Fonte: Agência Fenapef
Por: José Antônio Aquino
No início dos anos 90, no Brasil, era muito comum em quaisquer tipos de conversas, seja em mesa de bares, em reuniões sindicais ou até nos intervalos de jogos de futebol, os brasileiros trazerem à tona a perceptível e inaceitável deficiência profissional reinante no País, devido à baixa formação da força de trabalho pátria. Não éramos páreo para muitos dos países que compunham o “terceiro mundo”, imagine para as nações do “primeiro mundo”.
Tal afirmação era citada não sem uma forte dosagem de razão. O Brasil carecia, a olhos vistos, de uma profissionalização, de um investimento maciço em educação, mais precisamente no terceiro grau, em cursos de nível superior que dotassem a mão de obra Brasileira de um nível de análise e conhecimento mais próximo do que ocorria nos Países desenvolvidos. Decerto que só dessa forma seríamos capazes de elevar o padrão de competição no comércio e indústria mundial. Era, enfim, uma justa exigência do mercado interno nacional e necessário se fazia uma resposta rápida e concisa para que a implementação de qualquer projeto nesse sentido fosse efetivo e duradouro.
Partindo-se dessa constatação, o governo brasileiro, a partir dos anos 90 iniciou uma profunda transformação no acesso ao ensino superior no País, com a lei de diretrizes e bases da educação nacional, começando um processo de democratização do acesso ao ensino superior que culminou com impressionantes índices de confirmação de tal projeção, no ano de 2012, como veremos a seguir.
De acordo com Censo de Educação Superior, realizado pelo Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), entre os anos de 2003 e 2012, houve uma explosão de acesso ao ensino superior no Brasil, o que resultou, em um extraordinário ganho para a sociedade brasileira, sob diversos aspectos, desde o cultural até o financeiro, posto que as famílias brasileiras aumentaram significativamente o seu ganho, resultando em uma elevação da qualidade de vida geral.
Segundo a tabela a seguir, tal evolução fica evidente:
|
2003 |
2012 |
Evolução (%) |
Instituições criadas |
1.859 |
2.416 |
29,96 |
Cursos |
16.505 |
31.866 |
93,07 |
Matrículas |
3.887.022 |
7.037.688 |
81,06 |
Fonte: Censo de Educação Superior – MEC/INEP
O Governo Federal, propala modernamente que envidou inúmeras ações para expandir a oferta de vagas nas universidades, tanto federais com atuação direta, quanto propiciando o acesso de estudantes de baixa renda nas faculdades e universidades particulares, com projetos tais como o programa de financiamento estudantil – Fies. Tendo iniciado a expansão de acesso às universidades em 2003 e se consolidado a partir de 2007 quando foi implementado o delineamento de reestruturação e expansão das universidades federais (Reuni).
Como se pode observar pela tabela acima exposta, o resultado das ações dos governos dos anos 90 em diante buscou resolver um problema fundamental para a sociedade brasileira, o baixo acesso ao ensino superior no País. O que resultou em um expressivo aumento da população com formação superior e, completamente disponível no mercado de trabalho, a um custo inicial mais barato para o mercado brasileiro, posto que anteriormente tinha que ir buscar essa mão de obra qualificada, no exterior.
Note-se que, no referido intervalo de tempo, concomitantemente se expandiu o número de instituições criadas para dar suporte à demanda pretendida, algo em torno de 30,00%, ao passo que a criação de cursos superiores específicos, aqui uma ação diretamente associada com o objetivo pleito do mercado. Vale chamar a atenção para a chamada “interiorização” da formação universitária no Brasil, visando duas vertentes explícitas; fixação das pessoas nas regiões menos habitadas e propiciando especialização focada de acordo com a demanda da região. Observe-se ainda que a criação de cursos no ensino superior brasileiro praticamente dobrou; cerca de 93% de crescimento. Já as matrículas em tais cursos, saltaram, em uma década, impressionantes 81%. Esta é a nova realidade do Brasil, um País mais próximo do conhecimento científico que propicia evolução natural da sociedade sob seus vários aspectos.
