Projeto que veta candidaturas de condenados pela Justiça é aprovado no plenário da Câmara. Para valer em outubro, depende do Senado
Ivan Iunes
O Senado terá pouco mais de um mês para aprovar o projeto da Ficha Limpa a tempo de a regra ter chances jurídicas de valer para as eleições de outubro. As últimas tentativas de alteração da proposta, que estabelece pena de inelegibilidade para políticos com condenação judicial, foram rejeitadas pela Câmara ontem. O texto (1)do relator, José Eduardo Cardozo (PT-SP), foi mantido, inclusive com a previsão de barrar das urnas condenados por crimes ambientais e de saúde. O projeto prevê, em contrapartida, a possibilidade de recurso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para garantir candidaturas.
A pressão ruralista pela retirada da emenda que excluía os crimes ambientais da lista de crimes passíveis de punição pelo Ficha Limpa foi o único ponto que gerou polêmica entre as modificações analisadas no início da noite. Defensores do agronegócio atacaram o texto do projeto, que não especificaria corretamente o que seria considerado crime ambiental. “Um médico, por um erro simples, poder ficar inelegível, já que o projeto não especifica corretamente o que são crimes ambientais e de saúde”, atacou João Pizzolatti (PP-SC).
Em resposta aos ruralistas, os defensores da Ficha Limpa garantiram que o texto do projeto só pune os condenados por crimes ambientais considerados graves. “Não há o que temer. Só será punida com a inelegibilidade a pessoa que cometer crime ambiental com pena superior a dois anos, com dolo comprovado, em ação proposta pelo Ministério Público”, rebateu João Carlos Aleluia (DEM-BA).
Embora pressionassem pela retirada dos crimes ambientais e de saúde das hipóteses de inelegibilidade, os ruralistas acabaram por recuar em plenário. A maioria da bancada votou pela manutenção do texto de Cardozo, mantido pelo placar elástico de 350 votos contra dois. “Por essa lei, o presidente Lula está cometendo crime ambiental e ficaria inelegível, pois mora às margens do Lago Paranoá”, apontou o presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, Valdir Collato (PMDB-SC), um dos que votaram pela retirada dos crimes ambientais da lista dos puníveis com a inelegibilidade — o outro foi Nelson Marquezelli (PTB-SP).
Validade
Diante da pressão popular pela aprovação da Ficha Limpa, deputados contrários ao projeto apostam agora que a matéria será considerada inconstitucional pela Justiça ou que só vigore para as eleições municipais de 2012. A posição de vários parlamentares, reforçada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ricardo Lewandowski, é de que o projeto só teria validade caso tivesse sido aprovado no ano passado. “Um projeto dessa natureza não pode valer para as eleições sem ter um ano de antecedência, porque interfere nos candidatos que vão concorrer”, defendeu o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP).
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), autor da proposta original da Ficha Limpa no Congresso, ainda aposta na eficácia do projeto para outubro. O grupo, que congrega 44 entidades, entende que o texto terá aplicação imediata se for aprovado até o início das convenções partidárias, em 10 de junho. Até lá, o projeto precisa passar pelo Senado Federal e pela sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
1 – Costura complexa
A articulação pela aprovação da Ficha Limpa trouxe significativas mudanças em relação ao texto original. Os pontos alterados tornaram o projeto mais brando. A proposta inicial era de que os condenados em primeira instância ficassem inelegíveis. Para diminuir a resistência, o ponto-chave foi alterado pelo primeiro relator, Índio da Costa (DEM-RJ), que previu a perda dos direitos políticos para condenações em órgãos colegiados (mais de um juiz). Sem consenso, um novo relatório, de José Eduardo Cardozo (PT-SP), adicionou a suspensão da pena caso o STJ concedesse efeito suspensivo. Ao que tudo indica, o texto deve passar pelo Senado.
Entenda as regras
Como ficou o texto
» Ficam inelegíveis os candidatos que tiverem sido condenados por órgão colegiado (mais de um juiz) ou por trânsito em julgado em crimes dolosos (intencionais)
» A lista de infrações passíveis de perda dos direitos políticos vai de tráfico de drogas a crimes contra o sistema financeiro e de improbidade administrativa. Crimes eleitorais e contra o meio ambiente e a saúde também são punidos com inelegibilidade
» Políticos que renunciarem ao mandato para escapar de cassação também ficam inelegíveis
» Há possibilidade de o candidato concorrer, mesmo depois de condenado por órgão colegiado. A inelegibilidade será suspensa caso o político recorra da sentença ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e consiga um efeito suspensivo da pena pelo colegiado dos juízes
» O prazo de inelegibilidade para os fichas-sujas será de oito anos, em todas as hipóteses previstas pela lei
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