Fonte: Blog Aprendendo Direito
Tempos atrás, o Supremo Tribunal Federal possuía a política de negar absolutamente qualquer pretensão calcada no interesse de se concederem reajustes salariais, equiparações de toda ordem e etc. Geralmente, quem acessava o judiciário para brigar por salários mais dignos, invocava a norma inscrita no art. 37, X da Constituição Federal, redação esta que era considerada letra morta da lei, já que não existia norma de caráter infraconstitucional capaz de “explicar” ou garantir o funcionamento de certos dispositivos da Constituição.
No caso específico dos servidores públicos, o referido dispositivo traz a seguinte dicção: “a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento).
Vejam que a Constituição Federal, a lei maior de nosso país, contém disposição legal em que se prevê a revisão geral anual da remuneração do servidor público, cuja objetivo último é garantir o poder de compra dos respectivos ganhos, isso porque, a inflação anula acaba por corroer os valores recebidos, diminuindo a qualidade de vida de quem depende destes ganhos, desvalorização daqueles que realmente se dedicam ao serviço público e, para piorar, tornam algumas carreiras públicas pouco atrativas.
Bem, até então, o STF como outros tribunais federais, defendem o entendimento de que ao Poder Judiciário não compete a concessão de aumentos. Tal ideia é, inclusive, concretizada através do verbete sumular de número 339 do STF. O Poder Legislativo, por sua vez, defendia que o art. 37, X da Constituição dependia de outras normas que regulamentassem a norma da Lei Maior, cheque em branco para a inércia de nossos representantes. Nesta quadra, a política adotada pelo Poder Legislativo gerava a chamada “síndrome da inefetividade das normas constitucionais”, ou seja, a Constituição até poderia prever um direito, mas, se o Poder Legislativo não regulamentasse a matéria, o direito não poderia ser usufruído. Aqui estava criada a primeira distorção, a qual seria utilizada como justificativa para o indeferimento de todas as pretensões jurídicas destinadas a buscarem aumentos salarias.
Toda esta situação era considerada de extrema gravidade, mas pouco se fazia, do ponto de vista dos precedentes judiciais para mudar esta realidade diária. A omissão do Estado – que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional – qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental.
Apesar disso, convivemos, hoje, com carreiras públicas que estão sem aumentos ou revisão de salários por quase uma década. Algumas, não recebem aumentos por cinco, seis ou mais anos, tornando a atividade laboral em algo insuportável, obrigando alguns servidores a buscar caminhos alternativos, alguns não muito ortodoxos, como a corrupção de seus valores morais e éticos.
Neste cenário, que, verdadeiramente se revela um tanto quanto incongruente, sempre defendemos outra perspectiva de interpretação para a norma inscrita no art. 37, X da CRFB. O que o dispositivo constitucional revela, não é a concessão de aumentos, mas, simples reajustes salariais, para fazer frente aos tempos de inflação alta, como o que temos percebido a partir da leitura de jornais de grande circulação.
Organicamente, existem diferenças substanciais entre aumentos e reajustes. Os primeiros, de fato, e não há como negar, se inserem naquela categoria de atos de vontade política, os quais o Poder Judiciário não pode se imiscuir. Todavia, quanto aos reajustes, estes sim podem e devem ser analisados pela justiça. Isso porque, a função dos reajustes é justamente afastar os nefastos efeitos da inflação, recompondo o poder de compra dos salários já corroídos pela inflação.
Nos últimos anos, o que temos percebido não é a concessão de aumentos, ao contrário, representam fraca tentativa do Poder Público em reajustar salários e ganhos dos servidores, os quais cambaleiam de forma trôpega frente a batalha contra o disparo dos índices inflacionários.
De fato, e isso deve ser compreendido de forma insofismável, que a relação contratual mantida entre servidor público e Administração, devem ter como princípio básico, o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. Gustavo Binembojm: “O princípio do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos é usualmente conceituado como o dever de preservação da relação de equivalência que se estabelece, no momento da apresentação da proposta do licitante vencedor, entre os encargos assumidos pelo contratado e as retribuições a ele devidas” (Temas de direito administrativo e constitucional, 2008, p. 388).
Por esta razão, a recomposição salarial do servidor público, operada através de reajustes e não aumentos, é medida que deve ser implementada pelo Poder Judiciário. Se o Poder Público, de uma forma em geral não demonstra interesse político em promover tal medida, o Poder Judiciário pode ser provocado para impor a obrigação de que as entidades integrantes da Administração promovam a respectiva recomposição salarial, cujos índices, para algumas carreiras ultrapassam os 40%.
Em recente decisão proveniente do STF, tal entendimento ficou marcado de forma evidente, na medida em que se destacou que o desprezo do Poder Público frente ao que se determina a Constituição Federal, representa não apenas o desequilíbrio da equação financeira mantida entre servidor e o Estado, além do enriquecimento sem causa diante da exploração do trabalho desempenhado.
Portanto, você servidor não apenas pode, mas deve procurar os seus direitos, especialmente se observar que os seus ganhos são incompatíveis aos “aumentos” concedidos pelo Poder Público. A mudança observada na jurisprudência parece revelar o acolhimento deste justo pleito.
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