No tocante a conclusão dos cursos superiores no Brasil, o Grupo Estratégico de Análise da Educação superior no Brasil (GEA), em seu relatório denominado “Vinte e um anos de Educação Superior – Expansão e democratização”, de autoria de Dilvo Ristoff, apresenta a seguinte e importante comparação entre ingressantes e concluintes da graduação, dados de 2007 e 2011, por região:
REGIÃO |
INGRESSOS 2008 |
CONCLUINTES 2011 |
% SUCESSO |
Brasil |
2.336.899 |
1.016.713 |
44 |
Norte |
156.033 |
75.566 |
48 |
Nordeste |
322.256 |
166.064 |
52 |
Sudeste |
1.018.483 |
500.459 |
49 |
Sul |
458.219 |
179.406 |
39 |
Fonte: MEC/INEP
Dessa tabela se depreende facilmente que, o Brasil tem disponibilizado ao mercado de trabalho anualmente mais de um milhão de pessoas com formação superior, aptas, portanto, a assumir o mercado de trabalho e, atendendo à natural evolução que a economia requer. Estava assim traçado e atingido o objetivo de ofertar à economia brasileira, uma mão de obra mais especializada. Obtendo com isso, importante incremento à economia nacional, visto que, tal evolução pessoal implica naturalmente em ganhos particulares, como salarial por exemplo, que faz girar o “moto contínuo” da economia.
A oferta de pessoas com um novo perfil acadêmico à sociedade provoca uma natural elevação do nível de conhecimento e atuação, propiciando, seja no âmbito do serviço público ou da iniciativa privado um visível crescimento de tais órgãos e empresas.
Por outro lado, como é de conhecimento público, o crime organizado costuma utilizar-se de todos os meios disponíveis na sociedade para alcançar seus objetivos e, o que se vê nas últimas duas décadas é o contínuo aprimoramento do nível intelectual das pessoas que cometem crimes e ilicitudes contra a Sociedade, com o óbvio objeto de aumentar seus ganhos, ludibriando o estado que, tem por atribuição constitucional proteger e assistir o cidadão.
Estando, por natureza, o Estado atento a tudo o que lhe rodeia, seja na contínua busca por uma melhor forma de atender o contribuinte quando de suas buscas por serviços, apoio ou proteção a partir de meados dos anos 90, a Polícia Federal decidiu que, daquele momento em diante a ocupação de todos os cargos da carreira policial federal também deveria atender tal requisito; formação superior. Em virtude da ampla gama de atividades delituosas, a multidisciplinaridade na composição dos grupos de investigadores federais era uma urgente necessidade.
Essa carência era visível em todos os setores da Sociedade, como por exemplo, foi proferido pelo Ministro Nilson Naves, ex presidente do STJ, a seguinte e oportuna observação; “a lavagem de dinheiro, que agora estamos combatendo com mais veemência, é o braço financeiro do tráfico de entorpecentes, do sequestro, do terrorismo e, por que não dizer, da insegurança que atinge não só a sociedade brasileira, mas também todas as nações das Américas e dos demais continentes. Estamos diante de um problema mundial que, com a estabilização econômica obtida a partir de 1995, vem, cada vez mais, fazendo-se presente no Brasil”.
Dessa forma tal medida, mostrou-se extremamente eficaz e acertada, uma vez que, com a pluridisciplinaridade dos conhecimentos nos diversos cargos da Polícia Federal, propiciou a formatação de diversos conjuntos de investigadores, em especial os Agentes de Polícia Federal, que passaram a responder rapidamente os anseios da sociedade.
O resultado desse modelo de composição multidisciplinar gerou um elevado nível de investigação por parte dos Agentes Federais, culminando com as grandes operações desencadeadas pela Polícia Federal, em meados dos anos 2.000. Definitivamente o Brasil havia preparado a sua principal polícia para atuar efetivamente dando resposta à sociedade, em especial contra o chamado “crime do colarinho branco”.
Vale ressaltar que, devido ao comprovado acerto da Polícia Federal, ainda nos anos 90, com a adoção da exigência de nível superior na composição de seus quadros, tal ideia se replicou nas outras polícias: Polícia Rodoviária Federal, no âmbito da união e, com as Polícias Civis e Militares em praticamente todo o Brasil, onde para o ingresso por concurso público nesses cargos passou a se exigir formação superior, uma vez que as atividades de tais corporações passaram a exigir, no mundo pós moderno um nível de conhecimento específico mais amplo.
