segunda-feira foi de 60%, sem prejuízos à população. Os serviços essenciais foram mantidos integralmente, além do efetivo mínimo de 30% para garantir o atendimento ao público, como previsto em lei.
A previsão é que esta seja a primeira de uma série de paralisações da Polícia Federal em todo o País – outros estados também deverão realizar paralisações nas próximas semanas, dentro do calendário nacional de mobilização, previsto pela Fenapef.
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