Fonte: O Globo
Ivo Cassol pega 4 anos e 8 meses em regime semiaberto por corrupção, mas não perde mandato depois do deputado
Por dez votos a zero, o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou ontem o senador Ivo Cassol (PP-RO) a 4 anos, 8 meses e 26 dias de prisão em regime semiaberto por fraude em 12 licitações de obras promovidas pela prefeitura de Rolim Moura (RO). É o primeiro caso de senador condenado pelo STF. Em junho, o deputado Natan Donadon (PMDB-RO) foi preso por desvio de recursos por ordem do STF.
Por seis votos a quatro, os ministros do Supremo decidiram que Cassol deve perder o mandato no Senado, mas a palavra final dependerá de deliberação do Senado. Esse entendimento representa uma mudança em relação ao que o STF havia decidido no caso do mensalão. Naquele julgamento, a maioria dos ministros considerou que o tribunal poderia determinar a perda do mandato dos deputados envolvidos no mensalão, e a Câmara teria apenas que fazer cumprir a decisão.
A interpretação sobre perda de mandato mudou com os votos dos novos ministros Teori Zavascki e Roberto Barroso, que assumiram recentemente suas vagas no STF. Além deles, os ministros Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski entendem que a palavra final sobre a perda do mandato depende de decisão do Congresso. Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso Mello reafirmaram a posição, que vem desde o julgamento do mensalão, de que cabe ao Congresso apenas confirmar a decisão do STF.
No mesmo julgamento, os ministros condenaram a perda do cargo os dois ex-auxiliares de Cassol – Salomão da Silveira e Erodi Antero Matt – que eram presidente e vice-presidente da Comissão de Licitação da prefeitura de Rolim Moura entre 1998 e 2002, período das fraudes. O presidente do STF, Joaquim Barbosa, considerou absurda as diferenças na aplicação da pena. Para ele, Cassol, que era prefeito na época dos crimes e hoje é senador, deveria ter punição mais rigorosa que os dois ex-assessores.
– Olha a incoerência: decretamos a perda do cargo dos servidores, mas não decretamos a perda do mandato do parlamentar. Quanto mais elevada a responsabilidade, maior deve ser a punição. Não o contrário. Esse é o erro da nossa República – disse Barbosa ao proclamar o resultado do julgamento.
Cassol ainda foi condenado a pagar multa de R$ 201.817, valor correspondente a 3% das vantagens que teria obtido indevidamente. Por oito votos a dois, os ministros rejeitaram, no entanto, a denúncia por formação de quadrilha formulada pela subprocuradora-geral Deborah Duprat.
Cassol foi acusado de fracionar e direcionar 12 licitações de drenagem e mobilidade urbana para cinco empresas que estão em nome de amigos ou parentes. O ministro Luiz Fux não votou ontem porque se julgou impedido. Ele já havia atuado no processo quando o caso tramitou no Superior Tribunal de Justiça.
Ministros divergem sobre perda de mandato
Para os ministros, mesmo que não tenha se comprovado o superfaturamento das obras, houve direcionamento das licitações, e isso afetou a concorrência. Por isso, o senador deveria ser punido. O julgamento começou por volta das 14h30m e terminou depois das 19 horas.
A discussão sobre perda do mandato foi iniciada quando a relatora do caso, Cármen Lúcia, anunciou a definição da pena de Cassol. A ministra disse que caberia ao STF informar ao Senado sobre a condenação a prisão. A partir daí, o Senado daria o encaminhamento para a decisão. Pelo entendimento da ministra, de Dias Toffoli e Lewandowski, a cassação depende de um processo específico no Senado, conforme prevê o artigo 55 da Constituição.
– Mantenho minha posição que, pela Constituição, quem declara essa perda é o Congresso – disse Cármen Lúcia.
Barroso e Teori acompanharam a relatora. Barbosa decidiu, então, intervir no debate. Para o ministro, o STF é o guardião da Constituição e, portanto, teria a incumbência de determinar a perda do mandato do parlamentar:
– A perda do mandato é decorrente de sentença criminal transitada em julgada. No momento em que essa sentença transitar em julgado, o dever dessa Corte é decretar a perda do mandato.
Barroso deixou claro que não vê com bons olhos um parlamentar permanecer no exercício do mandato mesmo depois de condenado. Mas, para ele, não se pode confundir uma visão pessoal com as regras da Constituição:
– Eu não acho isso bom. Mas está na Constituição. De modo que eu lamento que tenha essa disposição. Mas a Constituição não é o que eu quero e o que se pode fazer dela.
Gilmar Mendes discordou do colega. Para o ministro, a condenação criminal implicaria também em improbidade. Isso seria motivo suficiente para a decretação da perda do mandato. Mas, como a votação já estava praticamente definida, restou a Gilmar criticar a prática:
– É a fórmula da jabuticaba: só no Brasil há parlamentar cumprindo pena.
No julgamento, não ficou claro como seria o cumprimento da pena, com o senador ainda ocupando o cargo. Pelo regime semiaberto, o preso só se recolhe à prisão à noite. Em tese, ele poderia despachar no Congresso durante o dia. Segundo um ministro ouvido pelo GLOBO, isso dependerá ainda do lugar onde Cassol cumprirá a pena: se em Brasília ou Rondônia. O deputado Natan Donadon, recentemente condenado pelo STF a 12 anos de prisão, em regime fechado, iniciou o cumprimento da sentença em Brasília. O complexo da Papuda teria melhores condições do que os presídios de Rondônia, onde o deputado mantinha residência.
Dois ministros ouvidos pelo GLOBO disseram que, com a condenação do STF, Cassol é alcançado pela Lei da Ficha Limpa. Com isso, não poderá concorrer nas próximas eleições.
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