Entretanto, nos últimos tempos, em virtude de problemas variados que vão desde a má gestão de orçamentos, equipamentos e principalmente de pessoas no Departamento de Polícia Federal, a eficácia das investigações realizadas por este Órgão tem estado muito aquém do que efetivamente, o potencial de seus componentes, é capaz de propiciar à Sociedade Brasileira.
A falta de valorização dos cargos que hoje compõem a carreira policial tem ferido de morte a atuação deste importantíssimo Órgão de Segurança Pública e, se não fossem as “operações espetáculo” que têm sido realizadas com impressionantes estardalhaços, a sociedade perceberia o quanto a real eficácia das investigações conduzidas pela Polícia Federal foram reduzidas.
Como se não bastasse o atual estado de coisas no DPF e, mesmo com os dados acima explicitados afirmando por si só que os investimentos realizados pelo Governo Brasileiro na qualificação e formação de nível superior da Sociedade Brasileira foram atitudes acertadíssimas, neste momento os gestores do Departamento de Polícia Federal ameaçam retroceder ao propor a criação, na Polícia Federal, de um “Cargo Policial de Nível Médio”, para surpresa geral, confrontando toda uma vertente estratégica educacional que se mostrou conveniente. Ressalte-se que já existe na atual estrutura organizacional cargo de nível médio como carreira de apoio, portanto, não policial.
Apesar de ser senso comum, as palavras do Ex Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, ministro Nilson Naves, quando afirmou; “É preciso descapitalizar o crime organizado”, e isso só se faz com investigação competente e informada, os Administradores do DPF parecem querer seguir em um caminho perigosamente contrário à constatação da sociedade, de que a sua polícia precisa ser cada vez mais especializada e preparada para o combate ao crime. Paradoxalmente, enquanto nossa sociedade se torna mais culta e especializada como resposta às exigências do mercado de trabalho, os Gestores do Departamento de Polícia Federal tentam voltar ao passado e fomentar a inclusão de novos policiais com nível médio em seus quadros. Tal atitude vai completamente de encontro aos diversos programas de governo de todos os partidos políticos Brasileiros.
O atual nível da segurança pública no Brasil, não permite retrocesso, antes, uma contínua busca por otimização de atuação de seus principais atores. A criação de cargos policiais de Nível Médio na Polícia Federal é um erro histórico. A Sociedade Brasileira não pode permitir que sua principal polícia sofra tamanho revés, antes deve exigir dos Gestores do DPF, investimentos cada vez maiores em preparação intelectual de seu contingente para que, o enfrentamento aos diversos crimes e ilicitudes que ameaçam o patrimônio nacional voltem a se tornar uma rotina e não reles eventos esporádicos e midiáticos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Censo da Educação Superior. Brasília: MEC, 2012.
CERQUEIRA, C.M. Políticas de segurança pública para um estado de direito chamado Brasil: O futuro de uma ilusão – O sonho de uma nova polícia. Rio de Janeiro: [s.n.], 1998. (Col. Polícia amanhã).
Instalação da Segunda Vara Federal Especializada em Crimes de Lavagem de Dinheiro. Curitiba: 12 de jun. 2003. Disponível em <: http://www.stj.jus.br/internet_docs/ministros/Discursos/0000361/Lavagem%20de%20dinheiro%20-%20instala%C3%A7%C3%A3o%20segunda%20vara%20especializada.doc. >, Acesso em: 02 de jun. 2015.
MORENO, Ana Carolina; FAJARDO, Vanessa. Número de matrículas no ensino superior cresce 81% em dez anos. Disponível em <: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2013/10/numero-de-matriculas-no-ensino-superior-cresce-81-em-dez-anos.html>, Acesso em: 01 de jun. 2015 .
RISTOFF, Dilvo. Vinte e um anos de educação superior. Cadernos do GEA, n.3 jan./jun. 2013). Rio de Janeiro : FLACSO, GEA; UERJ, LPP, 2012-v
José Antonio Aquino é presidente do Sindicato dos Policiais Federais no Rio Grande do Norte
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