Antonio Penteado Mendonça – Publicado nO Estado de S. Paulo
O brasileiro enriqueceu e mais gente aderiu. O lado não tão bom é que os prestadores de serviço não fizeram os investimentos necessários e estão subdimensionados
Começo plagiando o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), que disse que um candidato a presidente da Câmara dos Deputados estava jogando para o público interno ao fazer afirmações descabidas sobre o poder da corte.
No meu caso, a frase se aplica à infeliz declaração de que os titulares de planos de saúde privados devem pagar as consultas para os médicos porque os planos de saúde pagam muito pouco. Alguém dizer isso só pode ser para uso interno, para fazer média com a classe. É tão sem sentido que não dá para levar a sério. Não bastasse a possibilidade do indiciamento penal do médico, há também séria infração do Código de Defesa do Consumidor.
Não é porque os planos de saúde privados pagam pouco pelas consultas que os médicos credenciados podem cobrar a diferença que acham justa de seus pacientes. Se eles atendem os planos de saúde, devem aceitar as regras do jogo. Ou seja, não podem criar regras novas, que os colocam no melhor dos mundos, recebendo dos pacientes pelas consultas e dos planos de saúde pelos procedimentos mais complexos, que, ao que parece, são bem pagos.
A razão de ser de um plano de saúde é garantir atendimento de bom nível para seus segurados e não para deixar médico rico, muito embora um profissional, se valendo dessa parceria, tenha boa chance de alcançar situação econômico-financeira bastante interessante.
O atendimento à saúde da população brasileira é um problema extremamente complexo, aliás, como no resto do mundo. Basta ler o que acontece nos Estados Unidos, que gastam mais de US$2 trilhões com saúde por ano, para ter uma noção das dificuldades envolvidas.
A diferença é que o Brasil, somando os sistemas público e privado, mal e mal gasta R$ 200 bilhões com a saúde de sua população. É óbvio que não dá. O cobertor é curto. Mas uma análise do que vem sendo feito ao longo das últimas décadas mostra que o atendimento à saúde tem melhorado, não por milagre, mas porque o País, com todas as suas deficiências, tem encontrado soluções que viabilizam, de maneira geral, o atendimento do grosso da população, da qual um quarto tem plano de saúde privado e três quartos dependem do SUS.
O que se tem visto é a rede pública e os agentes privados aperfeiçoarem seus mecanismos gerenciais, sofisticarem a qualidade dos serviços e, apesar de estarem distantes de um padrão considerado bom, conseguirem melhorar a qualidade do atendimento.
Durante muitos anos, os planos de saúde privados foram refratários à adoção de uma série de ações que, atualmente, além de serem vistas como normais, reduziram seus custos e melhoraram seus caixas.
Check-up preventivo, exames de rotina, monitoramento de pacientes, cuidados especiais, home care, fornecimento de medicamentos, remoção por via aérea, investimentos em redes próprias e parcerias com agentes dos mais diversos setores de saúde conseguem reduzir os custos operacionais, o que possibilita até mesmo uma melhor remuneração das consultas.
Mas o jogo é duro. Por trás de boa parte dos problemas está uma das piores leis já votadas no Brasil. A Lei dos Planos de Saúde Privados é ruim e, se não for modificada, no longo prazo, acabará por comprometer o sistema, por mais que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aja competentemente, tentando minimizar os efeitos negativos que ameaçam o setor e inibindo a atuação das operadoras que não mostrem condições mínimas para permanecer no mercado.
A melhor forma de alguém aprender é sentindo no bolso. As operadoras não são exceção. Ao perceber que a adoção de práticas que eram vistas como despesas não cobertas reduzia seus custos, passaram a adotá-las.
Além disso, o brasileiro enriqueceu e mais gente aderiu aos planos. Mas, como tudo, se há um lado bom para as operadoras, há outro não tão bom. Os prestadores de serviços não fizeram os investimentos necessários e o resultado é que eles estão sub-dimensionados para atender os quase 50 milhões de clientes dos planos de saúde privados.
Comments are closed.