por Marina Ito
Qualquer proposta para regulamentar a Lei das Interceptações Telefônicas deve aguardar o raio-x que vem sendo feito pela CPI das Escutas. A declaração foi feita pelo deputado federal Marcelo Itagiba, que participou do debate Interceptação das comunicações telefônicas: 12 anos da Lei 9.296/96, promovido pela Escola da Magistratura Regional Federal (Emarf) da 2ª Região. No debate sobre a Lei dos Grampos, juízes não chegaram a um consenso sobre o tema. Pelo contrário, divergiram nos principais pontos da legislação.
O deputado considerou precipitado o Projeto de Lei 3.273, proposto pelo governo, que cria novas regras para os grampos telefônicos. Itagiba disse também que a lei atual não vem sendo cumprida. “Não se investiga mais fato criminoso e sim pessoas”, afirma. O deputado afirmou que a CPI está aberta a sugestões para aprimorar a Lei 9.296/06. Um dos pontos que precisa ser regulamentado, exemplifica, é a comercialização de equipamentos para interceptação. “Não há lei que regule a questão”, constata.
O debate mostrou que há divergências quanto às várias questões que rondam as escutas telefônicas autorizadas judicialmente. Não há lados opostos definidos. E, em princípio, não há quem queira abolir as interceptações como forma de investigação. O que se discute são os mecanismos de controle da medida, que é excepcional.
O juiz Rubens Casara diz que o limite máximo estipulado pelo projeto de lei, 360 dias (com exceção de crime permanente, que permite a interceptação enquanto durar o crime), é excessivo. O corregedor do TJ fluminense, desembargador Luiz Zveiter, concorda com o prazo. “Se em 360 dias, o investigado não falar sobre o crime, não vai falar mais. Já é tentar monitorar até que o investigado cometa algum crime”.
O juiz federal Marcello Enes, da Justiça Federal da 2ª Região, por outro lado, acredita que a prorrogação das escutas deveria ser permitida o tempo em que for necessária. Ele também acredita que o projeto de lei acertou ao não delimitar quais são os crimes passíveis de investigação por monitoramento telefônico.
Casara discorda. Para ele, é preciso fixar o rol de crimes em que cabe o monitoramento. Ele citou o caso em que pediram interceptação para investigar furto de barra de chocolate.
Para a procuradora da República Silvana Góes, que considera a interceptação indispensável, já há instrumentos suficientes para enfrentar o abuso. Segundo ela, o Ministério Público faz um filtro e avalia a conveniência e necessidade da investigação.
Itagiba informou que a CPI dos Grampos já comprovou que há autorizações de interceptação em que o MP não foi consultado. Silvana Góes concorda que é preciso que o órgão seja ouvido antes da decisão. O artigo 6º, da Lei de Interceptações, determina que “deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar sua realização”.
A preocupação das pessoas de que possam ter seus telefones grampeados não significa que estão cometendo crimes e temerosas de que sejam flagradas pelas operações e execradas publicamente. A questão é que durante conversas telefônicas, que são guardadas pelo sigilo, surgem assuntos econômicos e políticos que podem ser valiosos dependendo de quem está falando ao telefone. Isso sem contar com assuntos pessoais e as diversas interpretações que se pode dar às conversas. Como disse o juiz Casara, já não se pode mais utilizar a palavra “esquema” nas conversas, sob o risco de o termo ser interpretado como venda de sentenças.
Cumprimento da lei
Para o deputado Marcelo Itagiba, ainda que a lei atual seja adequada, pode ser aprimorada. Ele alerta: “não adianta fazer lei se os juízes não aplicarem da melhor forma. Os fins estão justificando os meios”.
Entendimento semelhante tem o juiz Rubens Casara. Para ele, é preciso que a mentalidade do operador de Direito também mude. Casara constata que a lei, do modo como está sendo aplicada, gera uma cultura autoritária da qual ainda não nos livramos. “Não adianta limite, se o juiz for pelo caminho mais fácil”, afirma.
Apesar de estar no TRF-2, falando para juízes, o deputado Itagiba não se intimidou ao citar a frase de seu pai, que foi magistrado. “Que nos livre da ditadura da magistratura, porque contra ela não há recurso”, disse.
Comments are closed.